Bolsonaro, a esposa, o deputado não reeleito Malta |
Por Carlos Lopes – Hora do Povo
“As
declarações de Bolsonaro, após conhecido o resultado do segundo
turno das eleições, de que seu governo será “defensor
da Constituição, da democracia e da liberdade” ou
que “liberdade
é um princípio fundamental”,
não são comoventes – ou seja, não são dignas de confiança e
não inspiram a menor confiança.
Pelo
contrário, elas significam que os democratas do Brasil necessitam se
unir – e unir o povo brasileiro – em defesa, precisamente, da
democracia.
Nenhum
projeto de ditador, até agora, falou a verdade sobre suas intenções,
exceto quando o poder era uma perspectiva longínqua.
Em
1º de abril de 1964, quando o presidente constitucional e eleito,
João Goulart, foi destituído por um golpe de Estado, o pretexto era
a defesa da Constituição de 1946.
Oito
dias depois do golpe, a 9 de abril de 1964, a Constituição foi
rasgada pelos seus supostos defensores, com o Ato Institucional nº 1
(v. Figuras
e figurinhas em 1964: antes e depois do golpe contra o Brasil).
Foi
também entre juras de respeito à lei que Mussolini assumiu como
primeiro-ministro da Itália e Hitler como “chanceler” do Reich
alemão.
Ditaduras
e ditadores mentem.
A
ditadura é inseparável da mentira.
MALTA
No
encontro em que Bolsonaro comemorou sua vitória, o principal
acontecimento foi a oração puxada por Magno Malta, que acaba de
perder, rejeitado pelos eleitores, seu mandato como senador pelo
Espírito Santo.
A
religião, para Bolsonaro, sempre foi instrumental, como dizem
alguns. Na verdade, um expediente eleitoreiro. A tal ponto que não
se sabe direito qual a sua religião, apesar do batismo em Israel
(v. Pastor
que batizou Bolsonaro recebeu propina de R$ 6 milhões da Odebrecht).
A
aparição de Malta, na comemoração de Bolsonaro, no domingo à
noite, fazendo a oração, somente tornou mais nítido o cunho dessa
sua suposta religiosidade.
Malta
é aquele sujeito que, no Senado, em 2010, fez o mais bajulatório
discurso de apoio a Lula, e à então candidata Dilma Rousseff, que
aquela casa já ouviu (disse ele: “vai ser uma vergonha muito
grande se Dilma perder para José Serra no Espírito Santo”; e,
também, “se minha mãe, dona Dadá, estivesse viva, chamaria
Lula de ‘meu filho’”; ou, sobre a corrupção nas obras do
aeroporto de Vitória: “Lula liberou [a verba], mas
os empresários gananciosos superfaturaram a obra e o Tribunal de
Contas da União acabou suspendendo as obras. Portanto, a culpa não
é do Presidente”).
Malta
foi um dos envolvidos por receber propina da máfia dos sanguessugas;
seu irmão, Mauricio Pereira Malta, indicado por ele, no governo
Lula, para a assessoria parlamentar do Ministério dos Transportes,
era uma das figuras que armaram o esquema das propinas de
empreiteiras naquele órgão; e o próprio Magno Malta é um dos
investigados pela Operação Lava Jato.
Esse
foi o cidadão que fez a oração de graças pela vitória de
Bolsonaro, que disse pretender combater a corrupção.
PRESENTE
E PASSADO
A
única coisa notável em Bolsonaro, há mais de 30 anos, é o
incensamento da ditadura, do golpe de Estado, e, inclusive, da
tortura – pelo menos desde que foi levado a um Conselho de
Justificação do Exército Brasileiro, pelo plano, em 1987, de
colocar “bombas de baixa potência” em instalações militares,
para confrontar o então ministro do Exército, general Leônidas
Pires Gonçalves (v. Terrorismo
de baixa potência).
Fora
essas descargas pela ditadura e pelo golpe de Estado – ou os
elogios a um torturador, Carlos Brilhante Ustra, como se fosse algum
herói (ou como se torturar e assassinar fossem atos de heroísmo) –
Bolsonaro não existe como político.
Exceto
isso, ele é um reacionário raso e comum, e nada mais.
Tanto
assim que, fora essas odes (Deus!) à ditadura, ao golpe de Estado e
à tortura, ninguém é capaz de se lembrar de algo notável que ele
tenha feito nas últimas três décadas.
Mas
não é somente por esse passado, por essa reiteração na propaganda
do crime (a Constituição, em seu artigo 5º, inciso XLIV, considera
o golpe de Estado como crime inafiançável) – que, por si, já o
condena – que as palavras de Bolsonaro não merecem confiança.
Há
sete dias – não mais que sete dias, no dia 21 de
outubro -, ao falar para apoiadores, Bolsonaro disse, sobre os que se
opõem a ele: “Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se
colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a
cadeia”.
Ele
não estava falando de perpetradores de delitos – tanto assim que
os seus ataques se dirigiam, desde seu adversário no segundo turno,
Fernando Haddad, a quem ameaçou de cadeia, até o jornal “Folha de
S. Paulo”, passando pelo MST (v. Saudoso
da ditadura, Bolsonaro ameaça opositores com exílio e prisão).
Além
disso, o que é “lei de todos nós”?
Nós,
quem?
No
Brasil existem leis – e elas não permitem prender ou exilar
oposicionistas somente porque são oposicionistas.
Porém,
há mais.
Os
filhos de Bolsonaro, até agora, foram incapazes de mostrar qualquer
pensamento próprio. Do ponto de vista político – inclusive
eleitoral – são apenas extensões do pai.
Por
isso, a declaração de um deles de que, para fechar o Supremo
Tribunal Federal (STF), “você não manda nem um jipe, cara,
manda um soldado e um cabo. Não é querendo desmerecer o soldado e o
cabo não. (…) Se você prender um ministro do STF, você acha que
vai ter uma manifestação popular a favor dos ministros do STF?”
foi vista e sentida como uma declaração do pai.
E,
realmente, não houve dúvidas, porque todos sabem que essa é a
opinião de Bolsonaro. O filho, apenas, manifestou-a em público numa
hora inconveniente para o pai – antes do primeiro turno das
eleições (v. Para
decano do STF, ataque bolsonarista ao Tribunal atinge lei e
liberdade).
Evidentemente,
fechar o STF é a mesma coisa que rasgar a Constituição.
Notemos
que essa declaração do rebento bolsonariano foi no último dia 9 de
julho – há pouco mais de três meses – e se referia ao resultado
das eleições e à possibilidade do STF proferir uma sentença
desfavorável ao seu pai.
Portanto,
a solução para uma sentença da Justiça seria o fechamento de seu
órgão máximo, aquele que tem por função a guarda da Constituição
em última instância.
Entretanto,
há mais.
O
vice de Bolsonaro, Hamilton Mourão, além de também incensar o
torturador Brilhante Ustra, falou na possibilidade de um “autogolpe”
– certamente, não para garantir a Constituição, que Mourão
odeia abertamente (“seria muito bom que pudéssemos trocá-la”,
disse ele, acrescentando que uma outra Constituição para substituir
a atual “não precisa ser feita por eleitos pelo povo”).
Mas,
o que é o “autogolpe”?
Na
entrevista à GloboNews, Mourão falou em golpe do presidente da
República (“Ele [o presidente] pode decidir
empregar as Forças Armadas. Aí você pode dizer: ‘mas isso é um
autogolpe’”).
Essa
declaração foi no último dia sete de setembro.
Mas,
qual a diferença disso para a seguinte declaração?
ENTREVISTADOR: Se
você fosse hoje o Presidente da República, você fecharia o
Congresso Nacional?
JAIR
BOLSONARO: Não há menor dúvida, daria golpe no mesmo
dia! Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da
população ia fazer festa, ia bater palma, porque não funciona. O
Congresso hoje em dia não serve pra nada, xará, só vota o que o
presidente quer. Se ele é a pessoa que decide, que manda, que
tripudia em cima do Congresso, dê logo o golpe, parte logo para a
ditadura (Entrevista ao programa Câmara Aberta, 23 de maio
de 1999).
Mourão,
apenas, repetiu a declaração de Bolsonaro de alguns anos atrás.
FANFARRAS
E AMEAÇAS
No
entanto, as declarações de Bolsonaro, de suposta fidelidade à
Constituição e amor à liberdade (sem a menor autocrítica de
declarações como: “Pau-de-arara funciona. Eu sou favorável à
tortura, tu sabe disso”), significam que ele descobriu que não
é fácil dar um golpe no Brasil de hoje, mesmo estando na
Presidência da República.
Essa
história de “golpe no mesmo dia” era fanfarronada – e nada
demonstra isso melhor do que suas próprias (e falsas) declarações
de agora.
Mas
isso não quer dizer que não haja uma ameaça real, uma ameaça
séria à democracia no Brasil.
Até
mesmo porque, em nenhum momento, Bolsonaro fez alguma crítica à
suas declarações do passado. Por exemplo:
“Através
do voto você não vai mudar nada nesse país, nada, absolutamente
nada! Só vai mudar, infelizmente, quando, um dia, nós partirmos
para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime
militar não fez. Matando uns 30 mil, começando com o FHC, não
deixar pra fora não, matando! Se vai morrer alguns inocentes, tudo
bem, tudo quanto é guerra morre inocente”.
HISTÓRIA
DE HOJE
O
Brasil já passou por muitas situações difíceis.
Em
todas elas, o país foi salvo por seu povo.
A
velha ditadura recolheu-se, em 1985, com o presidente de então
saindo pela porta dos fundos do Palácio do Planalto.
Forçoso
reconhecer, diante de Bolsonaro & cia., os que governaram durante
a ditadura parecem estadistas – e, pelo menos um deles, até foi.
Não por acaso, exatamente aquele que Bolsonaro e Mourão mais
detestam – o general Ernesto Geisel.
A
atual ameaça terá que ser enfrentada do mesmo modo – ainda que os
momentos sejam diferentes.
Os
homens que nos antecederam – um Tiradentes, um José Bonifácio, um
Caxias, um Floriano, um Getúlio, um João Goulart, um Tancredo, um
Ulysses Guimarães – nos legaram um país.
Não
será um grupelho de indivíduos sem respeito pelo povo – e,
portanto, pela democracia e pela Pátria – que o destruirá.”
CARLOS
LOPES
Fonte: Hora do Povo
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