Por frei Gilvander Moreira
"Com a brutalidade de dragão do Apocalipse, como Estado colonialista, racista e que submete a aparthaid há 76 anos o Povo Palestino, Israel segue aumentando os ataques e exterminando milhares de civis palestinos em Gaza. A cada minuto aumenta o número de mortos. O Ministério da Saúde da Palestina informou dia 30 de outubro último (2023), que, em Gaza, são mais de 20 mil feridos e 10 mil palestinos assassinados, sendo que 73% dos mortos são crianças, mulheres e idosos. Já são mais de 3 mil crianças mortas e tem mais de 2 mil crianças desaparedidas.
Frei Gilvander esteve na Palestina
Eu estive duas semanas na Palestina estudando arqueologia bíblica e geografia bíblica. Vi com meus olhos o tanto que o povo palestino vem sendo injustiçado e violentado pelo Estado de Israel há muitas décadas, de forma muito mais brutal agora com Israel, sob governo fascista de extrema-direita atrelada ao senhor da guerra tio Sam.
Após concluir o mestrado em Exegese Bíblica, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma, na Itália, sete padres colegas e eu fizemos uma viagem-estágio, de 05 a 20 de março de 2000, à “Terra Santa” (todas as terras são santas, mas …) de Israel-Palestina. Partilho aqui algumas impressões, “coisas” que vi e/ou escutei lá em Israel-Palestina e que me marcaram muito. O centro-sul de Israel-Palestina é quase só um deserto, uma desolação imensa. Ao constatar esse perfil geográfico, imediatamente me veio a consideração: “Mas esta é a terra que Deus prometeu aos nossos pais e mães?!!! Terra em que corre leite e mel?!!! Por que e para que brigar tanto pelo controle desta terra?” Entretanto, ao chegar às planícies da Galileia, no norte da Palestina, vi que ali a terra é muito fértil. Na Galileia se produz de tudo – é um paraíso terrestre, um grande celeiro agrícola. A Palestina tem sido disputada, há mais de 4 mil anos, em vista de ser uma região estratégica para a geopolítica do Oriente Médio – geograficamente é ponto de ligação entre três continentes: Europa, Ásia e África.
A Jerusalém Antiga é hoje um grande mercado religioso e … Se Jesus “torrou a paciência” e, com o sangue fervendo de indignação, “chutou o pau da barraca” lá na frente do Templo e arrematou: “Vocês estão fazendo da casa do meu Pai um covil de ladrões!” (cf. Lc 19,45; Mc 11,17), imaginem agora que toda a Jerusalém (e o mundo) é um grande mercado, onde em nome do deus capital se jogam toneladas de bombas em cima de crianças, mulheres, idosos e doentes em Gaza e em muitos outros lugares do mundo. As ruas da Jerusalém antiga são muito estreitas. Automóveis circulam somente em algumas ruas. Na maioria das vielas só podem passar uns pequenos tratores para transportar mercadorias e recolher resíduos. Os judeus, após 1948, construíram ao lado da Antiga Jerusalém, uma Jerusalém Nova, uma cidade de primeiríssimo mundo, muito luxuosa.
Em Israel, o serviço militar é obrigatório: três anos para os rapazes e dois anos para as moças. Israel tem um poderosíssimo arsenal bélico. Por exemplo, em Hebrom, onde a quase totalidade da população é palestina, em março de 2000, ainda viviam dois mil judeus. Estavam lá 500 soldados para dar “segurança” a esses judeus: um soldado para cada quatro judeus. Vi diversas pessoas judias andando em Jerusalém (e no caminho para Jericó) com um ou dois soldados com metralhadora nas mãos fazendo sua escolta. Cada família hebraica que vive em território palestinense tem direito à escolta de dois soldados judeus com metralhadora nas mãos, 24 horas por dia. Em Hebrom pudemos sentir a grande tensão que existe entre palestinos e israelenses. Existem barreiras do exército de Israel por todos os lados, o que configura apartheid o que Israel está fazendo há muitas décadas contra o Povo Palestino, que quando não é morto ou exilado ao terem seus territórios invadidos por Israel, tem que se submeter a revistas das forças do desgoverno de Israel armadas até os dentes.
Tivemos que passar no detector de metais diversas vezes, sobretudo quando tentamos entrar na mesquita de Omar, no Muro das Lamentações e no Túmulo dos Patriarcas em Hebrom. Um dos meus colegas não pôde entrar com um binóculo para ver melhor à distância. Mesmo sendo descendente de judeus perseguidos na Península Ibérica que foram forçados a migrar para o Brasil, eu, por ser parecido com palestino, fui vistoriado diversas vezes por soldados do exército de Israel.
No norte da Palestina, acima do lago da Galileia, nas Colinas de Golã (território que Israel tomou à força da Síria que o Hezbollah e o Povo Sírio reivindicam de volta), divisa com Líbano e Síria, vimos de perto como o exército israelense está armado até os dentes. Vimos três acampamentos do exército, cada um com mais de 30 tanques de guerra e caminhões lotados de armas.
Nas Colinas de Golã, ao lado do asfalto, há cercas de arame dos dois lados com placas penduradas de 15 em 15 metros dizendo: “Atenção, perigo! Terreno minado!” Nas Colinas de Golã estão fontes de águas de Israel-Palestina e as terras são muito férteis. É no Golã que estavam as “vacas de Basã” (cf. Am 4,1-4), pois lá era (e continua sendo) um grande celeiro agrícola. A degradação ambiental está secando fontes de águas do Rio Jordão, que são as Colinas de Golã, e consequentemente o lago da Galileia. O “Mar” Morto está baixando muito suas águas. Logo, como sem água não se pode viver, pois é imprescindível para a agricultura, para os animais e principalmente para os seres humanos, o controle das fontes das águas tornou-se questão de Segurança Nacional para Israel.
Israel controla militarmente a quase totalidade das águas da região. Quando diminuem as águas, os palestinos e os jordanianos são os primeiros a passarem sede, pois Israel fecha a “torneira” para eles (Algo equivalente também se faz no Brasil: água vira mercadoria, onde grandes empresas consomem um exagero de água para produzir mercadorias e deixam os pobres na beira do rio São Francisco sem água, favelas sem água, enquanto condomínios fechados esbanjam água.). A água não está sendo distribuída equitativamente para todos. Israel permite acesso à água somente para o abastecimento urbano nas cidades palestinas, mas ultimamente cortou acesso a água em Gaza, o que é crime de guerra. Mais da metade da agricultura de Israel é irrigada, mas os palestinos são proibidos de irrigar suas lavouras, algo semelhante à transposição do rio São Francisco para beneficiar hidronegócio de grandes empresas, enquanto o povo do semiárido continua sem água.
A presença marcante das práticas religiosas está por toda parte. Na Jerusalém Antiga, às 4 horas da manhã, os muçulmanos começam a rezar na grande Mesquita de Omar, construída no lugar do Templo judeu. No alto da Mesquita, os alto-falantes (em todas as mesquitas deles os alto-falantes estão presentes) fazem ecoar para toda a Jerusalém antiga a oração dos muçulmanos. Cinco vezes por dia pode-se escutá-los rezando. A poucos metros da Mesquita de Omar, no Muro das Lamentações, ao lado do ex-Templo judaico, os judeus mais conservadores rezam “inclinando a cabeça rumo ao muro”.
Vimos na Samaria, região central da Palestina, perto do monte Garizim, um grupo de crianças palestinas apedrejando o automóvel de um israelense, que, zombando das crianças, apontou um revólver para as mesmas. Dá para imaginar o ódio que existe de parte a parte. Todas as famílias palestinas já tiveram vários parentes assassinados pelo exército de Israel. O martírio do Povo Palestino não será em vão, será semente de ressurreição e irá garantir o reconhecimento pelas Nações do mundo de um Estado Palestino autônomo com território necessário para viver, conviver e trabalhar em paz com justiça.
Em 1.998, chegaram a Israel cerca de 63 mil judeus, vindos principalmente da ex-União Soviética, país que tinha acolhido uma grande multidão de judeus. Mas enquanto os judeus importam judeus da diáspora de todo o mundo, com o patrocínio econômico dos judeus dos Estados Unidos, os palestinos se multiplicam somente pelo processo reprodutivo natural. A Jerusalém antiga está cheia de muçulmanas, quase todas com uma criança nos braços, outra no ventre e 3, 4, 5 ou 6 ao redor de si. Entre os muçulmanos existe a poligamia. Todavia, na prática, é coisa de ricos, porque cada mulher tem que ter uma casa, conforme determina a Torá.
Dizem que corre entre os palestinos a seguinte afirmação: “Nós venceremos os judeus na cama, não com armas, mas com amor”. O povo palestino é empobrecido, assim como o povo negro brasileiro. Os Palestinos são pessoas muito simpáticas e acolhedoras. Existem diversos campos de refugiados palestinos. Uma mulher cristã de Belém desabafou conosco sobre o turismo comercial religioso: “Os peregrinos-turistas vêm aqui preocupados em ver pedras mortas (ruínas antigas), mas não se lembram das pedras vivas que somos nós cristãos, muçulmanos e judeus, na terra de Jesus, e que estamos sendo massacrados juntos com os Palestinos pelo exército de Israel. Não conhecem a nossa história de luta pelo território.”
Uma das características de Israel-Palestina: as cidades e/ou bairros dos judeus são ricos e luxuosos, com grande segurança militar, muros altos com cerca de arame farpado, enquanto as cidades e/ou bairros palestinos são pobres e com nenhuma segurança militar. Enquanto Israel mantem hospitais de luxo, bombardeia os poucos e pobres hospitais que existem na Faixa de Gaza, desrespeitando de forma cruel e impiedosa as leis internacionais que instruem a preservação de hospitais, igrejas e edificações históricas, impedindo ainda os corredores humanitários.
No dia 22 de março de 2000, o Papa João Paulo II celebrou uma missa em Belém, na Palestina. Foi uma missa bonita. Os palestinos gostaram. O Papa disse: “O mundo não pode mais ignorar o sofrimento do povo palestino!” O Papa exortou judeus e palestinos a encontrarem um caminho de paz, justiça e convivência respeitosa. O papa Francisco está se empenhando em contribuir para o cessar fogo de Israel e que se chegue a negociações de paz que inclua o reconhecimento do Estado Palestino e que os territórios invadidos por Israel sejam devolvidos ao Povo Palestino.
Em quase todas as cidades da Israel-Palestina existe uma cidade nova ao lado das ruínas de uma cidade antiga, que foi destruída várias vezes. Na parte nova de Jerusalém, cidade de Primeiro Mundo, onde está a sede do Parlamento de Israel e a sede do Governo, os judeus construíram um grande museu chamado Yad Vashem, como memorial do Holocausto da Segunda Grande Guerra. Lá plantaram 18 mil árvores com o nome de 18 mil pessoas que salvaram judeus dos campos de concentração nazistas. Lá estão também, dentro de uma grande sala, três velas acesas que, com ajuda de espelhos refletores, se multiplicam em 1.500.000 velas-estrelas. Ao entrar nesta sala se tem a impressão de estar no meio de uma noite escura com o céu estrelado. Cada “estrela” recorda uma das 1.500.000 crianças judias assassinadas nos campos de concentração de Hitler. Impressionante é escutar uma voz que vai dizendo o nome de todas as crianças judias vítimas do nazismo e ao sair da sala encontrarmos diversas fotografias das crianças martirizadas.
É muito comovente, mas imediatamente uma voz dentro de mim me dizia, quando ali estive: “O mais dramático e grave é que o holocausto não é somente uma questão do passado, pois 2/3 da humanidade continua sendo assassinada antes do tempo pelo mundo afora”. Pior, Israel, após a Segunda Grande Guerra, nos últimos 76 anos já matou mais de 170 mil palestinos e nas últimas semanas está perpetrando com brutalidade parecida que a de Hitler o holocausto do Povo Palestino em Gaza! O holocausto se repete, agora, perpetrado pelo Estado terrorista de Israel. Vítimas do holocausto feito com requintes de crueldade pelos nazistas, judeus sionistas agora fazem holocausto do Povo Palestino. Israel transformou Gaza no maior campo de concentração, de extermínio em massa.
Enfim, alerto aos judeus sionistas e a quem os apoia: quem mata nossos irmãos palestinos morrerá politicamente em breve, pois a história não os perdoará, como Hitler e os nazistas foram jogados na lata de lixo da história e todos os violentos e opressores da história foram vencidos, vocês também que insistem na brutalidade, serão vencidos e serão jogados na lata de lixo da história. E os palestinos mortos ressurgirão e serão milhões cada vez mais humanos e fortes. Que a luz e a força divina nos guiem sempre na luta pela paz com justiça. Viva a luta do povo Palestino!"
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Fonte: frei Gilvander Moreira
Frei Gilvander Moreira |
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