Guilherme Boulos, Paola Carossella e Bel Coelho (Foto: Reprodução) |
As refeições distribuídas estarão disponíveis apenas para retirada. O objetivo é evitar o consumo no local e aglomerações sem o uso de máscaras na hora da alimentação.
A chef Bel Coelho tem mais de 10 anos na militância pela alimentação de qualidade. “Essa luta contra a fome é muito antiga no Brasil. A gente chegou próximo a uma possível erradicação da fome nos anos 2000”, lembrou durante a live desta segunda-feira. “Mas no primeiro dia do mandato de Bolsonaro, ele rompeu com todos os órgãos consultivos que trabalharam para isso”, criticou a chef, mencionando a atuação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea) nos governos petistas no combate à fome no Brasil. “Foi um símbolo muito importante de todos os problemas que iríamos enfrentar.”
Para Bel Coelho, o aumento da miséria e da fome no país não são relacionados somente à pandemia. “É por causa de um projeto de governo absolutamente genocida”, afirmou a chef, que trabalha no centro de São Paulo. “Fazia muitos anos que não via tanta gente em situação degradante na rua, pedindo comida, revirando lixo, comendo comida estragada”, lamentou.
O desperdício de alimentos também foi alvo das críticas da chef de cozinha. “Desperdiçamos um terço dos alimentos, de verdade ou industrializados, em uma cidade rica como São Paulo, com o maior centro de distribuição da América Latina como o Ceasa. Só o que tem de desperdício ali, resolveria o problema da fome em São Paulo”, disse. “Além da esfera federal que é uma tragédia absoluta, o governo estadual e municipal também não fazem nada.”
Cozinha que salva
Guilherme Boulos também criticou o governo de Jair Bolsonaro pela suspensão do pagamento do auxílio emergencial. “Querem voltar pagando R$ 250 e para um número bem menor, é pouco, muito pouco. Ainda mais com a comida e o gás no preço que estão”, disse, sobre o cenário em que a fome voltou ao Brasil.
Segundo Boulos, há estimativa de que 20 milhões de pessoas estarão passando fome no país este ano. “E um governo longe do olhar de empatia, de sentir a dor de uma mãe que deixa de comer para dar de comer ao seu filho.”
Daí a importância de um projeto como o Cozinhas Solidárias. “Solidariedade num momento como esse é a diferença entre as pessoas poderem comer ou não. Num momento de tanto desprezo pela vida, de baixa empatia, a solidariedade salva. Não é o suficiente para resolver a fome, mas é o que podemos fazer, uma semente”, afirmou. As cozinhas, integradas a hortas comunitárias de alimentação orgânica, vão construir uma rede de segurança alimentar para quem têm fome. “E alimentar a alma com cultura, encontro. Onde as pessoas veem que não estão sozinhas e podem contar umas com as outras pra tocar o barco adiante.”
A chef Bel Coelho também é entusiasta dessa cozinha que une. “Ela tem esse símbolo de agregar, trazer bons momentos, trocas. Momentos de pequenos encontros para pensar pequenos negócios com comida. É possível e rápido de ser feito. Tenho muito entusiasmo por esse projeto. Pode ser muito eficiente no combate à fome e também ao desemprego, à depressão. Podem ser pontos de encontro para quando pudermos sair às ruas.”
Solidariedade expandida
O projeto é uma extensão da Campanha de Solidariedade que o MTST promove desde as primeiras semanas da pandemia de covid-19. Em 2020 foram distribuídas cerca de 156 mil refeições, 220 toneladas de alimentos em cestas básicas, 110 mil máscaras, 15 mil kits de higiene e 220 kits de gestantes para aproximadamente 20 mil famílias. Em 2021, a campanha segue em sua segunda fase, contando com doações financeiras para a vaquinha virtual do movimento.
“O MTST vê muito de perto o crescimento da fome no país. As pessoas estão abandonadas à própria sorte, sem proteção real contra a covid. E sem conseguir comer por falta de renda e do preço altíssimo dos alimentos e do gás de cozinha”, afirma Guilherme Boulos. “É por isso que a nossa campanha de solidariedade segue firme, agora expandida com as cozinhas solidárias”, disse o líder do MTST, destacando a importância dos voluntários que mantêm o projeto. “As cozinhas solidárias são sustentadas por ampla movimento de voluntariado que permitiu colocar essa ideia em prática. Com razão, o Brasil está voltado para a pandemia. Um país à deriva, sem governo. Mas para além da pandemia do vírus, existe uma pandemia invisível, da fome.”
Cozinhas solidárias, marca registrada
As cozinhas comunitárias sempre foram uma marca do MTST, lembra o movimento: “o coração das ocupações”. Junto à luta por moradia digna, o MTST busca políticas que combatam a insegurança alimentar que tanto afeta os trabalhadores do Brasil. Assim, a cozinha solidária é uma das primeiras instalações criadas em uma ocupação. O espaço se torna também o local da sociabilização e tomada de decisões coletivas.
O MTST ressalta que a iniciativa se fortalece em um momento crucial do enfrentamento à fome e da pandemia de covid-19 no Brasil. “Já são três meses desde que o governo federal suspendeu o auxílio emergencial, que impactou cerca de 68 milhões de brasileiros e levou cerca de 15 milhões desses de volta à pobreza.” A volta da ajuda financeira debatida se mostra insuficiente para assegurar a sobrevivência digna de uma família brasileira, critica o MTST.
“Segundo o Estudo da Segurança Alimentar e da Fome no Mundo, divulgado pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), 2,5% da população do país encontra-se desnutrida, o que representa, aproximadamente, 5 milhões de pessoas. Destaca-se ainda que em 2010 eram 4,9 milhões de brasileiros enfrentando a escassez de alimentos e, hoje, somam 5,2 milhões. Apesar de assustadores, esses dados são anteriores à pandemia de covid-19. Faltam dados atualizados, mas já se pode afirmar que a fome voltou ao centro das discussões, e não poderia ser diferente”, reforçam os sem-teto."
Fonte: Brasil 247
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