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sábado, 16 de julho de 2022

"Não se Torne Infeliz Buscando pela Felicidade"

   

“Se a casca de um ovo se rompe por uma força exterior, a vida termina. Se a casca se rompe pela força interior, a vida começa.”.

Anônimo

Poucos seres humanos na história foram capazes de poemas e textos tão belos quanto Rumi. O poeta e mestre espiritual sufi viveu entre os anos de 1207 e 1273 (pelo calendário gregoriano). Nasceu próximo à cidade de Khorasan, atualmente localizada no Afeganistão, e faleceu em Konya, hoje pertencente à Turquia. Sua maravilhosa obra, que nos mostra sua profunda sabedoria e devoção, chegou aos nossos tempos, e possui milhões de admiradores em todo o mundo. Rumi já foi citado como o poeta mais vendido nos Estados Unidos, uma prova que o Amor e a Sabedoria transpõe qualquer barreira.

Em uma de suas passagens mais famosas, perguntaram ao mestre espiritual o que seria um “veneno”. Rumi então respondeu: “Qualquer coisa além do que precisamos é veneno. Pode ser poder, preguiça, comida, ego, ambição, medo, raiva, ou o que for.”.

“Ou o que for”. Este ensinamento do Mestre persa ecoa em minha mente quando leio sobre as estimativas da Organização Mundial de Saúde de que mais 300 milhões de pessoas, em todo o mundo, sofrem de depressão. Menos da metade destas pessoas tratam o problema, apesar da existência de tratamento eficaz para a depressão. No Brasil, estima-se que 5,8% população tenha sintomas de depressão, o segundo índice das Américas, atrás apenas dos Estados Unidos.

Em primeiro de janeiro de 2022, a Síndrome do Burnout passou a ser considerada uma doença ocupacional pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A síndrome é relacionada a um alto nível de distress (o ‘stress’ negativo) no trabalho. A síndrome pode levar à depressão e ao total colapso mental e físico. Dentre os fatores causadores da síndrome, estão uma carga excessiva de trabalho, pressões por resultados altos e constantes, longas jornadas, temperadas com uma necessidade de auto-afirmação profissional. No Brasil, é estimado que um em cada três trabalhadores brasileiros apresentem sintomas de Burnout.

Os números mostram a quantidade de pessoas que se sentem infelizes em suas vidas, o que demonstra o crescente interesse e importância da “Ciência da Felicidade”. Este é um ramo do conhecimento humano que busca identificar e estudar os motivos pelos quais o ser humano pode alcançar este estado emocional tão desejado, a Felicidade. Os estudos são multidisciplinares, abrangendo áreas como Psicologia e Neurociência. Universidades mundialmente renomadas como Harvard e Yale disponibilizam cursos sobre Felicidade, sendo que estes cursos estão na lista dos mais procurados.

Desde 2013, no dia 20 de março é celebrado o Dia Mundial da Felicidade, data chancelada pela Organização das Nações Unidas. O advento da denominada “Psicologia Positiva”, que tem em Martin Seligman o seu grande divulgador e mentor, tornou-se praticamente onipresente na vida cotidiana, com vários de seus conceitos aparecendo em frases e “memes” que buscam gerar motivação, ainda que suas origens não sejam claramente identificadas e contextualizadas.

Qualquer coisa além do que precisamos é veneno, disse o Mestre. Será que a busca intensa por Felicidade nos torna mais infelizes?

Em seu livro “Happycracia: Fabricando Cidadãos Felizes”, os autores Eva Illouz e Edgar Cabañas defendem que a busca por Felicidade se tornou uma forma de opressão, ao basear a busca da Felicidade como algo a ser alcançado a qualquer custo, e que alcançar este sonho é uma responsabilidade estritamente individual. Os efeitos colaterais desta simplificação do sentido da vida – alcançar e manter uma sensação de bem-estar – são o sentimento de fracasso por aqueles que, por algum motivo, não alcançaram ou não se sentem em condições de alcançar o que é vendido como “Felicidade”; e a padronização do que seria esta “sensação de bem-estar” e como chegar até ela. 

Quem sente dor ou sofre é um fraco ou alguém que não seguiu adequadamente os passos para se “manter bem”. O sucesso é algo que pode ser medido por fatores como bens materiais e reconhecimento social e profissional. A “Felicidade” é algo que depende apenas de você, uma forma muito prática para que governos, empresas e a sociedade tirem de seus ombros a corresponsabilidade no assunto. Como ninguém quer demonstrar fraqueza, sentir-se bem em qualquer momento e qualquer situação é a regra – uma tendência tão marcante que originou a expressão “positividade tóxica”.

As colocações dos autores me levam ao “World Happiness Report” (Relatório Mundial da Felicidade), uma pesquisa mundial sobre a Felicidade que procura levantar dados sobre este tema e que completou dez anos de existência justamente neste ano de 2022. Com base nas respostas obtidas em entrevistas realizadas em dezenas de países, o relatório aponta uma classificação dos “países mais felizes” e tendências sobre a felicidade mundial. A existência do relatório, por si mesmo, confirma um dos pontos levantados por Illouz e Cabañas em seu livro: a criação de metodologias para quantificar questões subjetivas como bem-estar e prazer, e índices e parâmetros para medir a felicidade e, como consequência, o direcionamento de políticas públicas.

Mas um dos pontos apontados no relatório de 2022 chamou-me bastante a atenção: que a recente pandemia mundial de Covid-19 aumentou as ações de caridade e benevolência humanas. Segundo o relatório, a pandemia demonstrou a “crucial importância da confiança para o bem-estar humano”. E que as mortes provocadas por Covid-19 durante os anos de 2020 e 2021 foram significativamente menores nos países com maior confiança nas instituições públicas e onde a desigualdade é mais baixa. 

A sensação de bem-estar é mais facilmente alcançada pelos indivíduos quando a coletividade se une para isto. E uma das formas que a coletividade pode facilitar o alcance da Felicidade pelos indivíduos é quando, justamente, não impõe padrões, fórmulas ou receitas sobre o que é Felicidade. Esta pressão externa, nem sempre sutil, rompe as cascas da individualidade com consequências sombrias, muitas vezes levando ao fim da vida.

E se é a saudável pressão interna ou força interior que leva à vida, que pressão é esta? De onde vem esta força interior?

A resposta a esta pergunta é a chave da Felicidade. Ninguém poderá respondê-la por mim. Apenas eu posso definir o que é Felicidade para o ser que sou. É quando descubro esta resposta que vem a força interior que me levará à minha vida.

As reflexões me levam à lembrança do histórico encontro entre Alexandre, o Grande, imperador da Macedônia; e Diógenes, considerado um dos homens mais sábios da Grécia. Diógenes se tornou conhecido por seu comportamento e por sua filosofia. Vivia dentro de um barril na cidade de Atenas. O imperador Alexandre decidiu conhecê-lo. Ao se aproximar do filósofo, Alexandre apresentou-se dizendo: “Sou Alexandre, o Grande. Diante de mim, prostram-se os reinos. Sou possuidor de muitas riquezas”. Respondeu-lhe Diógenes: “Eu sou Diógenes, e isto me basta.”.

Impressionado, o maior conquistador do mundo antigo insistiu: “Diga-me o que deseja, que lhe concederei.”. E para surpresa de Alexandre e de todos que estavam com ele, o filósofo apenas disse: “Quero apenas que saia da frente do meu Sol, pois está fazendo sombra.”.

Os soldados do séquito de Alexandre começaram a zombar do filósofo. Imediatamente, Alexandre os censurou, dizendo: “não zombem deste homem, pois se eu não fosse Alexandre, eu queria ser Diógenes.”.

Consta que ao saber das palavras de Alexandre, Diógenes afirmou: “se eu não fosse Diógenes, também gostaria de ser Diógenes.”.

Não se torne infeliz buscando pela Felicidade em coisas ou padrões externos. Busque dentro de si mesmo, e a Felicidade se mostrará como a rosa se mostra naturalmente em uma roseira bem cuidada. A Felicidade não é um objetivo. Experimentando, acertando, errando, assumindo o que se é, aceitando emoções e sentimentos, perceberemos que a Felicidade é a consequência, e não causa, da sensação que alcançamos quando mergulhamos intensamente em cada momento da vida: a Alegria.


Maurício Luz

Maurício Luz escreve a Coluna "Frases em Nosso Tempo", aos sábados para O Guardião da Montanha.

Ele é carioca e ganhou prêmios:

1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”. 

E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..

Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ. 

Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.

Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997). 

Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012). 

Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019). 

Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.

Agora neste ano de 2022, Maurício Luz cursa o Doutorado em Administração pela Universidade Caxias do Sul, RS

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