"Nunca devemos desistir, sempre confiar. Ele tinha muita coragem e visão das coisas para poder tomar decisões."
Dom Paulo
Evaristo Arns morreu nesta
quarta-feira (14) em São Paulo aos 95 anos de vida, sendo mais de 76
anos de dedicação à igreja. Sua trajetória ficou marcada pela
defesa dos direitos humanos durante a ditadura militar e pela
retomada da democracia, o que lhe rendeu o apelido de cardeal da
resistência.
Quinto
de 13 filhos de imigrantes alemães, Arns nasceu em 1921 em
Forquilhinha, Santa Catarina. Ingressou na Ordem Franciscana em 1939
e iniciou seus trabalhos como líder religioso em Petrópolis, no Rio
de Janeiro. Formou-se em teologia e filosofia em universidades
brasileiras. Ordenado sacerdote em 1945, ele foi estudar na Sorbonne,
em Paris, onde cursou letras, pedagogia e também defendeu seu
doutorado.
Foi
bispo e arcebispo de São Paulo entre os anos 60 e 70. Teve uma
atuação marcante na Zona Norte da cidade, região em que
desenvolveu inúmeros projetos para a população de baixa renda.
Ao
longo de sua trajetória, trabalhou ainda como jornalista, professor
e escritor, tendo publicado 57 livros. Torcedor fanático do
Corinthians, ele sempre exaltou seu amor pelo clube paulista e
escreveu o livro "Corintiano Graças a Deus".
Durante
a ditadura militar, destacou-se por sua luta política, em defesa dos
direitos humanos, contra as torturas e a favor do voto nas Diretas
Já. Ganhou projeção na militância em janeiro de 1971, logo após
tornar-se arcebispo de São Paulo e denunciar a prisão e tortura de
dois agentes de pastoral, o padre Giulio Vicini e a assistente social
Yara Spadini. No mesmo ano, apoiou Dom Hélder Câmara e Dom Waldyr
Calheiros, que estavam sendo pressionados pelo regime militar.
Nesse
período, encontrou-se com o então presidente, Emílio Garrastazu
Médici e questionou a truculência da ditadura: "Senhor
presidente, eu estou aqui pra dizer ao senhor que nós gostaríamos
que houvesse julgamento em São Paulo, que as pessoas não fossem
presas assim sem mais nem menos", diz.
Conta
que ouviu do general: "Nós não temos conversas, nós sabemos o
que temos que fazer. O seu lugar é na igreja, na sacristia, e o
nosso lugar é aqui para governar o estado".
Em
1972, criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo e, como
presidente regional da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), liderou a publicação do “Testemunho de paz”, documento
com fortes críticas ao regime militar que ganhou ampla repercussão
à época.
Presidiu
celebrações históricas na Catedral da Sé, no Centro de São
Paulo, em memória de vítimas da ditadura militar. Dentre elas, a do
estudante universitário Alexandre Vannucchi Leme, assassinado em
1973, e o ato ecumênico em honra do jornalista Vladimir Herzog,
assassinado no DOI-CODI, em São Paulo, em 1975.
Atuou
ainda contra a invasão da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP) em 1977, comandada pelo coronel Erasmo Dias, à época
secretário de Segurança. Também teve papel importante em favor das
vítimas da ditadura na Argentina, em 1976. O ativista de direitos
humanos argentino Adolfo Perez Esquivel, ganhador do Prêmio Nobel da
Paz em 1980, disse que foi "salvo duas vezes" por dom Paulo
Evaristo Arns durante a ditadura no Brasil.
Em
1985, criou a Pastoral da Infância, com o apoio de sua irmã, Zilda
Arns, que morreu no terremoto de 2010 no Haiti, onde realizava
trabalhos humanitários. Assim como o irmão, Zilda teve trabalho
destacado na igreja e foi também fundadora e coordenadora
internacional da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa,
organismos de ação social da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB).
Dom Frei Paulo Evaristo Arns, arcebispo de São Paulo, concede entrevista ao lado do político Ulysses Guimarães na capital paulista, em abril de 1978 (Foto: Estadão Conteúdo/Arquivo) |
Por
seus feitos, recebeu inúmeros prêmios e homenagens no Brasil e no
exterior. Entre eles, o Prêmio Nansen do Alto Comissariado da ONU
para Refugiados (Acnur), o Prêmio Niwano da Paz (Japão) e o Prêmio
Internacional Letelier-Moffitt de Direitos Humanos (EUA), além de 38
títulos de cidadania.
Em
28 anos de arcebispado, criou 43 paróquias, construiu 1.200 centros
comunitários, incentivou e apoiou o surgimento de mais de 2.000
comunidades eclesiais de base (CEBs) na capital paulista.
Sua
biografia foi relatada em dez livros, sendo o mais recente lançado
em outubro deste ano, no Tuca, teatro da PUC, na Zona Oeste de São
Paulo, durante uma homenagem pelos 95 anos de Dom Paulo.
Entre
os livros de maior repercussão está a obra "Brasil Nunca
Mais", um trabalho de pesquisa que teve papel fundamental na
identificação e denúncia dos torturadores do regime militar.”
Fonte:
G1.com
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