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quinta-feira, 18 de julho de 2019

O que diz a legislação sobre nepotismo?




Por Vinícius Passarelli – Estadão

A eventual indicação de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), deputado federal e filho do presidente Jair Bolsonaro, para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos levantou o debate sobre o nepotismo por parte de agentes públicos.

O presidente Jair Bolsonaro já afirmou que a indicação de seu filho para a embaixada não configura nepotismo, uma vez que uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) leva à jurisprudência de considerar nepotismo apenas nomeações de parentes para cargos administrativos, e não para cargos políticos, o que seria o caso do cargo de embaixador.

O ministro do STF Marco Aurélio Mello, no entanto, afirmou que a eventual indicação é um “péssimo exemplo” e que pode ser enquadrado como nepotismo.

O que é nepotismo?
A prática do nepotismo se dá quando um agente público se utiliza de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer cônjuge, companheiro, parente em linha reta ou colateral, por consanguinidade ou afinidade, até o 3º grau.

Ou seja, o nepotismo acontece quando as relações de parentesco são fator determinante para a nomeação de alguém para cargo ou função pública em comissão, de livre nomeação, em detrimento da capacidade técnica do contratado.

A princípio essa prática já é vedada pela própria Constituição Federal de 1988 que determina que a administração pública deve ser conduzida pelos princípios da “moralidade e da impessoalidade”. No entanto, algumas legislações esparsas tratam do tema de forma mais específica.

Quais são os tipos de nepotismo?
Quando um agente público nomeia diretamente um familiar seu, até o terceiro grau de parentesco, configura-se o nepotismo direto. 

Há também o chamado nepotismo cruzado ou recíproco, que é uma espécie de troca de favores entre agentes públicos: um nomeia familiar de outro e vice e versa.

Como o nepotismo é tratado na legislação?
O principal dispositivo jurídico que regulamenta a prática no País no âmbito do Poder Executivo Federal é um decreto presidencial de 2010 (decreto nº 7203), emitido pelo entãopresidente Luiz Inácio Lula da Silva, que veda o nepotismo nos órgãos e entidades da administração pública federal direta ou indireta.

O decreto prevê as situações em que o nepotismo é presumido e as quais precisam de uma investigação específica. A contratação de familiares para cargos em comissão e função de segurança, a contratação de pessoa jurídica de familiar por agente público responsável por licitação e a nomeação de familiares para vagas de atendimento a necessidade temporária de “excepcional dinheiro público” são consideradas situações de nepotismo presumido.

Por outro lado, algumas situações não são tão claras e precisam de investigação específica, como o nepotismo cruzado, a contratação de familiares para prestação de serviços terceirizados e contratações não previstas expressamente no decreto, com indício de influência.

A súmula vinculante nº 13 do STF que trata de nepotismo  
Outro documento jurídico importante em relação ao nepotismo e que tem baseado a maior parte das decisões sobre o assunto é a súmula vinculante nº 13, de 2008, do STF, que proíbe o nepotismo nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, no âmbito da União, dos Estados e dos municípios, independentemente de lei, uma vez que a prática fere diretamente a Constituição.

A súmula estabelece que a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, viola a Constituição. “Inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas”, diz o documento do STF.
A súmula vinculante é um verbete editado pelo próprio STF, apoiado em diversas decisões sobre a mesma matéria, que tem efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública.

É com base nessa súmula que a jurisprudência adotada pelo Supremo tem determinado que não se enquadra como nepotismo a nomeação de parentes para cargos eminentemente políticos, apenas para cargos administrativos ou em comissão.
É assim que se tem interpretado”, afirma a advogada e mestre em direito público e administrativo pela Fundação Getúlio Vargas Vera Chemim. “No entanto, de acordo com a Constituição, com a lei de improbidade administrativa e com o próprio decreto de 2010, há o conceito amplo de agente público, que engloba cargos administrativos e políticos e, portanto, acredito que o nepotismo deve englobar também cargo político”, diz a especialista, que lembra que há um recurso parado no STF que pede a revisão dessa exceção.

O recurso extraordinário, apresentado em 2018, já teve repercussão geral reconhecida, por unanimidade, em votação pelo plenário virtual da Corte. Resta agora o plenário votar o mérito do recurso e definir se a proibição do nepotismo pela súmula vinculante nº 13 alcança a nomeação para cargos políticos.

O recurso foi apresentado em razão de uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo no Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) para questionar uma lei municipal, do município de Tupã (SP), que passou a desconsiderar nepotismo a nomeação de parentes dos nomeantes para o cargo de agente político de secretário municipal.

À época, o ministro Luiz Fux, relator do recurso, afirmou que o debate se resumia a saber se a nomeação de familiares para cargos políticos deve ser considerada inconstitucional ou não.

A discussão orbita em torno do enquadramento dos agentes políticos como ocupantes de cargos públicos, em especial cargo em comissão ou de confiança, mas, ao não diferenciar cargos políticos de cargos estritamente administrativos, a literalidade da súmula vinculante sugere que resta proibido o nepotismo em todas as situações”, observou Fux.

Improbidade administrativa
Além destes dispositivos legais que tratam diretamente do nepotismo Vera Chemim chama a atenção também para a Lei de Improbidade Administrativa que, assim como a Constituição, determina que agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a observar os princípios de legalidade, impessoalidade e moralidade no desempenho de suas funções.

O nepotismo pode ser enquadrado como um ato de improbidade administrativa por configurar falta de decoro. Por se tratar de uma matéria administrativa e não penal, seria prevista apenas sanção administrativa, que pode variar desde uma simples anulação da nomeação até um processo de perda dos direitos políticos e de função pública, a depender das circunstância e da autoridade envolvida”, afirma a especialista.

Em relação à pessoa contratada, se configurado o nepotismo, ela deve ser exonerada ou ter o ato normativo que determinou sua contratação cancelado.”

Fonte: Estadão

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