“Se os triângulos tivessem um deus, ele teria três lados.”.
Montesquieu
Em 15 de junho de 2015, o norte-americano Dylann Roof entrou para a História como autor de um crime que chocou o mundo. Depois de passar 40 minutos em uma igreja localizada na comunidade negra de Charleston, localizada na Carolina do Sul (EUA), Dylann sacou de uma arma e matou nove pessoas, dentre elas o pastor da igreja. Capturado poucas horas após o crime, o assassino não apenas confessou o ato vil que cometera, como disse que seu objetivo era iniciar uma guerra interracial nos Estados Unidos.
Após a prisão do assassino, várias fotos obtidas pela polícia mostravam Dylan segurando a bandeira dos confederados, símbolo dos estados norte-americanos que, entre dezembro de 1860 e abril de 1861, declararam-se independentes da União e provocaram uma guerra civil que durou quatro anos e vitimou milhares de pessoas. A guerra civil dos Estados Unidos aconteceu porque os estados rebeldes não aceitavam o fim da “instituição da escravidão”, patrocinado pelos estados do Norte do país e defendida pelo presidente eleito Abraham Lincoln. Por isto, até hoje, a bandeira confederada é um símbolo para os defensores da “supremacia branca”. As fotos de Dylan com a bandeira motivaram um fortíssimo movimento civil que levou diversos estados e municípios do Sul dos Estados Unidos a banirem a menção à bandeira em seus símbolos oficiais.
Chocado com o crime e suas motivações, lembro-me que na época mergulhei no mundo dos segregacionistas norte-americanos. Fiquei várias horas acessando e lendo documentos sobre a chamada Guerra de Secessão norte-americana, até que encontrei os textos das declarações de independência de cada um dos estados confederados. A leitura me mostrou duas coisas. A primeira, a preocupação dos patrocinadores da secessão, em cada estado, em dar um caráter “legal” à ruptura com a União federal, registrando por escrito os motivos que levaram os estados à decisão que tomaram. Muitos trechos foram copiados da própria Declaração de Independência dos Estados Unidos, mas sem partes como “todos os homens são criados iguais”.
O segundo, a preocupação em justificar a escravidão não apenas em bases legais, mas também divinas. Esta preocupação fica muito clara na declaração do Texas, que afirmava que a doutrina da igualdade de todos os homens, independente de raça ou cor, era “uma doutrina de guerra com a natureza, em oposição com a experiência da humanidade, e em violação às mais claras revelações da Lei Divina.”. Mais adiante, justificando a escravidão como “benéfica a ambas as raças”, como “plenamente justificado pela experiência humana” e como “desejo revelado do Todo-poderoso Criador”, e reconhecido “por todas as nações Cristãs”, embasavam o argumento que leva à decisão de separar o Estado do governo federal.
Os argumentos teológicos dos confederados para justificar a escravidão podem chocar a maioria das pessoas na atualidade, pois é um paradoxo que um Deus compassivo e amoroso valide a exploração do trabalho de um ser humano por outro. Mais do que isto, que autorize que alguém tenha poder de vida e morte sobre o seu semelhante. A questão é que os segregacionistas não consideram os integrantes das demais etnias como “semelhantes”, o que justificaria o tratamento dado a estas etnias. E é esta visão ou percepção do mundo que os faz interpretar a religião, a natureza e a ciência como validadores do que acreditam. Eles precisam deste “certificado”, e por isto podemos encontrar, sem esforço, argumentos da suposta “supremacia” de uma etnia sobre outra baseados em interpretações religiosas, de “pesquisas científicas” ou apenas pela “experiência pessoal”.
Percebemos um mundo filtrado – pelas nossas experiências pessoais, crenças, pelos nossos sentidos corporais, pela cultura que aprendemos desde cedo. Tudo isto é a base da força mais poderosa que o ser humano precisa lidar em sua jornada neste planeta: o ego.
O ego é tão poderoso que distorce até mesmo as palavras mais sagradas. Se algum texto afirma para amarmos nossos irmãos, o ego diz: “mas eles não são nossos irmãos. Eu sou superior a eles, logo a regra não se aplica a este caso.”. Se acredito que viagens de avião são perigosas, então terei em mãos todos os dados referentes ao número de mortos em desastres aéreos, ignorando os números que indicam que os acidentes terrestres causam muito mais vítimas. Se há um Deus, Ele certamente me criou à Sua imagem e semelhança. E validará as ações que considero como corretas. Por este motivo que o racista, o homofóbico, o misógino, o egoísta, o irresponsável, o tirano, todos encontram justificativas para suas ações nas mais diversas fontes, inclusive divinas.
E nada melhor que a chancela de Deus para fazer algum ato sem grandes dores na consciência.
Uma pesquisa realizada pelo Datafolha em 2017 mostrou que apenas 8% do eleitorado votaria em alguém que se declarasse ateu. Acreditar em Deus ainda é um requisito essencial para que um candidato se torne viável uma eleição em nosso país.
Ao ler a estatística, sempre me perguntei se o fato de um candidato declarar sua crença seria apenas um primeiro filtro. Que outras perguntas viriam a seguir: o candidato demonstra sua crença com ações? Estas ações estão alinhadas com princípios da solidariedade, da compaixão, da esperança? A candidata apresenta atitudes que orgulhariam o Deus para o qual ela diz acreditar? O candidato é um exemplo para o qual meu filho ou filha poderiam seguir, e cujas atitudes eu teria orgulho em compartilhar?
Se tais perguntas adicionais fossem feitas, os eleitores perceberiam que tão ou mais importante que saber se uma pessoa acredita em Deus é saber em qual Deus a pessoa crê. Pois nós agimos conforme nossas crenças, conscientes ou inconscientes. Elas guiam nossas escolhas, nossos atos mais corriqueiros. E são as ações que mostram, efetivamente, em qual divindade ela acredita, não o que sua boca diz. E pelas ações podemos identificar que a pessoa, na verdade, não acredita em Deus, mas na sua própria imagem, elevada à infinitésima potência.
Talvez não nos preocupemos com o devido alinhamento entre discurso e ação porque, no fundo, votamos em nossos espelhos, naqueles que nossos egos mais se identificam. Efetivamente, escolhemos aqueles que mais se encaixam com nossos egos, não com valores a serem obedecidos por todos. Mas como gostamos de dar um verniz mais elevado ao que fazemos, nossos egos capturam e distorcem tudo, até mesmo a ideia de Deus.
Alinhar valores elevados com nossas ações talvez seja o grande desafio da humanidade. Quando deixarmos o auto-engano, aceitarmos o que somos onde estamos, e desta maneira, almejar o que podemos nos tornar; e agir alinhado a este objetivo, ainda que tropeçando nos erros, então estaremos próximos de alcançar o que pavimenta a paz e a harmonia: a Honestidade.
Maurício Luz |
1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”.
E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..
Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ.
Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.
Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997).
Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012).
Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019).
Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é sempre bem-vinda!