“O trabalho é o amor tornado visível.”.
Khalil Gibran
Um interessante fenômeno vem agitando o mundo dos negócios. Foi denominado de “A Grande Resignação”. Em vários países do mundo, os trabalhadores têm se negado a preencher vagas de emprego que consideram afetar decisivamente sua qualidade de vida. Quando estão trabalhando em empresas ou organizações cujas condições de trabalho considerem aviltantes, como longas jornadas de trabalho, ambientes tóxicos, chefes despreparados para lidar com pessoas – os trabalhadores simplesmente pedem demissão.
Apenas em agosto de 2021, 4,3 milhões de trabalhadores pediram demissão nos Estados Unidos. O fenômeno alcança países como Inglaterra, França e até mesmo a China. No Brasil, apesar das taxas de desemprego que alcançam no momento 11% da população, em fevereiro de 2022 cerca de 600 mil pessoas pediram demissão voluntariamente. Ou seja, a evidente dificuldade de encontrar um emprego não é motivo para se manter em uma empresa.
No Brasil, uma pesquisa realizada pela SurveyMonkey revelou que 90% dos brasileiros estão insatisfeitos ou infelizes com seu trabalho. Sim, é isso mesmo: 9 em 10 trabalhadores empregados gostariam que suas condições de trabalho mudassem para que se sentissem mais satisfeitos. A empresa Robert Half, empresa multinacional de recrutamento, divulgou recente pesquisa no qual indica que, com base em dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) em 2021, 49% dos desligamentos aconteceram a pedido do empregado, contra um percentual de 30% no ano anterior.
Muito ainda se estudará sobre o assunto, mas uma das causas apontadas como origem da Grande Resignação está na pandemia de Covid-19. Pessoas que trabalham de forma remota não desejam voltar aos escritórios, pois querem manter a percepção de qualidade de vida que conquistaram. Os próprios aspectos que envolveram a pandemia – medo, insegurança quanto ao futuro, a perda de pessoas queridas – podem ter despertado a atenção, antes anestesiada, para fatores como usufruir de mais tempo com os entes amados, a realização de tarefas que trazem um maior senso de significado ou a valorização da própria. Ante tudo o que passaram e sofreram, as pessoas podem ter entendido que só não há jeito mesmo para a morte, mas que um chefe tóxico ou condições de trabalho que afetam sua saúde podem e devem ser descartadas.
O trabalho pode, enfim, estar passando por uma fase de gigantesca ressignificação. O advento da Revolução Industrial, no distante século XVIII, trouxe uma das mudanças mais significativas da relação ser humano e seu trabalho: a perda de significado e de sentido. O trabalhador ou trabalhadora da fábrica, muitas vezes, não tinha a menor noção do resultado daquilo para o qual demandava seu tempo e sua energia, ou seja, sua vida. Não pense que as coisas mudaram muito no decorrer das décadas. Em 2014, uma reportagem da BBC mostra trabalhadores exaustos em uma fábrica da Apple na China. Em uma entrevista concedida à emissora norte-americana CNN, uma funcionária que colocava telas no IPad afirmou que era “tratada como um animal”, antes de tocar pela primeira vez no produto completo. À ela nunca foi permitida essa experiência.
A palavra “trabalho” tem sua origem na palavra latina “tripalium”. Ela designava um instrumento com o qual os agricultores executavam tarefas referentes à colheita, mais precisamente para debulhar milho e trigo. Os romanos utilizaram o formato do “tripalium” para elaborar um método de tortura. E assim vincularam o trabalho, antes algo a ser realizado para a adequada utilização de grãos, a um instrumento de tortura.
Talvez tivessem os romanos dons da profecia, face ao que denominamos “trabalho” faz com os seres humanos. Não farei nenhuma listagem aqui, mas quantas doenças e anomalias físicas, mentais e emocionais são derivadas das atividades que bilhões de pessoas fazem diariamente, muitas sem saber sequer o porquê?
Lembro-me de uma história que li em um livro de ensino de Português quando cursei o atual ensino médio. Vou reproduzi-la aqui, da forma e com as palavras que me recordo. Um homem aproximou-se de uma obra onde trabalhavam três operários. A obra estava em seu início, e curioso, perguntou ao primeiro operário: “O que você faz?” . O operário respondeu de forma seca e sem olhar para ele. “Quebro pedras.” foi sua resposta. O homem aproximou-se do segundo operário e repetiu a pergunta. E ouviu do homem, um pouco mais solícito: "construí um muro.”. Finalmente, o homem aproximou-se do terceiro operário, justamente o que parecia trabalhar mais contente e com mais energia. “O que você faz?” - tornou a perguntar. O operário parou, olhou para ele e, sorrindo, respondeu: “eu construo uma catedral. Ficará linda!”.
O terceiro operário tinha visão do que estava realizando. Sabia o significado de sua atividade. E quando um ser humano tem consciência do significado do que realiza, sua vida também se enche de significado.
Pelo trabalho o ser humano tem condições de transformar vidas. Precisamos fazer com o que seu significado seja o de nutrir e de alimentar, e não de um instrumento de tortura, utilizado para o bel-prazer daqueles que acham normal que a capacidade humana de realização seja colocada para realizar tarefas que eles mesmos não realizariam, ou da forma que não gostariam de serem tratados.
O trabalho precisa ser, novamente, o amor concretizado, tornado visível e palpável por mãos e corações que conseguem vislumbrar além dos boletos e obrigações.
Mas para que o trabalho se torne um caminho para o desenvolvimento pleno das pessoas, e que suas realizações sejam frutos de amor, precisamos resgatar a consciência de valor que temos e fazemos, e que a linha de montagem nos tirou. E assim, conscientes do valor intrínseco e absoluto que somos, o trabalho será consequência natural daquilo que faz especial tudo o que realizamos: a auto-estima.
Maurício Luz |
1º Belmiro Siqueira de Administração – em 1996, na categoria monografia, com o tema “O Cliente em Primeiro Lugar”.
E o 2ºBelmiro Siqueira em 2008, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Desafios e Oportunidades Para a Ciência da Administração”..
Ex-integrante da Comissão de Desenvolvimento Sustentável do Conselho de Administração RJ.
Com experiência em empresas como SmithKline Beecham (atual Glaxo SmithKline), Lojas Americanas e Petrobras Distribuidora, ocupando cargos de liderança de equipes voltadas ao atendimento ao cliente.
Maurício Luz é empresário, palestrante e Professor. Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997).
Mestre em Administração de Empresas pelo Ibmec (2005). Formação em Liderança por Condor Blanco Internacional (2012).
Formação em Coach pela IFICCoach (2018). Certificado como Conscious Business Change Agent pelo Conscious Business Innerprise (2019).
Atualmente em processo de certificação em consultor de Negócios Conscientes por Conscious Business Journey.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é sempre bem-vinda!