“O Valor fundamental da vida depende da percepção e do poder de contemplação ao invés da
mera sobrevivência”.
Aristóteles
No final da década de 1960, os modelos de automóveis japoneses invadiram o mercado
norte-americano. Baratos, econômicos e com ótima relação custo- benefício, não demorou
para que os carros produzidos pelas empresas do país do sol nascente abocanharam uma
fatia importante do mercado. As tradicionais fabricantes dos Estados Unidos não tardaram a
reagir, lançando modelos compactos e subcompactos para fazer frente às excelentes opções
japonesas.
Em 1971, a Ford lançou seu modelo de subcompacto, lançado com o nome de Ford Pinto.
Nunca saberemos se a empresa norte-americana mudaria o nome do modelo caso fosse lançado
no mercado nacional brasileiro. No mercado dos Estados Unidos, o Ford Pinto foi um sucesso
de vendas. Já no ano de seu lançamento, tornou-se líder de vendas da empresa, que prontamente
lançou um modelo mais potente. Um dos aspectos mais marcantes do lançamento foi o reduzido
tempo entre a decisão da Direção da empresa em criar um sub-compacto e seu efetivo lançamento
no mercado, um recorde para os padrões da época.
O fato é que os carros apresentavam um defeito importante. Em caso de colisão, o tanque de
gasolina apresentava alta probabilidade de rompimento. O vazamento provocado por este
rompimento poderia, simplesmente, incendiar o veículo, impossibilitando seus ocupantes de
escaparem a tempo. Os materiais utilizados na construção do carro aumentavam o problema,
fazendo com que o Pinto se tornasse, literalmente, uma bomba.
Os acidentes com vítimas não tardaram a acontecer. A empresa começou a sofrer pressão
dos órgãos reguladores, mas se recusava a realizar o chamado “recall” dos modelos lançados
no mercado. Até que documentos internos da empresa vieram a público. O problema nos tanques
dos automóveis era de conhecimento da empresa, que decidiu não realizar o conserto necessário.
E a decisão tomada foi uma questão matemática.
Calculava-se que o “recall” do Ford Pinto teria um custo de, pelo menos, 130 milhões de dólares,
em valores da época. Mas as eventuais indemnizações por mortes causadas por incêndios
ocasionados por acidentes de trânsito custam 50 milhões de dólares, segundo estimativas dos
executivos das empresas.
Pelo menos 59 mortes foram ocasionadas por incêndios causados por acidentes em que o
Ford Pinto estava envolvido.
A pressão tornou-se insuportável. A Ford realizou o “recall” dos modelos, ao custo de pelo menos
150 milhões de dólares, e teve que arcar com o pagamento de diversas indenizações para as
vítimas. Poucos anos depois após o escândalo, o modelo foi retirado do mercado.
Apesar de chocante, o caso do Ford Pinto não foi o único. Em 2014, a presidente da montadora
norte-americana General Motors veio a público pedir desculpas por problemas apresentados
em modelos da empresa. Os problemas eram conhecidos internamente desde 2001, mas
apenas quando foram alvo de investigação criminal – e que apontaram que os acidentes fatais
nos quais os veículos estavam envolvidos tinham como causa falhas de construção e
montagem – que a empresa admitiu o erro e efetuou um “recall” mundial que envolveu,
pelo menos, um milhão e meio de carros. Nos Estados Unidos as falhas provocaram pelo
menos 13 acidentes fatais.
Poderia citar outros casos envolvendo empresas ao redor do planeta. Mas o cerne da questão
é que uma decisão que envolve a vida de seres humanos foi tomada com bases em valores
estritamente monetários. No caso da Ford, estimou-se com esmero o valor das indenizações a
serem pagas. Quando tomei conhecimento dos casos, coloquei-me então a pensar: qual o valor
de uma vida humana?
Na novela gráfica “Watchmen”, os autores Alan Moore e Dave Gibbons mostram o quanto vale
uma vida humana. No capítulo “Uma Luz nas Trevas”, a personagem Laurie Juspeczyk
procura convencer o poderosíssimo “Dr. Manhatan” (uma espécie de super-homem com
capacidade de manipular a matéria e viajar instantaneamente pelo espaço) a salvar o planeta T
erra do holocausto nuclear. Ao narrar a sua história pessoal, Laurie mostra o quanto seu
nascimento era improvável de acontecer, visto que seu pai e sua mãe se odiavam e que a
união dos dois era praticamente impossível de acontecer. Mas contra todas as perspectivas,
ambos geraram Laurie.
Segundo o site “Wolrdometer”, ocorrem cerca de 267 nascimentos de seres humanos por minuto.
Isto corresponde a cerca de 384 mil novos moradores em nosso planeta. Olhando com olhos
puramente quantitativos, é muita gente semelhante nascendo. E a fria racionalidade diz:
“não há valor para a quantidade. Há valor apenas para o que é raro e incomum. Seres humanos
são comuns.”.
Mas o que é comum torna-se absolutamente único quando olhado pelos olhos da contemplação.
Cada história, de cada pessoa nascida na Terra, traz algo que tornaria seu nascimento improvável,
o que por si só torna esta pessoa, caso a olhássemos apenas pelo aspecto material do ser,
absolutamente única.
E, como percebeu o Dr. Manhattan após ouvir a história de Laurie, se multiplicarmos as infinitas
combinações e probabilidades de nascimento de cada ser humano, por cada geração, a vida
humana é o fenômeno mais raro que acontece no Universo conhecido.
Em algum momento em nossa jornada na Terra perdemos o olhar qualitativo que tornaria cada
pessoa um milagre absoluto. A quantidade nos tornou cegos, as necessidades reais ou imaginárias
nos tornaram irracionais, e a ignorância em reconhecer a si mesmo como um milagre nos tornou
descartáveis.
Precisamos, portanto, voltar a contemplar-nos como milagres tão especiais e únicos que não
há quantidade de ouro no universo suficiente para pagar o valor de uma única vida humana.
Neste dia, as planilhas e cálculos serão reformulados para que o potencial inerente de cada
um de nós seja desenvolvido ao máximo. Pois o valor da vida humana é incalculável devido
ao que nos torna milagres encarnados: a singularidade.
Maurício Luz |
1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”.
E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..
Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ.
Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.
Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997).
Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012).
Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019).
Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.
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