Por Rafael
Soares do Extra
“Mensagens
encontradas pela Polícia Civil e pelo Ministério Público no
celular do miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica,
escancaram as relações promíscuas entre o batalhão
de Jacarepaguá,
o 18º BPM, e o grupo paramilitar que domina o bairro. Nos diálogos,
Orlando e seus comparsas mencionam o pagamento de propina a PMs da
unidade, a venda de armas apreendidas em operações por policiais à
milícia e até avisos prévios do grupo paramilitar ao batalhão
sobre áreas que seriam invadidas pela quadrilha.
As
mensagens, obtidas pelo EXTRA, foram trocadas por Orlando e seu bando
em outubro de 2017. À época, o comandante do 18º BPM era o coronel
Rogério Figueredo, atual secretário de Polícia Militar. Os
diálogos fazem parte da investigação que culminou na Operação
Entourage, que levou 18 comparsas de Orlando à cadeia.
Numa
das conversas, Orlando determina a um comparsa, identificado como o
PM Leandro Marques da Silva, o Mingau, o pagamento de R$ 12 mil a uma
ala do Grupamento de Ações Táticas (GAT) — policiais
responsáveis pelas ações operacionais — do batalhão. Segundo
Curicica, o valor seria referente ao “arrego mais a peça”. O
miliciano explica: a quadrilha havia comprado uma pistola calibre .40
e munição para fuzil que foram apreendidos pelos PMs durante uma
operação.
O
comparsa alerta o chefe que um policial estava reclamando, num áudio
enviado à quadrilha, sobre atrasos no pagamento da propina. “Meia
hora de polícia. Porque é GAT do 18 acha que é esperto”, escreve
Mingau. Orlando responde que o pagamento para “a ala da pistola não
vai seguir atrasado, não”.
As
conversas também indicam que o GAT do 18º BPM fazia vista grossa
para invasões de comunidades. PMs eram avisados sobre ataques e
recebiam orientação para não agir. Em outubro de 2017, a milícia
se preparava para tomar a Favela do Tirol. Na semana anterior, Felipe
Raphael de Azevedo, o Chel, um dos seguranças do grupo paramilitar,
disse ao chefe que iria “avisar ao setor e ao GAT no sábado”. A
ação estava programada para a madrugada de domingo
Orlando concorda com o aviso aos PMs: “Isso, principalmente o GAT”. “Fica amarradinho, né?”, pergunta o comparsa. “Tem que amarrar, porque os simpáticos vão ligar, 190”, afirma Orlando, referindo-se a possíveis telefonemas de moradores para a polícia.
Mensagens
ainda revelam como Orlando recrutava policiais militares para
ocuparem as favelas invadidas, ajudando a impedir o retorno de
traficantes. Mingau, de acordo com um dos diálogos, recebe uma ordem
para chamar pelo menos dois PMs, “só para ficar tranquilo”. Em
seguida, Orlando estipula os valores que pagaria a quem topasse
permanecer nas comunidades tomadas: R$ 1.200 para milicianos que não
são PMs e R$ 2 mil para policiais. Se a arrecadação com taxas
cobradas de moradores fosse boa, haveria um aumento. “Melhorando,
melhora o de todo mundo”, escreveu. Após a troca de mensagens, o
Tirol passou a ser dominado pela milícia.
Orlando
Curicica está preso no Rio Grande do Norte Foto: Agência O Globo
Durante
a Operação Entourage, deflagrada no último dia 31, quatro PMs
foram presos, entre eles Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha.
Ex-homem de confiança de Orlando, ele é acusado pela Polícia
Federal de ter tentado atrapalhar a investigação do assassinato da
vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Ao
tentar incriminar o antigo chefe, dizendo que ele e o vereador
Marcello Siciliano (PHS) tinham interesse na morte da parlamentar,
Ferreirinha planejava, segundo investigadores, assumir o comando de
uma área. Orlando e Siciliano negaram a acusação.
Poucos
dias após as trocas de mensagens por celular, Orlando foi preso pela
Polícia Civil. Na ocasião, seu celular foi apreendido. Hoje, ele
está na penitenciária federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Figueredo
é o Secretário da PM Foto: Guilherme Leporace
O
coronel Rogério Figueredo ficou pouco mais de dois anos no comando
do 18º BPM, de novembro de 2015 a fevereiro de 2018. Na função,
não conseguiu conter o aumento da violência. Em 2015, a região
registrou 369 roubos de carros. Em 2017, foram 804, 117% a mais. No
mesmo período, os roubos de rua também dispararam, e as mortes em
confrontos com a polícia passaram de oito para 25. Antes de ser
nomeado secretário pelo governador Wilson Witzel, o coronel comandou
as UPPs.
O
EXTRA pediu, por meio da Secretaria de Polícia Militar, que
Figueredo comentasse a investigação sobre corrupção no batalhão
que comandou. Em nota, o órgão destacou que, durante a gestão
dele, o 18º BPM realizou “diversas ações exitosas”. No
primeiro semestre de 2016, por exemplo, ficou em primeiro lugar no
Programa de Redução de Indicadores de Criminalidade. Além disso, a
nota cita estatísticas de prisões (926 em 2016; 577 em 2017), de
apreensões de armas, de operações e veículos recuperados. Por
fim, a secretaria ressalta sua intolerância em relação a desvios
de conduta."
Fonte:
Extra
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