Por Weslley Galzo e Camila Turtelli - Estadão
"A aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pelo Congresso, na quinta-feira, 15, jogou luz sobre o modo como é feita a distribuição de dinheiro público aos partidos no País. Apesar da repercussão negativa, por ter sido discutida em meio à crise sanitária, o volume dos recursos que os parlamentares destinam às próprias siglas é, há tempos, sem precedentes quando comparada com a realidade de outras democracias.
Um estudo do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), que reuniu dados de 35 nações entre 2012 e 2020, aponta que o Brasil é o país que mais envia dinheiro público para partidos e campanhas políticas. Juntas, as siglas brasileiras recebem, em média, US$ 446 milhões por ano (R$ 2,2 bilhões) dos fundos eleitoral e partidário. No ano que vem, quando serão realizadas as eleições estadual e federal, o montante será de R$ 5,7 bilhões graças à LDO.
A cifra, sem descontar a inflação, representa um aumento de 185% em relação ao valor que os partidos obtiveram em 2020 para as disputas municipais, o equivalente a R$ 2 bilhões. É, também, mais que o triplo do que foi destinado às eleições de 2018, quando foi distribuído o montante de R$ 1,8 bilhão.
Brasil é o país que mais gasta com partidos políticos |
No ranking dos países que mais gastam com o sistema partidário, o México vem em segundo lugar, com US$ 307 milhões (R$ 1,5 bilhão) - aproximadamente quatro vezes menos do que o Brasil gastará no ano que vem somente com o fundo eleitoral. Ao excluir o primeiro colocado, a média da amostra cai para US$ 65,4 milhões (R$ 323 milhões), o equivalente a 14% do que o Estado brasileiro investe na manutenção e organização eleitoral dos partidos.
“Estamos usando recursos públicos em demasia em comparação com o resto do mundo para o dia a dia da política, em vez de estar investindo diretamente em bens públicos. A quantidade de recurso é finita, quando você usa muito para determinado fim, acaba faltando para outras coisas”, disse o autor da pesquisa, Luciano Irineu de Castro, do Impa.
Até o mês passado, os partidos com representação no Legislativo Federal receberam R$ 489 milhões do Fundo Partidário. Donos das maiores fatias do bolo, PSL e PT, as duas siglas com maior representação na Câmara dos Deputados, receberam, respectivamente, R$ 57 milhões e R$ 48,7 milhões no primeiro semestre de 2021. Em 2022, as legendas devem ter R$ 600 milhões cada para construir suas campanhas com recursos do fundo eleitoral - mais que o dobro recebido em 2020.
Datena, apresentador e jornalista |
O PSL estuda lançar o apresentador e jornalista José Luiz Datena como candidato à Presidência, enquanto os petistas apostam na provável candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Deputado (PSL), Luciano Bivar |
“O financiamento público devolveu ao povo brasileiro os deputados e senadores. Somos suspeitos de falar a respeito, por sermos um grande partido, mas, na verdade, o que se deve discutir é a oportunidade para que todos os candidatos tenham chance de dizer quem são e quais seus projetos”, disse Bivar.
“E, se considerarmos a divisão do fundo por centenas, milhares de candidatos, o resultado é razoável. Caso contrário, só haverá dois partidos: o do presidente e o dos governadores. Os demais não sobreviverão com dinheiro de doações individuais.”
Cidadania, PSOL, Podemos e PSL foram os únicos a apoiar a mobilização feita pelo Novo para rejeitar o fundo de R$ 5,7 bilhões incluído na votação da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) no Congresso, nesta quinta-feira. O partido de Bivar, porém, só aderiu ao movimento restando 15 minutos para o fim da votação.
Deputado (PT) Paulo Pimenta |
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) usou as redes sociais na tentativa de ironizar o fato de deputados bolsonaristas, em sua maioria do PSL, defenderem o fim dos privilégios dos políticos, mas terem votado a favor da LDO. “Todos os bolsonaristas votaram a favor de triplicar o Fundo Partidário. O PT votou contra. Logo eles que estufavam o peito para dizer que a mamata acabou”, escreveu Pimenta.
A relação, no entanto, é falsa. O texto aprovado no Congresso não se restringe ao fundo eleitoral, como o deputado deu a entender. O PSL votou a favor da LDO, mas se opôs à emenda que aumentou os recursos dos partidos. O PT fez o caminho inverso: votou contra o texto final, mas não apoiou a iniciativa do Novo.
“O PT sempre defendeu o financiamento público como forma de reduzir a influência do poder econômico no processo democrático, no mesmo sentido da decisão do STF que proibiu as doações de empresas a candidatos”, disse a assessoria de imprensa da sigla. O partido faz referência à decisão proferida pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, em 2015, que proibiu as empresas privadas de doar para campanhas, como forma de reduzir as negociatas pré-eleitorais.
“O PT também defende que deve ser democrática e transparente a definição dos valores e dos critérios de acesso a estes recursos, o que no Brasil cabe ao Congresso Nacional, enquanto a fiscalização de seu uso é feita praticamente on-line pela Justiça Eleitoral. É uma experiência nova no país, sujeita ao debate e à crítica, mas certamente melhor e mais equilibrada para os partidos e o processo eleitoral”, afirmou.
Diretor executivo da Transparência Partidária, Marcelo Issa |
Marcelo Issa, diretor executivo da Transparência Partidária, avaliou que, além de empenhar valores bilionários para financiar os partidos, o Brasil dispõe de poucos mecanismos para checar a forma como o dinheiro público é gasto. Ele prega que a Lei de Acesso à Informação também seja aplicada às siglas.
“Antes de discutir o volume dos recursos, é preciso discutir o nível de transparência e o que se faz com os recursos. Até uma discussão sobre a adequação desse montante fica comprometida na medida em que é difícil conhecer com precisão o destino dos recursos”, afirmou. “A gente precisa caminhar para um sistema eleitoral que reduza os custos de campanha sem prejuízo à qualidade do debate e ao acesso à informação para que o eleitor possa formar sua convicção de modo adequado.”
O diretor executivo da Transparência Partidária destacou que, desde fevereiro, há um processo de revisão de todas as regras referentes a partidos políticos e eleições. “A gente corre o risco concreto de chegar a outubro com o sistema eleitoral completamente reformulado. Incluir nesse debate a majoração expressiva dos valores do fundo eleitoral-partidário não é justo com a população. Não é justo, adequado e transparente”, completou.
Issa apontou a cláusula de barreira como um horizonte para a redução dos gastos com os partidos. Aprovada na minirreforma eleitoral de 2017, esse dispositivo impõe novas regras de acesso dos partidos aos recursos do Fundo Partidário e limita o tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão de acordo com o nível de representação das siglas na Câmara dos Deputados. A norma é temida por partidos pequenos, que tendem a desaparecer com o endurecimento gradual das exigências.
Pesquisador Luciano Irineu de Castro |
“Na medida em que você tem menos estrutura partidária funcionando de modo permanente na sociedade, é claro que deveria haver uma redução do ponto de vista dos gastos cotidianos para o funcionamento do sistema partidário”, argumentou. O pesquisador Luciano Irineu de Castro destacou que o alto número de partidos pressiona o sistema eleitoral por mais recursos, ao mesmo tempo em que a disponibilidade de cifras milionários estimula a criação de legendas."
Fonte: Estadão
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