Desmatamento
na Amazônia em junho cresce quase 60% em relação ao mesmo período
em 2018
Números do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que acumulado do primeiro semestre de 2019 também supera índices do ano passado
Zona desmatada da Floresta Amazônica para o plantio de soja, em Mato Grosso, em foto de outubro de 2015 Foto: PAULO WHITAKER / Agência O Globo
"A preocupaçãointernacional
em
torno do desmatamento
na
Amazônia,
que
resultou em forte pressão
política
sobre o presidente Jair
Bolsonaro no
encontro do G20, em Osaka, no Japão, deve ganhar corpo com os
números atualizados do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), vinculado ao Ministério
da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações .
Em junho, a Amazônia perdeu 762,3 km² de floresta, o
equivalente a duas vezes a área de Belo
Horizonte. É
o pior registro do mês desde 2016. No acumulado dos últimos 180
dias, o quadro também inspira preocupações.
No
mesmo período, em junho de 2018, o desmatamento havia sido
de 488,4 km². Na prática, a floresta perdeu duas
cidades do porte de Paris a mais em comparação ao ano passado. No
acumulado de 2019, o Brasil viu uma
redução de aproximadamente 1,5 vez o território da cidade de
São Paulo: 2.273,6 km².
O
Inpe trabalha com satélites que calculam o desmatamento com base em
diferentes filtros.O sistema é criticado pelo ministro do Meio
Ambiente, Ricardo
Salles, que
defendeu em diferentes ocasiões a contratação de uma empresa
privada estrangeira para o monitoramento da Amazônia. O instituto,
por sua vez, defende a precisão dos dados.
Os
números desta reportagem levam em conta desmatamentos com solo
exposto, com vegetação e derrubadas resultantes de atividades
ligadas à mineração, metodologia adotada pela ONG Observatório do
Clima. Na série histórica da plataforma Terra Brasilis,
disponibilizada pelo instituto e iniciada em 2015, os números deste
ano só são superados pelos de 2016, que registrou, até junho
daquele ano, 3.183 km² de áreas desmatadas. Naquela ocasião, os
índices foram os piores desde 2008. quase
60% em relação ao
O
cenário coloca em xeque as metas do Brasil para o Acordo
de Paris,assinado
em 2015. No documento, o país se comprometeu a zerar o
desmatamento ilegal na
Amazônia até 2030 e a compensar os gases poluentes emitidos pela
ação de derrubada da
floresta até o fim da próxima década. Há, ainda, a Lei 12.187,
assinada em 2009 para firmar o compromisso do Brasil junto às Nações
Unidas de
reduzir o desmatamento da Amazônia
Legal para
3.907 km² até 2020.
Balsa
transporta troncos de árvores no Pará, estado mais afetado pelo
desmatamento de acordo com os números do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais Foto: Frame / Agência O Globo
Para
Carlos Ritti, secretário-executivo do Observatório do Clima, o
quadro confirma a agenda “antiambiental” defendida pelo governo
federal.
— A
variação tem uma digital para trás, que é a do governo Jair
Bolsonaro. O discurso na campanha se reflete na redução no
combate ao desmatamento. O número de operações foi 70%
maior de janeiro a abril. Não é uma variação, digamos, esperada
de um início de governo. Se no discurso você estimula e diz que vai
tirar o governo das costas de quem quer produzir, estamos, na
verdade, tirando o governo das costas de quem está cometendo
crimes ambientais — avalia Ritti.
Sobre
as críticas de Salles ao monitoramento do Inpe, o ambientalista é
taxativo: — O sistema
do Inpe visa alertar os órgãos ambientais para que vão a
campo para acabar com o desmatamento. Ele não detecta o desmatamento
em sua totalidade. Esses números mostram uma tendência muito forte,
mas não permite dizer que foi só isso que foi desmatado —
explica o secretário-executivo. — Os dados não importam ao
governo assim como os do IBGE, os da Fiocruz. A metodologia é
reconhecida mundialmente como muito robusta. O ministério e
o Ibama estão recebendo informações sobre o desmatamento ilegal
dentro e fora de propriedade privada e têm todos os instrumentos
para agir. Cabe ao ministro a responsabilidade de colocar equipes em
campo, até porque recursos não faltam.
O Ministério
do Meio Ambiente ainda
não nomeou chefes para as superintendências dos estados que compõem
a Amazônia Legal. Segundo estimativa do Observatório do Clima,
quase 99% do desmatamento ocorrido em 2019 tem origem ilegal.
Acordos na mira
Embora
o acordo
comercial entre
o Mercosul e
a União
Europeia (UE),
fechado durante o G20, condicione os benefícios eventualmente
aproveitados pelo Brasil ao desenvolvimento sustentável, faltam
indícios de que o país cumprirá o requisito. Enquanto o martelo
era batido em Osaka, o Fundo
Amazônia, iniciativa
financiada pelos governos Alemanha e Noruega voltada
para a proteção do bioma, vive momentos de suspense.
O
comitê organizador responsável pelo projeto não foi renovado no
decreto presidencial da última sexta-feira, enquanto o governo
negocia um novo formato com os dois países europeus. Boa parte do
financiamento do Ibama, por exemplo, deriva atualmente do fundo,
considerado uma iniciativa de sucesso internacionalmente.
- (A indefinição sobre o futuro do Fundo Amazônia) É uma tentativa de ingerência política do Ministério do Meio Ambiente e de Ricardo Salles sobre a questão — avalia o secretário-executivo da ONG.O endurecimento do discurso de lideranças europeias como o presidente da França, Emmanuel Macron, não impedirá que o desmatamento ilegal avance, teme Ritti. Para ele, o bloco europeu “assinou um cheque em branco” em relação ao aumento da violência contra povos indígenas e do desmatamento. Ele afirma, ainda, que o acordo significa um incentivo a mais para o desmatamento na Amazônia, com as portas abertas para a expansão da produção e da competitividade no mercado brasileiro, além de estimular novas mudanças na legislação ambiental.
Ainda
de acordo com Ritti, o próprio acordo com a União Europeia
pode ficar na berlinda se o Brasil persistir nas políticas adotadas
desde a posse de Jair
Bolsonaro. O
ambientalista também critica a decisão do bloco europeu:
–Temos no
acordo referências a questões de proteção do meio ambiente, como
no Acordo de Paris. Tudo isso é bonito no papel Como traduzir isso
em mecanismos? O que vai assegurar que esse país cumpre? Não
estamos perdendo apenas governança ambiental, climática,
extinguindo conselhos. Na prática, o que está acontecendo é
justamente o contrário do que os governos europeus cobraram do
Brasil no discurso. Se o acordo entrar em pleno vigor
em dois ou três anos, corremos o risco de perder muita floresta, e
haverá uma digital da UE por trás disso.
Procurando
pela reportagem do GLOBO, o Ministério do Meio Ambiente não
respondeu aos questionamentos ainda."
Fonte:
O Globo
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