"Dos 16 minutos cronometrados, Dilma falou 10 minutos e meio; Bonner, 4 e meio, e Patrícia quase 1 minuto. Dá 65% para ela e 35% para eles. Dilma pronunciou 1.383 palavras, contra 980 da dupla (766 só do Bonner), o que dá 60% x 40%. Isso é escore de debate, não de entrevista. A dupla encaixou 26 acusações ao governo e ao PT; algumas, com ponto de exclamação", diz o jornalista Ricardo Amaral, em sua análise sobre a agressão de William Bonner e Patrícia Poeta contra a presidente Dilma; "mesmo restrita a um cerimonial televisivo, foi uma sinalização relevante para uma imprensa cada vez mais assanhada no papel de oposição"
19
DE AGOSTO DE 2014 ÀS 20:10
POR
RICARDO AMARAL
A
ENTREVISTA COM A PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF EXPÔS, COM RARA
CONTUNDÊNCIA, A PARCIALIDADE DA GLOBO NA COBERTURA DO GOVERNO E DO
PT. UTILIZANDO MANHAS DE QUEM PASSOU PELO PAU-DE-ARARA, DILMA PÔS
ABAIXO A TENTATIVA DA GLOBO DE PARECER “ISENTA” NESSE CAPÍTULO
DAS ELEIÇÕES. ISSO NÃO É BANAL, NO MOMENTO EM QUE A CREDIBILIDADE
DA IMPRENSA HEGEMÔNICA SEGUE ABALADA PELO FIASCO HISTÓRICO DA
“OPERAÇÃO COPA”.
A
credibilidade do jornalismo da Globo saiu mais uma vez arranhada
pelos esgares de William Bonner e Patrícia Poeta. As expressões de
contrariedade, os dedos em riste e as interrupções grosseiras
falaram mais ao telespectador do que o conteúdo de perguntas e
respostas. Por algum tempo, tudo que se disser no JN contra Dilma
será recebido com suspeita, porque a mensagem mais forte do programa
foi: eles não gostam dela.
Dos
16 minutos cronometrados, Dilma falou 10 minutos e meio; Bonner, 4 e
meio, e Patrícia quase 1 minuto. Dá 65% para ela e 35% para eles.
Dilma pronunciou 1.383 palavras, contra 980 da dupla (766 só do
Bonner), o que dá 60% x 40%. Isso é escore de debate, não de
entrevista. A dupla encaixou 26 acusações ao governo e ao PT;
algumas, com ponto de exclamação.
Nos
quatro blocos temáticos (corrupção, mensalão, saúde e economia)
Bonner lançou no ar 13 pontos de interrogação, e Patrícia, dois.
A presidenta foi interrompida 19 vezes. Tomou dedo na cara de Bonner
e de Patrícia, que reclamou de uma resposta com um soquinho na mesa.
Isso não é comportamento de jornalista. Na entrevista com Aécio
Neves – que muitos acharam “dura”, embora tenha sido apenas
previsível – a dupla fez quatro interrupções e cinco reiterações
de perguntas.
Aprendi
ainda foca que o segredo de uma entrevista ao vivo é dominar o
assunto e buscar a pergunta seguinte na resposta do entrevistado. É
uma arte difícil. Patrícia Poeta nunca soube fazer. Bonner acha que
sabe – e que sabe muito. Por isso saiu-se ainda pior que a colega.
Basta discordar do enunciado para desnorteá-los. Não sabem do que
estão falando; seguem o roteiro e fazem cara de argúcia (com Dilma,
usavam ponto eletrônico!).
Maus
entrevistadores são incapazes de ouvir respostas e dialogar com o
argumento do entrevistado. Não é só amadorismo; é presunção.
Globais se consideram mais importantes que os candidatos. Acham-se a
própria notícia. Diante da contradita, repetem a pergunta até se
perderem. No limite, apelam para a fórmula binária: “eu digo
isso; sim ou não?” Eduardo Campos saiu-se muito bem dessa briga
com bêbados. Aécio tropeçou e caiu.
Para
a Globo, pouco importa expor os editores chefe e assistente do JN a
mais um vexame profissional. A Globo não quer ouvir respostas; quer
repetir (e tentar sancionar) o próprio discurso. Bonner deve ter
ensaiado em casa o que considerava seu momento de glória: chamar de
corruptos os petistas do mensalão (“Eram corruptos!”), na cara
da presidenta da República. Que audácia, hein, patrão…
Na
primeira pergunta (69 segundos), a palavra corrupção foi
repetida sete vezes; e estamos conversados. Depois de 12 anos (“mais
de uma década, candidata!”) há “filas e filas nos hospitais”,
cidadãos “muitas vezes são atendidos em macas”, “muitas vezes
não conseguem fazer um exame de diagnóstico”. O país tem
“inflação alta, indústrias com estoques elevados, ameaça de
desemprego ali na frente”.
Repetir
os mantras do noticiário negativo – sem de fato abrir a discussão
sobre eles – era o primeiro dever de casa. O segundo era
desconcertar a entrevistada, e foi aí que a bomba explodiu no colo
dos entrevistadores. Dilma não abriu mão de responder as perguntas,
retomando o fio da meada a cada interrupção. Advertida, fez-se de
sonsa e continuou respondendo o que quis.
O
jogo foi chato na maior parte do tempo, mas Dilma não entregou a
posse de bola, não cedeu o controle da entrevista. E foram eles,
William e Patrícia, que ficaram visivelmente desconcertados, a ponto
de perder o respeito pela entrevistada – que o merecia, mesmo que
não fosse presidenta da República.
Dilma
não disse aos interrogadores o que eles queriam que ela dissesse,
exceto ao concordar com Patrícia Poeta que “a saúde no país não
é minimamente razoável”. Um pontinho vencido, foi tudo que
conseguiram arrancar da interrogada. Por isso, o destaque nos sites
da Globo foi o previsível silêncio de Dilma sobre o julgamento do
mensalão – outra evidência de que eles consideram suas perguntas
mais importantes do que as respostas da presidenta da República.
Qualquer
analista dirá que a presidenta desperdiçou a oportunidade de ter
sido mais assertiva da propaganda de seu governo. Quinze minutos no
JN são uma grande chance de falar para milhões de eleitores, mas
Dilma preferiu debater com Patrícia Poeta e William Bonner.
Ela
passou informações relevantes: a inflação de julho ficou próxima
de zero; o Mais Médicos atende 50 milhões de pessoas; o SAMU atende
149 milhões. Disse que o país enfrenta a crise sem demitir, sem
arrochar salários e até diminuindo impostos. Podia ter dito muito
mais, mas a disputa foi mais concentrada na forma que no conteúdo. E
foi aí que Dilma venceu.
Dilma
sorriu na medida certa e manteve-se serena durante todo o programa.
Impôs-se um comportamento de presidenta da República, que
contrastou, aos olhos dos telespectadores, com a atitude
desrespeitosa e antiprofissional dos entrevistadores. Mesmo
restrita a um cerimonial televisivo, foi uma sinalização relevante
para uma imprensa cada vez mais assanhada no papel de oposição:
digam o que quiserem, mas respeitem a presidenta eleita de todos os
brasileiros.
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