"Vítimas da barragem e fundação Cáritas, que assessora os atingidos, comemoram decisão; mineradora diz que ainda não foi notificada"
Por
LUCAS
NEGRISOLI
“A
Matriz de Danos usada como base de cálculo para indenizações a
atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, poderá
ser atualizada para valores mais próximos àqueles perdidos pelas
vítimas.
Isto
por que, na terça-feira (11) o Tribunal de Justiça de Minas
Gerais (TJMG) recusou por unanimidade recurso da Samarco, Vale e BHP
Billiton, contra a liberação do valor para pagamento da Matriz de
Danos dos atingidos, estimado em cerca de R$ 1,5 milhão.
Em
suma, a decisão legitimiza a base de cálculo independente para
indenizações que foi requisitada pelas vítimas, que agora poderá
substituir nos processos a Matriz de Danos criada pela Renova – que
contém valores menores para ressarcimento.
Para
comparação, a matriz usada pelas mineradoras elenca que a receita
da safra de mandioca, por exemplo, seria de R$ 0,90 por unidade,
enquanto o alimento é cotado a cerca de R$ 2.
Em
resposta, a Samarco afirma que ainda não foi notificada. Em seu
último balanço, a Renova estima R$ 2,04 bilhões em indenizações
pagos até novembro do ano passado.
A
decisão, em segunda instância, compactua com a tomada na primeira,
na comarca de Mariana. Contudo, ainda cabe recurso em instâncias
superiores.
Além
de ser importante para as vítimas da tragédia de 2015, a decisão
dos magistrados cria jurisprudência para qualquer atingido por
barragens, que pode requisitar análise própria dos danos causados
pelos rompimentos, cuja precificação que não é definida pelas
empresas.
Os
votos na tribuna foram acompanhado por ao menos 30 pessoas vítimas
do rompimento na cidade, e resultado foi comemorado.
O
impasse entre a Fundação Renova, que representa as mineradoras, e a
Cáritas, que faz assessoria técnica das vítimas, vêm
se arrastando desde o final de 2018,
quando o Ministério Público ajuizou a ação civil pública em
disucssão.
Apesar
das decisões favoráveis aos atingidos, a expectativa é de que as
empresas recorram, como fizeram em outras instâncias.
“O
tribunal reconheceu que os atingidos têm o direito de ter uma Matriz
de Danos própria, realizada por assessoria independente (a Cáritas),
para que as empresas rés no processam possam garantir reparação
justa e integral. A Renova tem sua matriz própria, com preços
ínfimos, e tem praticado (as indenizações), a partir dela”,
afirma Maria do Rosário, advogada e coordenadora de uma das frentes
da fundação Cáritas.
Ela
explica que as empresas se recusaram a fazer o pagamento do
levantamento da matriz. “A questão não é pagar ou não, o valor
não significa muito para eles, mas sim o reconhecimento dos preços
levantados, que são os justos”, conclui.
A
antropóloga e coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas
Ambientais (Gesta) da UFMG, Andrea Zhouri, que acompanha o caso,
comemora a decisão do TJMG.
“Essa
matriz é um direito conquistado pelos atingidos e a empresa nem
deveria ter recorrido. Foi uma tentativa, mas felizmente reafirmaram
a decisão em primeira instância. Mas é um desgaste muito grande
para os atingidos, faz com que eles gastem tempo, energia e saúde em
um direito que é deles. Além de tudo, as vítimas ainda têm que
lutar pelo básico”, ressalta.
A
subcoordenadora do Gesta, Raquel Oliveira, explica que a Matriz de
Danos é um instrumento autônomo que identifica e precifica os danos
sofridos por eles.
“Pretende
identificar danos de naturezas diversas. Há desde dano moral,
imaterial, até os patrimoniais. A Samarco tem seu próprio
instrumento, que define valores para a bacia como um todo. Contudo,
há uma série de danos que não são reconhecidos pela fundação.
Em saúde, por exemplo”, conclui.
Justiça
“Não
queremos um centavo além do que foi tirado de nós, mas não
aceitaremos um a menos do que merecemos”, afirma Mauro Marques, que
faz parte da Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão, e
morava desde que nasceu em Bento Rodrigues, comunidade devastada pelo
rompimento em Mariana.
“A
Justiça lida com a verdade e ela não pode ser dita pela metade. O
Judiciário não pode estar do lado dos criminosos, que estão
impunes. Se Deus quiser, verei a punição completa”, continua.
Para
Luzia Nazaré, que representa a comunidade de Paracatu de Baixo,
também atingida, a Matriz de Danos será a "Bíblia" dos
atingidos.
“A
realização dela foi um trabalho árduo, feito por universidades,
que levou em consideração o que perdemos. Agora, esse documento
será nossa bíblia, precisarão pagar e renegociar a partir dela”,
afirma.”
Fonte: O Tempo
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