Incêndio no prédio do Museu Nacional. FUTURA PRESS/FOLHAPRESS |
"Fogo começou por volta de 19h30,
quando o prédio já estava fechado para os visitantes Calcula-se que o acervo
tenha 20 milhões de itens"
“As chamas começaram por volta de 19h30, quando
o prédio histórico, na Quinta da Boa Vista, zona norte do Rio de Janeiro, já
havia sido fechado para o público. As imagens aéreas mostram o edifício
completamente tomado pelas chamas e a dificuldade dos bombeiros de
controlá-las. Já há setores do prédio sem qualquer cobertura de telhado.
"Não vai sobrar absolutamente nada do Museu Nacional", afirmou o
vice-diretor da instituição, Luiz Fernando Dias Duarte, em entrevista à GloboNews. "Os 200 anos
de história do país foram queimados", disse.
O Museu Nacional, a mais antiga instituição científica brasileira e o museu
mais antigo do país, foi destruído por um incêndio de grandes proporções na
noite deste domingo.
Segundo o Corpo de Bombeiros não há notícias de feridos. Havia
apenas quatro vigilantes no local no momento em que o fogo começou e eles
conseguiram escapar. Ainda não há pistas do que pode ter provocado as chamas.
Segundo os bombeiros, o trabalho foi dificultado porque os hidrantes do museu
estavam descarregados e foi necessário pedir o apoio de carros-pipa. Alguns
pavimentos internos do prédio desabaram, mas parte do acervo conseguiu ser
retirado antes. Atuam no combate às chamas equipes de 20 quartéis do Rio de
Janeiro. Os bombeiros não tinham água para apagar o incêndio.
Egito antigo |
O prédio foi
criado por D. João VI e completou 200 anos em 2018. O edifício, que é tombado
pelo patrimônio histórico, foi residência da família Real e Imperial
brasileira, e tem uma ampla estrutura feita de madeira, o que facilita com que
as chamas se espalhem. O prédio sofria com problemas de falta de manutenção,
como cupins que corroíam a estrutura e queda de reboco. Em fevereiro deste ano,
Alexander Kellner, diretor do museu, reclamou ao jornal O Globo da falta de verba para a manutenção do local.
"Felizmente essas pragas [morcegos e gambás] não têm aparecido no acervo,
mas ainda podem ser vistas nas áreas comuns. O maior problema são as goteiras.
Ficamos preocupados quando cai uma tempestade porque só temos verbas para
medidas paliativas de prevenção."
O acervo
do museu é composto por cerca de 20 milhões de itens. Entre os destaques
estão a coleção egípcia, que começou a ser adquirida pelo imperador Dom Pedro I; o mais antigo
fóssil humano já encontrado no país, batizado de "Luzia",
com cerca de 11.000 anos; um diário da Imperatriz Leopoldina; um trono do Reino
de Daomé, dado o Príncipe Regente D. João VI, em 1811; o maior e mais importante
acervo indígena e a biblioteca de antropologia mais rica do país. Até este
momento não é possível saber exatamente qual o dano provocado pelas chamas,
mas, segundo um funcionário da instituição que acompanhava o combate às chamas
disse à GloboNews, toda a área de exposição do museu foi atingida.
A instituição,
ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vinha sofrendo com os cortes orçamentários há pelo menos três anos.
Alunos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da universidade, que
atuam no museu, chegaram a criar memes em que mostravam fósseis esperavam a
verba, ironizando os cortes, quando, na época, a previsão era a de que só se
receberia 25% do Orçamento previsto para pesquisa no ano. Neste mesmo ano, o
museu chegou a ficar fechado por dez dias após uma greve de funcionários da
limpeza que reclamavam salários atrasados. Nas redes sociais, pesquisadores,
alunos e professores brasileiros também compartilham seus depoimentos,
lamentando o ocorrido e creditando a tragédia ao corte de custos vivido nos
últimos anos.
Ainda em
entrevista à GloboNews, o vice-diretor do Museu Nacional qualificou o incêndio
como uma "catástrofe insuportável". "O arquivo de 200 anos virou
pó", disse. "São 200 anos de memória, ciência, cultura e educação,
tudo se perdendo em fumo por falta de suporte e consciência da classe política
brasileira. Meu sentimento é de imensa raiva por tudo o que lutamos e que foi
perdido na vala comum", ressaltou ele, que afirmou que no aniversário de
200 anos da instituição nenhum ministro de Estado aceitou participar da
comemoração. "É uma pequena mostra do descaso", disse ele, que afirmou
que a instituição estava fechando uma negociação com o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que
incluía, justamente, um projeto de prevenção de incêndios. "Veja,
conseguimos isso junto a um banco. Nunca conseguimos nada do Governo
brasileiro. A universidade federal vive à mingua", desabafou.
O ministro da
Cultura, Sérgio Sá Leitão, afirmou à emissora que o ocorrido é parte de
"processo de negligência de anos anteriores" e que isso "sirva
de alerta para que não aconteça em outros museus". "Medidas que
poderiam ter sido tomadas anteriormente não foram tomadas", destacou ele,
que disse que foi feito um projeto para a revitalização do prédio e os recursos
foram levantados, "mas não deu tempo de evitar a tragédia".
Em nota, o
presidente Michel
Temer afirmou que a perda do acervo do Museu Nacional é
"incalculável para o Brasil". "Hoje é um dia trágico para a
museologia de nosso país. Foram perdidos duzentos anos de trabalho, pesquisa e
conhecimento. O valor para nossa história não se pode mensurar, pelos danos ao
prédio que abrigou a família real durante o Império. É um dia triste para todos
brasileiros". O Ministério da Educação, ao qual a UFRJ é ligada, também
lamentou por nota e disse que "não medirá esforços para auxiliar a universidade
no que for necessário para a recuperação do patrimônio histórico."
Criado por D. João VI, em 06 de junho de 1818 e inicialmente, sediado no Campo de Sant'Ana, serviu para atender aos interesses de promoção do progresso cultural e econômico do país.
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