segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Pena de Morte - Justiça ou vingança?


 PENA DE MORTE - UMA PENA    por Luciano Cabral
  
Somos seres passionais. Nossa razão, por inúmeras vezes, coloca-se a serviço de nossas crenças, nossas paixões, nossas vocações e nossas emoções. Tecemos argumentos convincentes, cercados de sol e lua, amor e ódio e tudo o que existe no universo das paixões.

Quem perdeu um ser amado na ponta de uma arma branca, na mira de um tiro, no tsunami da dependência ou do tráfico de drogas, nas funestas consequências do redemoinho do crime, não raro, torna-se a favor da pena de morte contra assassinos, traficantes, aliciadores. A aliança de dor e revolta pode mascarar como  “Justiça” o que, de fato, seria “Vingança”. A lógica? Aquela em que o rancor e a falta de percepção de que o “vilão” é também uma vida humana como todas as outras. Na frieza da angústia, os que a apóiam dirão que haverá um criminoso a menos nas ruas, um gasto a menos do contribuinte com o sistema carcerário, e que os valores economizados com esse presidiário poderiam minimamente colocar uma criança a mais numa escola ou permitir um atendimento a mais no Sistema Único de Saúde. Há coerência nisso. Mas haverá “Verdade”? A resposta reside no íntimo de cada qual, e eu os convido à reflexão.

Exterminar é igualar-se ao criminoso
No outro extremo dessa postura, qualquer pessoa “de bem” que possua algum afeto no mundo dos errantes pede a Deus e aos mortais uma oportunidade de regeneração em favor do desviado. Sofre inocentemente pela decepção com as faltas do ser amado e não acredita que esse sofrimento termine com sua morte. Aprende que uma palavra inadequada dirigida no momento errado a uma pessoa pode ter consequências funestas. Inclusive num julgamento.

Que argumentos haverá contra a pena de morte?
- Exterminar é igualar-se ao criminoso na ação, apesar da diferença dos motivos;
- A Pena de Morte não oferece ao réu segunda oportunidade e não resgata sua trajetória até o mundo do crime para propor um caminho de retorno. Tampouco abre oportunidade para redenção, hipótese que considera a possibilidade de que o condenado possa trabalhar para a recuperação de suas vítimas ou para prevenir ações criminosas semelhantes à que cometeu;
- O condenado à morte não aprende com seus erros nem os expia; sequer tem tempo para avaliar sua conduta ou arrepender-se, tomado pela revolta da condenação. Torna-se ainda mais perigoso quando nada mais tem a perder, ante a possibilidade de uma fuga;
- O fato de pagar pelo crime com a morte não trará de volta a vítima nem reverterá a história;
- Há risco de erro jurídico levando à morte um inocente (concordariam que Jesus Cristo é o maior exemplo histórico dessa arbitrariedade?);
- Eliminar o criminoso não muda o quadro social gerador da modalidade do crime cometido. É como arrancar o dente que dói, sem tratar a cárie, as causas das cáries ou sua prevenção;
- A Pena de Morte retira do cidadão a responsabilidade de ser participativo no amplo processo social. Em vez de procurar soluções para os problemas (que também poderão atingi-lo) prefere a cômoda posição de ignorá-los ou eliminá-los (e depois reclama da ineficiência dos “políticos”).

Penso que o crime existe pela falta de compaixão e de respeito, que são substituídos por ganância (por vezes alimentada pela publicidade), pela falta de escrúpulos, pelo inconformismo e pela falta de preparo para se viver em uma sociedade estratificada na qual infelizmente representamos apenas um número estatístico, não seres humanos. Esse é nosso pior massacre. Quantas vezes a “chamada” nas escolas é feita pelo “número” do aluno?

Descrença pública na Justiça
Acredito que precisamos de amplas mudanças sociais e de conceitos. De reescrever, na história, o Sistema Judiciário com Leis Justas, severas (não essa ciranda de prisões e libertações),  mas capazes de, em sua dura aplicação, reeducar o criminoso - e não colocá-lo em curso avançado de criminalidade no cárcere, como lamentavelmente acontece no presente. A discussão sobre a Pena de Morte somente terá lugar quando tivermos esgotado todos os recursos a ela alternativos e não como o abandono da responsabilidade de repensar nossa sociedade. Precisamos de mais comprometimento.

A propósito, sinto no ar descrença pública pela Justiça. E receio pela possibilidade de que muitos cidadãos, imbuídos de prevenção e até de vingança, possam continuar, com o nome de “milícias” ou outro qualquer o que erroneamente seria chamado de “justiça pelas próprias mãos”. A Sociedade caminha para impensável grau de violência e urge uma guinada de 180 graus, com retomada das regras de boa convivência. Estamos muito divididos. A esse respeito, vale recordar que a história nos mostra, na política do “dividir para centralizar”, adotada pela Espanha em suas colônias latinoamericanas, como a falta de integração e diálogo franco só nos fragiliza e nos deixa vulneráveis a todas as formas de dominação...

Como se pode observar, o mundo sem paixões é robótico e cibernético. Não conseguiremos sobreviver nele, pois não concebemos hoje ou em qualquer tempo pretérito a perda de nossa individualidade. Sem nossas paixões, não haverá compaixão. Nem amor, ódio, rancor, nem nosso senso do que é correto e do que não é, nem a Justiça. Por essas paixões nos precipitamos e “escorregamos” na aplicação da Justiça. Mas há algo pior do que nossa incapacidade de sermos verdadeiramente justos: nossa omissão. No geral, preferimos uma cerveja à idéia de nos ocuparmos com “problemas abstratos”, dos quais trataremos quando nos atingirem...

Idealismo? Vale a pena viver sem ele?
A vida não foi criada por nós.  Não podemos decidir sobre ela. A discussão sobre a Pena de Morte encontra-se amparada por lógica quando não questionamos nosso papel na Sociedade. Quando aceitamos pacificamente o que nos entregam como “realidade”. Para quem não questiona, reclamar é direito perdido. Não conseguiremos, apesar da vontade  e dos temores, fugir de nossos medos e de nossas dores.  Mas podemos decidir sobre condutas e ações que permitam que esse mundo atual tão absurdo e indignante possa caminhar, entre erros, desvios e acertos, para aquele melhor no qual gostaríamos de viver. Idealismo? Sim. Vale a pena viver sem ele?

                                                 
Luciano Neiva Cabral  (foto) - Bacharel em Comunicação Social (Radialista - locutor, produtor e diretor de rádito e televisão) graduado pela Universidade Federal de Juiz de Fora e Oficial de Chancelaria pelo Ministério das Relações Exteriores. Trabalhou em Embaixadas e em Repartição Consular em países da Ásia, Europa e Américas Central e do Sul como Vice-Cônsul e na Área de Administração e Contabilidade.

2 comentários:

  1. Será que tem volta?
    Me parece que não. O mundo está num processo "de limpeza" para isto as mazelas precisão estar bem a vista de todos.Aja estomago!

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