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sábado, 23 de outubro de 2021

""O Que Fazer Quando o Abismo Olha para Você?"

 

Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você. 

Friedrich Nietzsche


Se for em época de crise que conhecemos verdadeiramente as pessoas, a recente pandemia mostrou diversas facetas da Humanidade que não enxergávamos ou fingíamos não enxergar. Incontáveis pessoas foram vitimadas não pelo vírus, mas pela ganância, pelo orgulho e pelo egoísmo, filhas e filhos da Ignorância.  

A crise sanitária mundial nos mostrou que estamos cada vez mais conectados de forma global, mas o sentimento predominante ainda é tribal. A xenofobia mostrou-se latente e explodiu contra etnias consideradas “culpadas” pela origem e transmissão da Covid-19. Em muitos países, decisões foram tomadas não em virtude da proteção à vida, mas para evitar maiores prejuízos financeiros, mostrando o enorme poder do “deus dinheiro”. E milhões de pessoas deixaram de tomar medidas preventivas elementares, devido a crenças de diversas naturezas.

Para tornar a combinação ainda mais explosiva, a situação foi manipulada por pessoas que viram na crise a oportunidade para obterem mais poder ou dinheiro (ou ambas as coisas ao mesmo tempo). Como consequência, tornou-se praticamente impossível uma estratégia unificada de combate à doença e suas consequências, fazendo com que o ditado romano “dividir para conquistar” estivesse ao lado do vírus. A divisão alcançou sociedades inteiras, e não raro temos conhecimento de casos onde familiares deixaram de se falar em virtude das diferenças geradas mais por falastrões, picaretas e aproveitadores.

Neste cenário de tragédia grega, confesso que meu grande desafio pessoal foi o de manter a fé na Humanidade. Grande investidor de tempo e recursos em apoiar projetos que apontem novos caminhos e soluções para os grandes desafios que enfrentamos, vi minha motivação esvaziar a cada falso remédio divulgado, a cada decisão baseada nos cifrões e não na manutenção da batida dos corações. Notícias complementares referentes à degradação da natureza apenas tornavam o caldo ainda mais venenoso, lentamente tomando a minha confiança de que realmente estamos evoluindo para alcançar toda a potência de que somos capazes.

O abismo me encarava fixamente, dentro dos meus olhos, e eu estava prestes a piscar. As notícias sobre como as pessoas mantinham a solidariedade e a vontade de apoiar o próximo eram como combustíveis que ainda mantinham a chama acesa. Mas o abismo não desistia.

Até que, em uma livraria, folheando um livro de Osho, li uma fábula que compartilho a seguir conforme minha memória.

Certa vez, em uma região da Índia, um imperador sentiu que a morte se aproximava. Ele tinha três filhos, e um deles precisava ser escolhido como o novo imperador. Mas quem deveria ser escolhido? A escolha precisava ser feita com todo o cuidado, pois o futuro do reino estava em jogo.

Até que o imperador decidiu o que fazer. Chamou os três filhos e lhes deu uma tarefa: deveriam ser capazes de preencher seus palácios completamente, utilizando apenas a quantia que o imperador lhes daria. Os três concordaram, e o imperador concedeu cem rúpias para cada um.

“Esta é uma quantidade de dinheiro muito pequena para preencher todo um palácio!” pensou o primeiro filho. Ele então teve uma ideia. Decidiu apostar o dinheiro recebido e, como o valor do prêmio, então poderia preencher todo o palácio. Mas ele perdeu a aposta e, consequentemente, todo o dinheiro que recebeu para a tarefa.

“Só há uma maneira de preencher um palácio com esta quantia de dinheiro.” Pensou o segundo filho. E com o dinheiro recebido para realizar a missão, comprou toneladas de lixo, e preencheu todo o palácio com ele. O cheiro do palácio ficou insuportável, as pessoas começaram a se afastar do local quando passavam perto, mas ele conseguiu preencher todo o espaço disponível.

O terceiro filho apenas refletiu o que fazer com o dinheiro e tomou as ações que planejou.

Terminado o prazo para a conclusão da tarefa, o imperador visitou o palácio do primeiro filho. Estava completamente vazio. “A quantia de dinheiro era muito pequena para que eu pudesse preencher o palácio.” – respondeu o filho.

O imperador foi então para o palácio do segundo filho. Ele mal conseguiu se aproximar da construção, pois o mau cheiro era muito forte, tornando impossível ficar nas proximidades durante muito tempo. “Apenas lixo foi o que consegui comprar para preencher todo o palácio.” – disse o segundo filho.

O imperador se dirigiu então para o terceiro e último palácio. Ao se aproximar, sentiu um perfume maravilhoso. Várias pessoas estavam nas proximidades, maravilhadas com o aroma que saía do palácio. O imperador se aproximou e o filho o recebeu.

“O que fez com a quantia que lhe cedi? Como preencheu o palácio?”. O terceiro filho sorriu e abriu as portas. Centenas de velas iluminavam o ambiente, enquanto as flores inundavam o ambiente com seu perfume. “Eu o preenchi de luz” – respondeu o filho. É claro que ele foi escolhido como o novo imperador.

Não estamos em uma sociedade perfeita. Talvez ainda demore muito para que alcancemos níveis de consciência que nos permitam perceber que a maior parte dos nossos problemas são causados por nós mesmos. Em muitos momentos, lidaremos com os aspectos mais obscuros e negativos da natureza humana. Nestes momentos, o abismo olhará com firmeza para nós, convidando-nos à união com ele. E o incentivo que temos para não cedermos à tentação é nos lembrarmos de que, por menos recursos que tenhamos, sempre poderemos optar em encher nossos próprios palácios de luz.

Então, teremos alcançado a característica daqueles que, mesmo cercados de sombras, foram capazes de gerar claridade àqueles à sua volta: a Resiliência.

Maurício Luz

Maurício Luz escreve a Coluna "Frases em Nosso Tempo", aos sábados para O Guardião da Montanha.

Ele é carioca e ganhou prêmios:

1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”. 

E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..

Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ. 

Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.

Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997). 

Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012). 

Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019). 

Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.

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