“A
modernidade nos trouxe o telefone móvel e a facilidade de
comunicação. No entanto, a facilidade de ter nas mãos o acesso à
agenda telefônica de amigos e a uma infinita quantidade de
aplicativos vem provocando conflitos nas relações entre empregados
e empregadores.
Por
conta disso não se pode perder de vista a destinação do uso do
celular. É para o trabalho? A empresa permite o uso do celular
durante o horário de expediente? O seu uso pode atrapalhar a
produtividade?
No
Brasil, atualmente, não existem leis que regulem o uso de celular no
ambiente de trabalho. Contudo, cabe ao empregador a direção dos
serviços, conforme autoriza o art. 2° da CLT. Com base na lacuna
legislativa, muitas empresas, resguardando seus direitos, vem criando
regras expressas proibindo ou restringindo o uso do celular durante o
horário de trabalho, em especial nas funções e atividades
incompatíveis com a mobilidade do telefone celular.
Por
sua vez, a desatenção do empregado à orientação do empregador
pode ter como consequência a aplicação de penalidades
disciplinares, podendo ocasionar, inclusive, uma demissão por justa
causa. Como já elencado, o poder de direção é do empregador. E
estes podem ser divididos em poder de organização, poder de
controle e poder disciplinar.
O poder de organização garante ao
empregador o direito de organizar o seu empreendimento da maneira que
lhe convém, dando-lhe o direito de regulamentar o trabalho dos
empregados por meio do regulamento de empresa. Não é necessário
ser escrito, todavia, deve ser público e de amplo conhecimento de
todos os empregados, motivo pelo qual a forma escrita é a mais
indicada.
O
requisito básico para a validade do regulamento de empresa é a sua
publicidade. Para tanto, o empregador deverá afixá-lo em local
visível no estabelecimento, de modo que os empregados dele tomem
conhecimento (MARTINS, 2016, p. 108).
Já
o poder de controle garante ao empregador o direito de
fiscalizar e controlar as atividades de seus empregados. E por fim, o
poder disciplinar, consistente em garantir ao empregador o poder de
determinar ordens na empresa, que, se não cumpridas, podem gerar
penalidade aos seus empregados. Neste contexto, entre as penalidades,
estão a advertência e a suspensão do empregado. Ambas punições
podem levar o empregado a uma despedida por justa causa.
A
justa causa, por sua vez, é uma circunstância peculiar no pacto
laboral. Ela consiste na prática de ato doloso ou culposamente grave
por uma das partes e pode ser o motivo determinante da resolução do
contrato (Barros, 2016, p. 579).
Sérgio
Pinto Martins (2016, p. 160) defende que a justa causa é o ato
incorreto do empregado, tipificado na lei, que dá ensejo à ruptura
do vínculo empregatício. Ainda, o mesmo autor revela que os
elementos da justa causa podem ser descritos como objetivos e
subjetivos. O elemento subjetivo caracteriza-se pela culpa ou dolo do
empregado em realizar o ato ensejador da justa causa. Já o elemento
objetivo tem uma série de requisitos. Entre eles, tipificação em
lei, gravidade do ato praticado, nexo de causalidade,
proporcionalidade entre o ato faltoso e a punição.
O
art. 482 da CLT elenca as hipóteses que constituem justa causa para
rescisão do contrato de trabalho pelo empregador, cujo rol é
taxativo e não meramente exemplificativo. Outrossim, além dessas
faltas consideradas genéricas, existem outras hipóteses de
despedida por justa causa, consideradas específicas, como a
aplicável aos domésticos (art. 27 da Lei Complementar n°
150/2015), ferroviários (art. 240 da CLT), motorista empregado (art.
235-B da CLT) e também pela não observância pelo empregado das
normas de segurança e medicina do trabalho pelo não uso de
equipamentos de proteção individual fornecidos pela empresa
(parágrafo único do art. 158 da CLT).
A
natureza jurídica da justa causa ainda é um tema não sedimentado.
Alguns autores admitem o poder disciplinar do empregador e consideram
a despedida por justa causa uma pena disciplinar, e a mais severa. Os
que negam a existência desse poder não a consideram pena, mas sim
uma forma autorizada de rescisão contratual (Barros, 2016, p. 593).
A
falta caracterizadora da despedida por justa causa pelo uso excessivo
do celular no ambiente de trabalho, enquadra-se nas alíneas “e”
ou “h”, do art. 482 da CLT, descrita como desídia no desempenho
das respectivas funções ou o ato de indisciplina ou de
insubordinação.
A
desídia (art. 482, “e”, da CLT) é caracterizada quando o
empregado labora com negligência, preguiça, má vontade,
displicência, desleixo, indolência, omissão, desatenção,
indiferença, desinteresse, relaxamento (MARTINS, 2016, p. 163). Já
Alice Monteiro de Barros (2016, p. 587) preceitua que a desídia se
manifesta pela deficiência qualitativa do trabalho e pela redução
de rendimento.
Para
configurar a desídia, em regra, é necessário que o empregado seja
reincidente na conduta negligente, ou seja, exige-se um comportamento
habitual improdutivo e relapso (CORREIA, 2016, p. 530).
Os
atos de indisciplina ou de insubordinação (art. 482, “h”, da
CLT) implicam violação ao dever de obediência. Na ocorrência
de ato de indisciplina, o empregado descumpre ordens gerais de
serviço, entre elas o descumprimento das normas contidas no
regulamento da empresa. E no ato de insubordinação, o empregado
descumpre ordens pessoais de serviço, entre elas, ordens do chefe ou
encarregado.
Em
ambos os casos, a ordem deverá ser lícita e emanada do empregador
ou de seus prepostos, pois o empregado não está obrigado a acatar
ordens ilícitas, ao contrário, deverá denunciá-las ao empregador
ou à autoridade competente, dadas as consequências que poderão
resultar de sua omissão ou de uma acusação injusta (Barros, 2016,
p. 590).
Com
efeito, ocorrendo a dispensa por justa causa, o empregado terá
direito apenas ao saldo de salários e férias vencidas, se houver. O
empregado perde o direito das férias proporcionais, décimo terceiro
salário, aviso prévio, levantamento do FGTS e a indenização de
40%, seguro-desemprego.
Em
recente decisão, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região,
manteve a justa causa aplicada a um serralheiro, que, mesmo advertido
várias vezes, não cumpriu a regra de segurança da empresa que
vedava o uso do telefone celular durante o horário de expediente.
Entre as tarefas desempenhadas pelo empregado, estavam a manipulação
de máquinas de corte, de polimento e soldas, além de produtos
químicos com algum grau de toxicidade. Por conta do risco, e como
forma de não haver distrações, era norma da empresa que não se
utilizasse o celular durante o expediente.
Quando
se trata do uso do celular no trabalho, é preciso cuidado e bom
senso. Independente se há ou não regra específica na empresa
proibindo ou restringindo o uso do celular no ambiente de trabalho, o
empregado deve primar pelo seu bom desempenho profissional pela boa
produtividade, evitando o uso exagerado do celular. Por sua vez, o
empregador deverá ponderar até que ponto a utilização do celular
por parte do empregado será excessiva a ponto de influenciar em seu
desempenho profissional, de modo a não interpretar o uso do celular
como uma falta grave.”
Fonte:
Jusbrasil