Presidente do Brasil, Michel Temer |
Por
Flávia Marreiro - EL PAÍS
“A pressão da Operação
Lava Jato se intensifica sobre o Planalto em meio à troca de comando
na Polícia Federal. Em um constrangimento inédito para um
mandatário no exercício do cargo, o presidente Michel Temer teve o
sigilo bancário quebrado por ordem do ministro do Supremo Tribunal
Federal Luis Roberto Barroso. O magistrado autorizou que a PF tenha
acesso às movimentações bancárias de Temer entre primeiro de
janeiro de 2013 e 30 de junho de 2017 como parte do inquérito que
investiga o suposto favorecimento da empresa portuária Rodrimar em
um decreto presidencial de maio de 2017 - o texto mudou regras
de funcionamento dos portos no país.
O Planalto fez circular
na imprensa a mensagem de que foi surpreendido pela decisão de
Barroso, publicada primeiro pela revista Veja, e tentou reagir
rápido. A assessoria de Temer divulgou uma nota, parte dela lida no
Jornal Nacional, da TV Globo, nesta segunda-feira, prometendo dar
acesso à imprensa às movimentações financeiras do emedebista: "O
presidente Michel Temer solicitará ao Banco Central os extratos de
suas contas bancárias referentes ao período mencionado hoje no
despacho do eminente ministro Luís Roberto Barroso. E dará à
imprensa total acesso a esses documentos. O presidente não tem
nenhuma preocupação com as informações constantes suas contas
bancárias", diz a íntegra do texto.
Este é o segundo revés para
o mandatário na área criminal em apenas três dias. O caso dos
portos é uma das duas investigações em curso contra o presidente
no STF, mas é a única que pode se transformar numa terceira
denúncia contra Temer - ele já conseguiu barrar duas na Câmara. A
outra apuração foi desatada na sexta-feira, pelo ministro Edson
Fachin, do STF. Ele autorizou abertura de um inquérito no qual Temer
será investigado sob acusação de capitanear esquema de propinas do
MDB. No entanto, como
se trata de supostos fatos acontecidos em 2014
- portanto antes de Temer chegar ao Planalto -, ele não poderá
ser responsabilizado por eles enquanto for presidente.
O novo cerco acontece
justo quando o Planalto tenta emplacar a agenda da segurança pública
como alavanca para a aprovação do Governo mirando as eleições de
outubro. O sigilo de Temer vai para as mãos de uma Polícia Federal
que acaba de trocar de comando: sai Fernando Segóvia, um nome aliado
do MDB que havia publicamente desdenhado da investigação sobre o
decreto dos portos, e entra Rogério Galloro, tido como mais alinhado
com a Lava Jato.
Coronel
e Loures na mira em caso que remonta os anos 90
O caso que provocou a
inédita quebra de sigilo bancário de um presidente da República é
uma derivação das delações de Joesley e Wesley Bastista. Segundo
o Ministério Público Federal, interceptações telefônicas no
círculo próximo de Temer levaram a suspeitas de irregularidades na
emissão da Medida Provisória dos Portos, em maio do ano passado. De
acordo com o então procurador-geral, Rodrigo Janot, os dados obtidos
continham indícios de que a empresa Rodrimar, que atua no Porto de
Santos, teria sido "ao menos em parte" favorecida no
decreto presidencial - o Planalto pede o arquivamento do caso dizendo
que a firma não foi beneficiada.
Além de Temer e dos
responsáveis pela empresa portuária, ex-assessores e amigos do
círculo mais íntimo do presidente, já citados em outros
escândalos, também tiveram os sigilos bancários quebrados por
conta da investigação: o advogado José Yunes, o coronel reformado
João Baptista Lima Filho e Rodrigo da Rocha Loures, o deputado
flagrado com a mala de dinheiro enviada pelos irmãos Batista.
Yunes, o coronel Lima e
Loures são acusados em diferentes frentes pelos investigadores da
Lava Jato de serem operadores de Temer. Lima, cuja empresa fez a
reforma na casa da filha de Temer, é quem recebeu, segundo o
Ministério Público Federal, parte de dinheiro não declarado
enviado por empresas como a JBS. A relação entre os dois é de
longa data. Quando o presidente foi mencionado pela primeira vez em
um escândalo de corrupção, na década de 1990, vários dos
personagens protagonistas de agora já estavam lá: Lima e a
Rodrimar, por exemplo. O caso viria a ser arquivado por falta de
provas.
Yunes, advogado amigo de
Temer que chegou a atuar no Planalto, é amigo do presidente de longa
data e apareceu nas delações da Odebrecht como responsável por
intermediar o recebimento de dinheiro não declarado da empresa, o
que ele nega. Como revelou o EL PAÍS em outubro passado, o advogado
teve por três anos - a partir de 2013 - uma procuração para
movimentar as contas bancárias da empresa controlada pelo
presidente, a Tabapuã Investimentos. A Tabapuã possui salas
comerciais na Faria Lima com aluguel anual estimado em um milhão de
reais. A empresa de Temer também adquiriu terrenos em Itu em 3
setembro de 2014 - um dia depois que a JBS diz ter entregue um volume
de dinheiro destinado a ele.
Na época da reportagem,
o Planalto respondeu que a evolução patrimonial do presidente era
compatível com suas propriedades: “A reportagem do El País já
aponta a renda de aluguel anual mais do que suficiente para o
presidente Michel Temer adquirir os imóveis. É, portanto,
autoesclarecedora, além de demonstrar a compatibilidade da evolução
patrimonial. Transações registradas em cartório, declaradas no
imposto de renda são lícitas, não restando nenhuma dúvida sobre a
legalidade da compra dos terrenos pelo presidente”, dizia a nota
enviada ao Globo.”
Fonte: El País
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é sempre bem-vinda!