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quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Notícias locais: Meio Ambiente a COP26 precisa saber

Foto acervo INB

Além do descaso com o desmatamento e as queimadas na Amazônia e no Pantanal. Ainda temos no Sul de Minas, material radioativo.       

Por Tania Malheiros, especial para o Jornal GGN

Torta II: herança maldita pode ter solução, se oferecida ao mercado externo

"O Brasil poderia colocar um ponto final nos problemas causados pelos estoques de Torta II (material radioativo), no município mineiro de Caldas, Planalto de Poços de Caldas, e em São Paulo, se realizasse uma oferta pública internacional para a venda do produto, armazenado há décadas nas Unidades da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB). Torta II é subproduto de areias monazíticas contendo urânio e tório, materiais estratégicos da indústria nuclear.   

“A venda da Torta II seria um grande negócio, independente do valor da melhor oferta”, garante o professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Aquilino Senra, doutor em Ciências de Engenharia Nuclear, que presidiu a INB de 2013 a 2016. Na época, ele chegou a assinar um acordo com a Global Green Energy Sciense, de Taiwan, para a venda de 16 mil toneladas de Torta II, por R$ 65 milhões. Mas o negócio, amplamente divulgado, não prosperou.    

Em entrevista ao Jornal GGN, ele relembrou a complexa negociação com a China e a assinatura de contrato, mas dois requisitos essenciais não foram atendidos pela empresa compradora: a licença de importação no país de destino e a declaração de usuário final.

O negócio precisava de garantias de recebimento do carregamento. “Não se pode carregar um navio sem saber o destino final do produto; isso não ocorreu até a minha saída da INB”, disse. Em sua opinião, se liberar da Torta II a qualquer preço, até mesmo sem retorno financeiro, seria muito bom para o Brasil.”

Afinal, a manutenção dos estoques de Torta II em Caldas, e na Usina de Interlagos (USIN-SP), e na Unidade de Estocagem de Botuxim (UEB), do sitio São Bento, município paulista de Itu, com tambores se deteriorando, ameaçando contaminar o meio ambiente, pode custar muito mais caro do que o seu livramento. Mas enquanto o governo não toma uma decisão, a existência da Torta II vai espalhando medo e prejuízos por todos os lados. Inclusive, com as despesas para o País de manter a situação como está há décadas.

Para se ter ideia, no meio do ano a INB teve que substituir as coberturas (telhados) de silos que abrigaram 15 mil tambores com Torta II. O trabalho levou cerca de 120 dias e ficou por conta de pessoal terceirizado. A área total construída é de 724.1232 metros quadrados. A INB não divulgou o valor do investimento.  

HERANÇA MALDITA

A unidade de Caldas está instalada numa de área de cerca de 18 km2, onde funcionou a primeira unidade de mineração e beneficiamento de urânio do Brasil. Oficialmente, a exploração começou no início da década de 80. Desativado em 1995, o local começou a ser usado como depósito da Torta II que hoje chega a 12.500, procedentes da empresa federal Nuclemon, no Brooklin, em São Paulo, fechada em 1992.

O transporte de São Paulo para Caldas era feito clandestinamente, em geral de madrugada, para despistar a população sobre a herança maldita que estava recebendo. O verdadeiro “presente de grego” deu os piores frutos à Caldas e municípios vizinhos como Poços de Caldas. Não são raras as notícias sobre problema de contaminação radioativa na barragem, nas águas, solo, entre outras áreas de sua competência, que afligem a todos e afetam o turismo das cidades próximas.    

Em agosto, quando veio a público a intenção de a INB de transferir para Caldas, os estoques de Torta II de suas unidades em São Paulo – cerca de 4 mil toneladas – o assunto reascendeu a preocupação em Minas Gerais. Os planos seriam para descomissionar os dois terrenos e colocar à venda as valiosas áreas paulistanas. Não deu certo.

AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Políticos e ambientalistas têm promovido audiências públicas exigindo explicações da INB. A estatal costuma informar que tudo está sob controle, além de relacionar listas de estudos, providencias e ações, que foram e estão sendo tomadas.

O prefeito de Caldas, Ailton Goulart, chegou a embarcar na sede da INB no Rio, para dizer ao presidente da INB, Carlos Freire, que a sua cidade não receberá a Torta II de São Paulo; e exigiu solução. Freire marcou com o prefeito ida à Caldas, mas dias antes viajou para a Viena, na Áustria, a fim de participar de reunião da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).

Em uma das audiências públicas na Câmara dos Vereadores, as defesas da empresa foram feitas por técnicos, sem a presença do presidente. “Todos os rejeitos têm endereço. Sabe-se onde estão e são monitorados”, afirmou o superintendente de descomissionamento, Diógenes Salgado Alves. Ainda bem! Ele até comentou sobre a possibilidade de a unidade de Caldas servir como depósito definitivo para a Torta II, como aconteceu com os rejeitos de Goiânia, por conta do acidente com césio - 137, há 34 anos. Depois, diante de uma chuva de críticas, a empresa recuou: não há nada definido nesse sentido, disse Diógenes.

Pelo visto, o material radioativo paulista só entrará na cidade se for pela porta dos fundos, num esquema muito secreto, porque população e políticos, agora estão dispostos a enfrentar a situação, que parece não ter solução.  Fica no ar a pergunta. Por que não se retoma a ideia da oferta da Torta II ao mercado externo?

A resposta pode ter sido dada na audiência pública, pelo dirigente do Laboratório de Caldas, que faz parte da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Lapoc/CNEN), Antônio Luiz Quinelato. “Torta II não é rejeito radioativo, sem previsão futura (de utilização). Torta II pode ser aproveitada para recuperação do urânio contido”. O Brasil, então, não quer se livrar do “abacaxi radioativo”, como batizaram a Torta II, em Caldas."

Fonte: Jornal GGN

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