sábado, 6 de novembro de 2021

"O Poder das Asas da Borboleta"

“O bater das asas de uma borboleta no Brasil pode causar um tufão no Texas.”.

Edward Lorenz


O inglês Nicholas Winton possuía um segredo guardado há anos. Nem sua esposa, Grete, conhecia o segredo de seu marido. Mas o passado ressurgiu de forma inesperada para Nicholas. Ao arrumar o sótão da casa onde vivia com seu marido, Grete encontrou uma caixa com várias fotos e documentos de crianças, e várias cartas. Foi então que descobriu a história que o marido nunca havia compartilhado com ela.

Em 1939, pouco antes do início da Segunda Guerra, Nicholas viajou para Praga, na antiga Tchecoslováquia. O país já estava tomado pelas tropas nazistas, e Nicholas testemunhou o embrião do horror que tomaria a Europa de assalto, ao assistir o medo das famílias que seriam encaminhadas para os campos de concentração.

Nicholas não hesitou, e começou a escrever cartas para conhecidos seus na Inglaterra e na Dinamarca, perguntando quem poderia ficar com crianças que ele ajudaria a sair do país. Desta maneira, Nicholas conseguiu salvar 669 crianças que seriam enviadas para campos de concentração junto com seus pais. Estas crianças jamais veriam os pais novamente. O número de vidas salvas por Nicholas só não foi maior porque o último trem, com 250 crianças judias que seriam transladadas para a Inglaterra, foi detido pelos nazistas. Todas as crianças impedidas de viajar morreram em campos de concentração.

Depois que sua história se tornou conhecida publicamente, Nicholas recebeu diversas homenagens, sendo agraciado com o título de cavaleiro britânico pela rainha Elisabeth. 

Mas o reconhecimento mais emocionante aconteceu quando uma rede de TV reuniu, em segredo, algumas das “crianças” que ele havia salvado, décadas atrás. Sentado na platéia, sem saber da homenagem, Nicholas observa dezenas de pessoas à sua volta se levantarem a um pedido da apresentadora, em um daqueles momentos que nos lembram porque devemos ter esperança na Humanidade.

Mas qual a ligação do belo ato de Nicholas Winton com a teoria do Caos?

As pessoas que Nicholas salvou da morte horrenda abraçaram profissões diversas – Biologia, Música, Arquitetura. Mas há uma preocupação interessante entre muitos deles: a prestação de serviços voluntários ou filantrópicos. Foi a maneira que encontraram de retornar, em forma de boas ações, a própria ação que evitou que tivessem o destino de seus entes mais próximos.

Nicholas não ajudou a salvar “apenas” 669 crianças. Ele salvou infinitas pessoas. No decorrer do tempo, quem poderá saber quantos seres humanos foram afetados pela ação de Nicholas? E será que foi apenas Nicholas quem produziu efeito tão vasto e profundo?

Em 1894, um menino franzino, de apenas 4 anos, escorregou no gelo e caiu nas águas geladas do rio que cortava a cidade onde morava. Outro menino, chamado Johann Kuehberger, evitou uma tragédia, evitando o afogamento que certamente aconteceria. Mais tarde, o menino Johann abraçou a vida eclesiástica e tornou-se padre. Já o menino salvo por ele tentou ser artista, tornou-se militar, lutou na Primeira Guerra Mundial e, após o “fim” do conflito, decidiu tornar-se político. Mais tarde, tornou-se chanceler do país, e levou o mundo a horrores nunca imaginados para uma guerra. Seu nome era Adolf Hitler.

No decorrer do tempo, quem poderá saber quantos seres humanos foram afetados pela ação de Johann? E será que foi apenas Johann que produziu efeito tão vasto e profundo?

Em um dia qualquer, Rosa Parks disse “não” em um ônibus e mudou a história da luta dos direitos civis nos Estados Unidos. O cientista Alexander Fleming descartaria um dos seus experimentos com bactérias quando notou algo diferente em uma das placas de Petri nas quais cultivava os micro-organismos que estudava, e descobriu a penicilina. Mohamed Bouazizi, um vendedor de frutas em uma pequena cidade da Tunísia, desesperado porque seu carrinho de frutas foi confiscado pela polícia local e sem perspectivas de sustento, tomou uma decisão desesperada e ateou fogo ao próprio corpo em frente à sede do governo local. A história de Bouazizi se espalha por todo o país, deflagrando uma revolta contra o governo e iniciando a chamada “Primavera Árabe”, que sacudiu os governos por todo o Oriente Médio.

Será que Hosni Mubarak, ex-ditador do Egito e um dos governantes que caíram durante o movimento que agitou a região durante a “Primavera Árabe”, refletiu durante o seu julgamento que ele estava no banco dos réus porque um vendedor de frutas, de uma cidade que provavelmente jamais ouvira falar, decidiu se matar?

Sempre que me deparo com histórias como as que descrevi acima, lembro-me da belíssima frase da Teoria do Caos, cunhada pelo meteorologista Edward Lorenz. E me pego refletindo sobre o impacto que minhas decisões e minhas ações podem ter na vida daqueles que estão à minha volta – e mais além. 

E quando a reflexão ainda traz a certeza de que não há a menor certeza de que alcançarei o resultado esperado, mais eu percebo a força e a capacidade que temos fazendo pequenas ações, pequenos gestos.

Vivemos em um universo de probabilidades. Não temos como saber se as sementes que lançamos brotarão. Se brotarem, não sabemos quantos frutos virão. E se os frutos vierem, não sabemos se serão doces. Temos apenas a probabilidade de que os resultados esperados aconteçam.

Há um poder incrível em nós, mas preocupar-se em controlar o resultado é querer agarrar o vento. 

Penso então o quanto é essencial que faça a minha parte, confiando no processo que leva ao resultado, e não o resultado em si. Se eu tenho consciência do que eu planto, e se eu cuido para que o terreno se mantenha fértil e irrigado, se eu cuido para que as ervas daninhas se mantenham distantes, se tenho a sabedoria de podar no momento certo, e proteger minhas ações dos excessos da chuva, do sol e do vento, há uma probabilidade muito maior de que os frutos sejam abundantes e doces.

E se a semente e as ações forem fomentadas de bondade, as chances de que a bondade floresça também serão muito maiores.

Confiar no processo e aceitar que os resultados de meus atos estão além do meu controle, e que os passos a serem dados é que aumentam minha chance de alcançar o que desejo – é desta forma que entendo a característica que nos faz aumentar a probabilidade de encher a vida de significado: a Disciplina.


Maurício Luz
Maurício Luz escreve a Coluna "Frases em Nosso Tempo", aos sábados para O Guardião da Montanha.

Ele é carioca e ganhou prêmios:

1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”. 

E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..

Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ. 

Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.

Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997). 

Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012). 

Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019). 

Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.

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