terça-feira, 2 de março de 2021

"Acordar é urgente"




Por Rafael Martins Neves Historiador - mestre em Educação

No futuro, quando os historiadores olharem para nossos dias – certamente marcados como mais uma “página infeliz da nossa história” -, provavelmente terão a impressão que uma enorme parte da sociedade dormia tão distraída quanto a pátria mãe retratada na famosa letra de Chico Buarque. Um clima de estranha normalidade está estabelecido. Isso acontece ainda que todos os jornais repercutam falas de especialistas acerca da tragédia sem precedentes que nos espera nas próximas semanas, resultado da interação macabra entre uma variante mais transmissível do vírus Sars-COV-2 e o total abandono de qualquer política restritiva à circulação de pessoas por parte dos governos.


A trágica normalidade, em Poços de Caldas, ganhou um episódio com tons de surrealismo nesse fim de semana. O prefeito Sérgio Azevedo repercutiu em suas redes sociais um texto que trata a cidade como exemplo de combate à COVID-19, tanto no âmbito da saúde, quanto da economia. Aparentemente, a  avaliação não considera fatos como termos sido a cidade que mais perdeu empregos com carteira assinada no Sul de Minas ao mesmo tempo em que tivemos mais óbitos pela doença – no momento em que escrevo, são 134, sendo 51 só neste ano! Tudo normal!

Esse tipo de absurdo só é possível porque nos acostumamos a viver em meio a um morticínio sem precedentes em nossa história. O presidente Jair Bolsonaro faz tudo o que pode para dificultar a vacinação e estimular as aglomerações. Diante de uma Manaus colapsada, ofereceu montes da inútil cloroquina, sua obsessão. O que faltava era oxigênio. Há lugares do país onde pacientes têm que ser amarrados às camas por falta de sedativos. Diversos analistas e políticos caracterizam a conduta do presidente e seus capachos fardados como “incompetência”. Soa como uma piada. O que vivemos é um genocídio, e bastante bem sucedido.


É uma necessidade que consigamos impedir a marcha que está em curso: acordar é urgente! Nos últimos dias, têm crescido clamores para a implantação de medidas restritivas, inclusive com governadores defendendo a adoção de um lockdown nacional. Nesse momento, a adoção desse tipo de política é a única possibilidade de impedir que um número ainda mais desesperador de brasileiros – em sua maioria pretos e pobres – morram!


Entretanto, também é preciso destacar que não se trata só de uma questão de ser ou não “a favor” da ciência. Aqueles que querem tirar ainda mais dinheiro da saúde e da educação também são culpados pela barbárie. Os engravatados que aparecem nos telejornais, com seus discursos técnicos e pomposos sobre “austeridade”, “equilíbrio das contas públicas” e “sustentabilidade da dívida” têm sangue nas mãos por colocarem os interesses de lucro do 1% mais rico acima das necessidades da ampla maioria do povo.

É um crime que, no momento em que precisamos manter as pessoas em casa, não haja uma prioridade absoluta em instituir uma política econômica pensada para voltar a pagar o Auxílio Emergencial no valor de R$ 600, manter os empregos daqueles que eventualmente tiverem que ficar sem trabalhar por conta do fechamento de serviços não essenciais e garantir que pequenas e médias empresas tenham capital de giro para não quebrar.

No passado 2020 em meio a pandemia (Dos impostos que o povo paga para o governo que é liberado o Auxílio Emergencial, em qualquer parte do mundo)

Vários países do mundo – inclusive com menos recursos financeiros e institucionais que o Brasil - conseguiram tomar atitudes nesse sentido e obtiveram sucesso. Não esperemos que os governos Jair Bolsonaro, Romeu Zema e Sérgio Azevedo tomem alguma providência. De onde menos se espera é que não vem. Só com organização e luta podermos começar a construir uma sociedade diferente desta onde o ter milhares de mortos por uma doença evitável e milhões de desempregados e miseráveis é normal – e, em alguns casos, pode virar até case de sucesso!"

Rafael Martins Neves
Rafael Martins Neves

- Graduado em História e mestre em Educação pela Unifal-MG 

-Servidor técnico-administrativo    no IFSULDEMINAS - Campus       Poços de Caldas
-Presidente do Diretório Municipal do PSOL em Poços de Caldas.   

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