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sábado, 11 de junho de 2016

Maria da Penha não está satisfeita com a Lei Maria da Penha, a Lei que protege as mulheres!

Emoção durante a condução da tocha olímpica em Fortaleza

Emoção durante a condução da tocha olímpica em Fortaleza

"Símbolo maior da punição legal das mulheres vítimas da violência doméstica, Maria da Penha se disse frustrada com a lei que se inspirou na sua própria história. Escolhida para conduzir a tocha olímpica em Fortaleza, a ex-farmacêutica, que vive sobre uma cadeira de rodas, falou da sua insatisfação para jornalistas da Rio2016.com. Enquanto percorria as ruas da capital cearense coma tocha na mão, ouviu inúmeras vezes que foi salva pela lei."

Por Fernanda Ezabella* - do Rio2016

(Foto: Rio2016/Fernando Soutello)


"Maria da Penha não está satisfeita com a Lei Maria da Penha. Antes de conduzir a tocha Olímpica em Fortaleza, em um dia do revezamento dedicado ao empoderamento feminino, a ex-farmacêutica recebeu o Rio2016.com em sua casa. Hoje ativista pelos direitos da mulher, ela sabe da importância da legislação que leva seu nome e já perdeu as contas de quantas vezes ouviu em suas andanças pelo país afora: "Eu fui salva por sua lei". Mesmo assim, a cearense de 72 anos sabe que pode mais. 

Ela alerta que, prestes a completar uma década, a lei ainda está longe de atender quem vive nos médios e pequenos municípios. "Elas vivem como dez anos atrás." Maria da Penha Maia Fernandes também recebeu em casa, nesta terça-feira (7), a fundadora da ONG Think Olga, Juliana de Faria, que lançou nas redes sociais a campanha #PrimeiroAssédio (leia abaixo). O encontro foi parte do dia de empoderamento da mulher no revezamento da tocha Olímpica Rio 2016, com o lançamento da hashtag #ChamaPorElas.

A ativista, que foi levantadora de voleibol na universidade, costuma viajar três vezes por mês para dar palestras e não perde um evento em que possa divulgar a causa contra a violência doméstica, sem temor de repetir sua história pessoal. Em 1983, seu marido - um economista colombiano, professor universitário e pai de suas três filhas - tentou matá-la duas vezes. Primeiro com um tiro nas costas enquanto dormia - que a deixou paraplégica - e depois tentando eletrocutá-la no banho. Era seu segundo casamento. Os dois haviam se conhecido quando ela fazia mestrado da Universidade de São Paulo (USP). Seu caso virou símbolo da violência doméstica contra a mulher e culminou na lei 11.340/06, batizada de Maria da Penha. Foi um avanço na legislação brasileira, mas "a situação ainda deixa muito a desejar", como disse a ex-farmacêutica horas antes de acender a pira Olímpica em sua cidade.



"O balanço de dez anos [da lei] não é negativo, mas a mulher de municípios médios e pequenos ouve falar da lei, mas não tem a quem recorrer. É muito frustrante.


Em Fortaleza, em uma casa simples onde nasceu e voltou a morar após a separação, Maria da Penha conta que nunca chegou a denunciar o marido. Foi a Secretaria de Segurança do Ceará que concluiu que havia sido ele o autor da tentativa de homicídio. Foi a julgamento duas vezes, pegou oito anos de prisão e só passou dois preso, depois de quase 20 anos do crime. "Naquela época, a mulher saía da delegacia e tinha que levar para o marido o boletim de ocorrência, o convite para ele comparecer à delegacia. A delegada não tinha como punir o agressor. Ela aconselhava e ele pagava a multa, uma cesta básica", lembra. "E chegava em casa e dava outra surra na mulher." 



                                Maria da Penha com a filha Cláudia
Maria da Penha com a filha Cláudia   






















O que mudou então? 

A longa luta para ver o ex-marido atrás das grades, passando por uma corte internacional da Organização dos Estados Americanos (OEA) que condenou o Brasil por negligência, acabou inspirando a Lei Maria da Penha, sancionada em 7 de agosto de 2006. Além da violência física, a legislação passou a incluir danos psicológicos e financeiros, triplicou a pena para agressões para três anos e permitiu a prisão em flagrante e preventiva. Também acabou com penas como cestas básicas e acrescentou obrigatoriedade de o agressor fazer programas de reeducação.

A filha Cláudia Fernanda Fernandes, que foi vítima de violência do pai, nunca mais o viu e lembra da batalha da mãe. "Ela nunca se permitiu parar, sempre na busca pela justiça", lembra Cláudia, que trabalha no instituto que leva o nome da mãe, capacitando profissionais em temas sobre direitos humanos e violência doméstica.


A culpa é da mulher? Maria da Penha conta que por anos ainda tinha "encontros surreais" com gente que queria saber o que, afinal, ela tinha feito para provocar o marido. "Vinha de homem e de mulher também, até uns três anos atrás. Hoje eu sou conhecida e não falam mais assim comigo, mas tenho certeza de que muitas mulheres ainda escutam isso. Mesmo se eu tivesse traído, eu não merecia morrer. Já pensou se as mulheres fossem matar os homens que as traem? A dor da traição é igual para ambos. Então por que só homem mata?", pergunta. "Mas não, eu não traí meu marido. Ele se beneficiou do casamento e do nascimento das filhas para conseguir naturalização. E quando se naturalizou, eu não tinha mais serventia para ele."

De uma para outra...

Assim como a chama Olímpica passa de um condutor a outro, o movimento do empoderamento feminino tem que seguir adiante. Fundadora da ONG Think Olga que passou a chama para Maria da Penha no revezamento da tocha nesta terça-feira (7), em Fortaleza, Juliana de Faria leva para a internet a mensagem da colega mais velha. E não segurou as lágrimas ao comentar a importância de conduzir o símbolo Olímpico representando milhares de mulheres que sofrem violência. "Comecei o Think Olga porque a gente precisa falar sobre a culpabilização da vítima, que é para tudo: violência doméstica, estupro, assédio. A vontade era de debater", disse a jornalista de 31 anos, fundadora da campanha online Chega de Fiu Fiu e #PrimeiroAssédio. "Esses pequenos movimentos de mulheres que tiveram coragem de contar suas histórias fazem com que a gente vá tirando a sujeira debaixo do tapete."


Fonte: Conexão Jornalismo

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