Saiba
tudo sobre o novo tratamento que chegou ao Brasil e que será
disponibilizado no SUS
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Estima-se que 150 000 pessoas utilizem o medicamento para prevenção no mundo -- a maior parte delas está nos Estados Unidos. (iStock/Getty Images) |
Por Natalia Cuminale
“Uma
nova estratégia para a prevenção da aids será disponibilizada até
o fim deste ano no Brasil para pessoas que vivem com risco altíssimo
de contrair o vírus HIV. Conhecido pelo nome comercial
Truvada, uma combinação dos antirretrovirais tenofovir e
emtricitabitina, o medicamento da farmacêutica americana Gilead será
oferecido inicialmente a 7 000 pessoas pelo Sistema Único de Saúde.
É destinado àqueles com maior vulnerabilidade de se infectar e que
relatam dificuldades de se proteger em todas as relações sexuais.
Fazem parte do grupo os homens que fazem sexo com homens, pessoas
trans, casais sorodiscordantes (quando um tem o vírus e outro não)
e profissionais do sexo. Embora a orientação inquestionável e mais
eficaz para a prevenção do HIV seja o uso do preservativo, a
realidade na prática é um pouco diferente. Pesquisa realizada pelo
Ministério da Saúde demonstrou que metade dos entrevistados relatou
não ter recorrido ao produto de látex na última relação com
parceiro casual. Diz o infectologista da USP, Rico Vasconcelos: “É
uma mudança de paradigma. Está na hora de atualizar o discurso de
que o preservativo é a única estratégia para a prevenção do HIV.
É, sem dúvida, a melhor e tem de ser encorajada sempre. Mas há
alternativa de proteção para quem falha em utilizá-lo”.
Popularmente
conhecida como Prep (sigla em inglês de profilaxia pré-exposição),
a estratégia consiste na ingestão diária de um comprimido por
pessoas que não têm o vírus. Para receber o medicamento do
governo, o interessado deverá ser submetido a uma avaliação para
verificar qual seu grau de exposição ao vírus HIV. Uma vez dentro
do programa, será orientado a adotar todas as medidas preventivas,
como o uso de preservativo, além de fazer acompanhamento médico
periódico e testes de HIV. O Truvada também pode ser adquirido nas
farmácias particulares. Custa 290 reais por mês.
Calcula-se
que atualmente 827 000 pessoas vivem com aids no Brasil. Segundo os
últimos dados divulgados pelo Ministério da Saúde, houve um
aumento principalmente entre os jovens do sexo masculino. Entre
aqueles com 20 aos 24 anos, por exemplo, a taxa de detecção subiu
de 16,2 casos para cada 100 000 habitantes, em 2005, para 33,1 casos
em 2015. A oferta do tratamento é uma tentativa de frear esse
avanço.
Eficácia
O
primeiro estudo com o Truvada teve início há uma década. A
pesquisa recrutou 2 500 pessoas classificadas com alto risco de
infecção. Metade delas recebeu os comprimidos azuis com o princípio
ativo, enquanto a outra parte tomou placebo. De acordo com os
resultados, os indivíduos que utilizaram o Truvada tiveram uma taxa
44% menor de infecção pelo HIV. Nos participantes que seguiram as
recomendações médicas à risca e mantiveram a adesão ao
tratamento, a redução da infecção foi ainda maior, de 92%. Até
agora, foram realizados 32 estudos científicos com o composto, que
incluíram 8.478 pessoas.
No
Brasil, um estudo coordenado por Vasconcelos acompanhou 500 pessoas
com alto risco de exposição ao vírus. “Nossos resultados até
agora mostraram que essa é uma estratégia que funciona e que tem
adesão alta. As pessoas vulneráveis ao HIV aderem tanto à consulta
quanto ao uso do comprimido”, disse.
Estima-se
que 150 000 pessoas utilizem esse medicamento no mundo, a maior parte
delas está nos Estados Unidos. Lá, o composto foi aprovado em 2012
e seu uso cresce a cada ano. Um exemplo do impacto desse tipo de
estratégia é a cidade de São Francisco, na Califórnia. Após a
adoção do Truvada, o número de novos casos caiu quase 20% de 2013
para 2014.
Entre
os americanos, o comprimido é popular na comunidade gay. O Grindr,
um dos maiores aplicativos de encontros para esse público,
acrescentou no ano passado a possibilidade acrescentar o termo ‘on
PrEP’ no perfil do usuário. Quem assinala essa opção sinaliza
aos seus possíveis parceiros que está se protegendo do HIV. O mesmo
aplicativo também acrescentou no início deste ano um novo ‘gaymoji’
relacionado à Prep — o emoji é um comprimido azul, igual ao
Truvada.
As
principais dúvidas sobre a Prep
Como
funciona o medicamento? Ele
bloqueia a entrada do vírus HIV no DNA das células de defesa do
organismo, impedindo a sua replicação. A taxa de eficácia é de
até 99%, segundo os estudos clínicos, desde que tomado
corretamente. A indicação é de um comprimido, uma vez ao dia, que
deve ser tomado regularmente, sem interrupções.
O
uso da Prep exclui a necessidade do preservativo na relação
sexual? Não.
Deve ser um complemento a outras estratégias de prevenção, como a
camisinha e o aconselhamento médico. O preservativo é a arma mais
eficaz para proteger contra o HIV e evitar o contágio por outras
doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis e a hepatite B.
Para
quem a Prep é indicada? Para
qualquer pessoa que tenha alto risco de infecção por HIV e que
falha em se proteger adequadamente durante as relações sexuais. No
Programa Prep Brasil, por exemplo, são elegíveis os homens que
fazem sexo com homens, travestis e mulheres transexuais, que tenham
praticado sexo anal sem preservativo com dois ou mais parceiros nos
últimos 12 meses.
Tem
efeitos colaterais? Sim.
O efeito adverso mais grave é a insuficiência renal, que pode
acometer 5% das pessoas. Por isso, quem utiliza o medicamento deve
fazer acompanhamento trimestral para avaliar como está a saúde dos
rins. Além disso, 16% relatam efeitos gastrointestinais, como
náuseas e dores abdominais. Esses sintomas tendem a ser transitórios
e a desaparecer após uso contínuo.
Quem
inicia a Prep deve utilizá-la para sempre? Não
necessariamente. Um exemplo seria um casal sorodiscordante que
gostaria de ter um filho. O marido tem HIV, mas está com carga viral
indetectável. A mulher pode utilizar o medicamento até engravidar,
sem correr risco de contágio. Ou ainda um homem gay solteiro que
relata dificuldades de usar a camisinha em todas as relações
casuais. Nesse caso, o composto pode garantir uma proteção extra.
Ele poderia interromper o uso quando decidir ter um parceiro fixo.
A
bebida alcoólica tira o efeito da Prep? Não.
A eficácia do Truvada é reduzida se não for utilizado
corretamente.
Quem
esqueceu uma vez de usar a camisinha deve usar a Prep? Não,
nesse caso, a indicação é a utilização da terapia de
pós-exposição. Deve-se procurar um serviço de saúde em até 72
horas para iniciar o esquema profilático com duração de 28 dias.
O
Truvada pode aumentar a resistência ao HIV? Não.
De acordo com a farmacêutica Gilead, o uso da Prep com Truvada não
causa nenhum tipo de resistência ao vírus, desde que o usuário
seja HIV negativo. Por isso, a empresa ressalta, é importante que o
médico se assegure dessa condição e que a testagem para o HIV seja
repetida a cada três meses.”
Fonte: Veja.com