PILAR OLIVARES / REUTERS |
"Decisão
gera ’impacto sem precedentes na vida da mulher’, diz sindicato;
Metade dos inativos dos Estados são professores."
Por
Grasielle
Castro
Editora,
HuffPost Brasil
“A
professora Mônica Lucas Vieira, 49, contava os dias para se
aposentar no segundo semestre deste ano. Com mais de 25 anos de
contribuição e problemas de saúde, ela esperava completar 50 anos
em agosto para deixar a sala de aula, mas agora pode ter que esperar
mais 10 anos para dar entrada no benefício.
A
proposta da Reforma
da Previdência que Jair
Bolsonarodeve
apresentar nesta quarta-feira (20) ao Congresso estipula idade
mínima de
60 anos para professores se
aposentarem, com 30 anos de contribuição, independentemente do
sexo.
A
equiparação na idade entre homens e mulheres também deve ocorrer
para outras classes que contam com regras especiais, como policiais
civis e federais, cuja idade mínima deve ser de 55 anos. Para as
demais, no entanto, o governo
estabeleceu a diferenciação na idade mínima,
com 62 anos para as mulheres e 65 anos para os homens.
“Tenho
3 calos nas cordas vocais, problemas de coluna. Me ofereceram para
ser readaptada [quando o professor é retirado das salas de aula, vai
para funções mais administrativas], mas eu achei que dava conta por
mais um ano. Agora não sei como vou fazer. Só me resta esperar”,
disse Vieira, professora da rede pública do Distrito Federal.
Pelas
regras atuais, professores podem dar entrada no benefício com tempo
de contribuição mínimo de 25 anos para mulher e 30 anos para
homem, além de idade mínima de 50 anos para mulher e 55 anos para
homem.
“Querendo
ou não, quando vai chegando perto de aposentar, a gente começa a se
organizar até psicologicamente. Comecei a juntar o material da
escola, a buscar a papelada para pedir aposentadoria, diminui o ritmo
de cursos de atualização”, contou ao HuffPost Brasil.
Vieira
leciona na alfabetização, em turmas com crianças com necessidades
especiais. “Que precisam de um pouco mais de dedicação”, diz.
Ela reclama da incerteza, de não saber se vai precisar trabalhar
mais uma década, se terá regras de transição ou se conseguirá
aposentar.
Casos
como este têm alimentado a revolta dos professores, especialmente em
relação às mulheres. Elas são maioria na categoria, representando
81% dos profissionais que lecionam do Fundamental I ao Ensino Médio,
de acordo com a Sinopse Estatística da Educação Básica com base
no Censo Escolar 2017.
“Elas
são as principais afetadas”, afirma o professor Heleno Araújo,
presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
(CNTE). “Em uma sociedade machista, na qual a mulher tem uma
intensificação de trabalho em casa, com a dupla jornada, essa
mudança só pode ser encarada como mais um desgaste”, diz.
O que vemos hoje mostra que não existe política de valorização do magistério, nem respeito às diferenças.professor Heleno Araújo, presidente da CNTE
Ele
destaca que pesquisas internacionais mostram a dificuldade para
desempenhar a função no ambiente escolar nas condições que se
encontram.
“Um
terço dos professores são acometidos por doenças devido às
condições que atuamos. É um fator extra que precisa ser levado em
consideração. O que vemos hoje mostra que não existe política de
valorização do magistério, nem respeito às diferenças.”
O
professor chama a atenção para as diferenças regionais e faz
defesa a possíveis críticas. “Mesmo tendo as mulheres uma
expectativa de vida maior, nossa categoria tem alto índice de
professores com problemas de saúde mental, que lotam os
ambulatórios.”
A reforma deixou cada vez mais distante a opção de aposentar, piorou muito a condição do professor. É um impacto sem precedente na vida da mulher. Cláudio Antunes, porta-voz do Sinpro-DF
Ao
HuffPost Brasil, o porta-voz do Sindicato dos Professores no Distrito
Federal (Sinpro-DF), Cláudio Antunes acrescenta, como fatores
que ampliam o estresse da categoria, o excesso de alunos por sala e o
fato de professores fazerem mais de um concurso para completar renda.
“A
reforma deixou cada vez mais distante a opção de aposentar, piorou
muito a condição do professor. É um impacto sem precedente na vida
da mulher, principalmente.”
Dinheiro para salários ou investimento?
Analista
da Câmara dos Deputados especialista em orçamento, Lúcio Guerra
alerta para o outro lado da questão. Ele ressalta a situação
crítica do orçamento dos estados.
“Os
governos não têm dinheiro para investir em saúde, educação,
segurança pública. Estão com o orçamento praticamente todo
comprometido com despesas fixas, como a folha de pagamento de ativos
e inativos. Sem entrar no mérito da necessidade dos professores, as
pessoas também precisam pensar e decidir o que é melhor: se investe
em melhores condições para a educação ou em salários.”
Dados
do Tesouro Nacional mostram que, em geral, a metade
dos inativos dos Estados são professores.
Eles são cerca de 50% do total, à frente dos militares, que
representam 15%.
Ainda
de acordo com o Tesouro, o número de professores aposentados cresceu
29% entre 2012 e 2017, o percentual é acima da média das demais
categoria no mesmo período, 25%.
Os governos não têm dinheiro para investir em saúde, educação, segurança pública. (...) Sem entrar no mérito da necessidade dos professores, as pessoas também precisam pensar e decidir o que é melhor: se investe em melhores condições para a educação ou em salários Lúcio Guerra, analista da Câmara dos Deputados especialista em orçamento
Indicativo de greve e mobilização
Insatisfeitos,
os professores organizam mobilizações contra a reforma e os
sindicatos designaram representantes para acompanhar as ações no
Congresso. A primeira reunião da categoria está marcada para 20 de
fevereiro, justamente o dia que a proposta chega à Câmara dos
Deputados, em todas as capitais.
“Vamos
manter a mobilização, mostrar o que o candidato que recebeu votos
da categoria está apoiando. Vamos denunciá-los, fazer um mapeamento
da gestão anterior, sobre como os parlamentares aturaram na proposta
do [ex-presidente Michel] Temer. A depender das reuniões, é
possível ter indicativo de greve”, diz Heleno Araújo, presidente
da CNTE.
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Regras
para professor
Como
é hoje
Atualmente
há diferenciação por sexo para aposentadoria de professores da
rede pública de ensino básico. Homens têm idade mínima de 55 anos
e mínimo de contribuição de 30 anos. As mulheres têm uma redução
de 5 anos, com idade mínima de 50 anos e contribuição de 25 anos.
Na
rede particular, há apenas o critério de tempo de contribuição.
Também diferenciado entre homem e mulher, com 30 e 25 anos.
O
que diz a proposta
A
ideia defendida pela equipe do presidente Jair Bolsonaro é igualar a
aposentadoria de homens e mulheres professores em 60 anos. Eleva 5
anos para homens e 10 para as mulheres.
A
regra geral que valerá para as demais profissões, no entanto, ainda
difere homens e mulheres. Ficou definido 65 anos para homens e 62
anos para as mulheres.
Impacto
no orçamento da União e dos Estados
Dados
do Tesouro Nacional indicam que os professores representam cerca de
metade dos aposentados nos estados. Ainda de acordo com o órgão,
o número de professores aposentados cresceu 29% entre 2012 e 2017.
Considerando todas as carreiras, a média do crescimento foi de 25%.
Reação
dos professores
Professores
têm argumentado que a reforma os impede de se aposentar, com
prejuízos principalmente para as mulheres. “A reforma sinaliza
para uma característica forte no governo do novo Presidente do
Brasil: ele não tem projeto de valorização da carreira do
magistério público e não respeita as diferenças, sobretudo
relacionadas às jornadas de trabalho, das mulheres”, diz nota do
Sindicato dos Professores do DF.”
Fonte:
Huffpost - Brasil
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