quarta-feira, 13 de março de 2019

Quem mandou matar a vereadora Marielle Franco?

Marielle Franco

Entenda o por quê a vereadora do PSOL, Marielle Franco  foi assassinada!

Por ALLAN DE ABREU


“Marielle Franco esteve com Marcelo Freixo na investigação parlamentar contra os milicianos. Por nove anos, entre 2007 e 2016, a jovem negra criada no Complexo da Maré – um conjunto de dezesseis favelas onde moram 130 mil pessoas, na Zona Norte – foi assessora de Freixo. Ao mesmo tempo que cursava ciências sociais na PUC-Rio, ela coordenava na Assembleia Legislativa a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, presidida pelo deputado. Em 2016, Marielle decidiu concorrer pela primeira vez a um cargo público. Candidatou-se a vereadora pelo PSOL e obteve a quinta maior votação na cidade – 46 mil votos, a maior parte deles oriundos da Zona Sul.

Seu mandato foi marcado pela defesa das mulheres, dos negros e das minorias, e também por duras críticas à violência policial. “Mais um homicídio de um jovem que pode estar entrando para a conta da PM. […] Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?”, escreveu Marielle no Twitter em 13 de março do ano passado, a respeito da morte de um rapaz na favela do Jacarezinho. Na noite do dia seguinte, ela própria seria assassinada no Centro do Rio, aos 38 anos de idade.

relógio no painel do carro marcava 21h14. Fazia menos de dez minutos que Marielle, a sua assessora, Fernanda Chaves, e o motorista Anderson Gomes haviam deixado a Casa das Pretas, na rua dos Inválidos, no Centro da cidade, depois do debate “Jovens Negras Movendo as Estruturas”, organizado pelo PSOL. “Não sou livre enquanto outra mulher for prisioneira, mesmo que as correntes dela sejam diferentes das minhas”, disse Marielle no encontro, citando a escritora norte-americana Audre Lorde – negra, feminista e gay, como a vereadora. “Vamos que vamos, vamos juntas ocupar tudo”, concluiu diante do público de pouco mais de vinte mulheres. Foi aplaudida, abriu o sorriso grande que lhe era característico e levantou-se, ajeitando a saia com estampas florais e a blusa azul-marinho de alças finas. Na saída, uma amiga a convidou para ir a um bar na Lapa. 

Marielle disse estar cansada e preferiu ir para casa, na Tijuca. Habitualmente, ela embarcava ao lado do motorista, mas naquele dia sentou-se atrás, ao lado da assessora, a bordo de um Agile branco.
Rodrigo Amorim e Daniel Silveira  quebraram ao meio placa onde se lia Rua Marielle Franco.

Nenhum dos três percebeu, mas, assim que o Agile deixou a rua dos Inválidos, foi seguido por um Chevrolet Cobalt prata – o veículo com placas clonadas estava no local desde as sete da noite, quando Marielle chegou à Casa das Pretas para o debate. No banco traseiro do Cobalt, um homem segurava uma submetralhadora alemã HK MP5, calibre 9 milímetros, conhecida pela precisão de seus disparos.


Quando, às 21h20, o carro com a vereadora dobrou a esquina das ruas Joaquim Palhares e João Paulo I, no bairro do Estácio, ainda no Centro, o Cobalt emparelhou com o Agile a uma distância de 2 metros. Do vidro aberto do carro prata, a HK disparou treze tiros entre a porta direita traseira e o fim da lateral do Agile, exatamente no local onde estava Marielle.
Atingida por quatro balas no lado direito da cabeça – duas próximas à orelha, uma perto do olho direito e uma rente à boca –, a vereadora morreu instantaneamente. O motorista Anderson Gomes, que estava na linha de tiro, foi atingido por três balas nas costas. Soltou um gemido e largou as mãos do volante. Fernanda Chaves, a única a não ser atingida, abaixou-se rapidamente e puxou o freio de mão do veículo.
Marielle estava com o corpo seguro pelo cinto de segurança, a cabeça caída para a frente, o sangue escorrendo pela nuca. Havia onze câmeras públicas de vídeo no trajeto feito pelo carro. Misteriosamente, cinco tinham sido desligadas, um ou dois dias antes dos assassinatos – uma delas, a poucos metros da cena do crime, não grava imagens e serve apenas para contar os veículos que passam pela via.
As mortes de Marielle e de Anderson indignaram os cariocas, o país e o mundo. Na tarde do dia 15, cerca de 50 mil pessoas se aglomeraram em frente à Câmara Municipal para o velório, num ato que misturava dor e protesto. Houve manifestações populares em dezessete estados naquela noite. O crime foi destaque na imprensa internacional, ganhando as páginas dos jornais The New York TimesThe Washington PostThe Guardian e Clarín, entre outros. “O Estado, através dos diversos órgãos competentes, deve garantir uma investigação imediata e rigorosa”, cobrou a Anistia Internacional. “Não podem restar dúvidas a respeito do contexto, motivação e autoria do assassinato de Marielle Franco.”

Dois dias após o crime, a assessora Fernanda Chaves deixou o Rio de Janeiro às pressas e, em seguida, foi com a família para a Espanha. Só retornou ao Brasil quatro meses depois, em julho do ano passado. Mesmo assim, por segurança, permanece fora do Rio.

Freixo, que sempre manteve uma relação muito próxima com a vereadora, afirma que ela não recebeu nenhuma ameaça de morte, inclusive naqueles dias que precederam o assassinato. “Toda semana, religiosamente, eu tomava um café com a Marielle. Na terça-feira, 13 de março, véspera do crime, no fim do dia, eu falei com ela pelo telefone e combinamos de ir à Maré no sábado seguinte. Ela estava tranquilíssima. Não tinha a menor ideia de que sua vida corria risco.”
A segurança pública do Rio de Janeiro estava sob intervenção federal, decretada pelo então presidente Michel Temer em fevereiro, um mês antes da morte de Marielle. Nos dias seguintes ao assassinato, procuradores chegaram a aventar a hipótese de que o atentado fora um recado aos militares que comandavam a intervenção. Logo, no entanto, essa hipótese perdeu força. Quando o Exército saiu do Rio, em dezembro último, foi descartada. Ficou cada vez mais evidente que o crime era obra de milicianos – e quanto a isso não há mais dúvidas.

A guerra de versões que se trava em torno do caso há doze meses envolve disputas entre milícias e seus respectivos padrinhos na política carioca. Envolve ainda disputas surdas entre a Polícia Civil, de um lado, e a Polícia Federal e o Ministério Público, de outro. Envolve, por fim, divergências entre jornalistas, sobretudo no jornal O Globo.

Delegado responsável pelo caso Marielle, Geniton Lages


Depois de viver uma década no Rio de Janeiro, o delegado Giniton Lages, 44 anos, praticamente perdeu o sotaque caipira. Paulista de Jaú, ele se formou em direito no interior de São Paulo. Seu sonho era ser promotor de Justiça. Durante cinco anos prestou concursos públicos para a carreira, sem sucesso. Decidiu então tentar uma vaga de delegado na Polícia Civil. Passou em concursos da corporação em Pernambuco, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Escolheu o último estado. Em 2008, assumiu o distrito policial de Japeri, na Baixada Fluminense, e de lá foi para a vizinha Belford Roxo. Em 2010, chegou à Delegacia de Homicídios (DH) da Baixada, onde atuou por oito anos. Em 17 de março do ano passado, três dias após a morte de Marielle, Lages assumiu a chefia da DH na capital, com a missão de elucidar o crime. 

A Delegacia de Homicídios conta com 10 delegados, 22 peritos, 206 agentes e 48 carros. De cada dez assassinatos ocorridos na capital, esclarece dois, me disse Lages – duas vezes mais do que a média no estado do Rio, conforme pesquisa do Monitor da Violência. E Lage não quis revelar antes do período eleitoral o que tinha apurado. 

“Sem dúvida o caso Marielle é o maior desafio da minha carreira”, afirmou Lages na sede da DH, em área residencial da Barra da Tijuca, na tarde de 8 de fevereiro, sexta-feira. De olhos vincados e cabelos bem curtos, exibia no peito o típico distintivo dos delegados fluminenses, preso por um cordão no pescoço. A sala ampla onde ele despacha contrasta com o espaço exíguo em que trabalham outros delegados e escrivães. Na mesa em formato de “L” repousavam dezesseis dos mais de vinte volumes do inquérito 901-00385/2018, que apura o duplo homicídio.

Por que será que Lages foi afastado, do caso Marielle?  

A desculpa do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC) para justificar o afastamento do delegado Lages "Oficialmente, o motivo dado seria que ele cumpriu sua missão. E que ele está desgastado e precisa descansar"  

Por Redação da Revista Forum
  
"O delegado Giniton Lages, responsável pela investigação da morte de Marielle Franco e Anderson Gomes, será afastado do caso pela Polícia Civil. A informação é da coluna de Lauro Jardim, na edição desta quarta-feira (13) do jornal O Globo.
Oficialmente, o motivo dado será que ele cumpriu sua missão.
Chefe da Delegacia de Homicídios do Rio de Janeiro, Giniton Lages foi o responsável pela investigação que prendeu nesta terça-feira (13) o sargento reformado da PM, Ronnie Lessa, e o ex-pm, Élcio Queiroz, que executaram o assasinato de Marielle e do motorista, Anderson Gomes.
Em entrevista coletiva, Giniton disse que a prisão dos executores finalizava a primeira parte da investigação. “O caso ainda está em aberto. Estamos entregando a primeira fase, e a segunda ainda está em andamento”, disse o delegado, ressaltando que a investigação para descobrir os mandantes do crime ainda estava em curso.
Segundo Lauro Jardim, o chefe da Polícia Civil, delegado Marcus Vinícius Braga, indicará na semana que vem o encarregado da segunda etapa da investigação, centrada em descobrir quem mandou matar a vereadora e o motorista.
Namoro
Aos jornalistas, Giniton Lages confirmou que a filha do sargento reformado da PM, Ronnie Lessa, que efetuou os disparos, namorou o filho mais novo de Jair Bolsonaro. Lessa e Bolsonaro são vizinhos no condomínio Vivendas Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, onde o acusado foi preso.

Em entrevista, Bolsonaro colocou em dúvida o trabalho feito pela polícia e o ministério público na prisão do sargento reformado Ronnie Lessa e do ex-policial Élcio Vieira de Queiroz. “Espero que realmente a apuração tenha chegado de fato a quem foram os executores, se é que foram eles, e a quem mandou matar.” Fonte: Revista Forum
Lages mantém os documentos sob diligente sigilo. “Nenhum advogado teve acesso. Qualquer publicidade sobre as investigações pode pôr todo o nosso trabalho a perder”, justificou.
Conversei com três pessoas que tiveram acesso ao inquérito. Os papéis, segundo elas, revelam que faltou foco na ação da polícia nas primeiras semanas de apuração. Lages solicitou à Polícia Militar toda a relação de policiais lotados no 41º Batalhão, em Acari, Zona Norte, o recordista no estado em mortes provocadas por policiais – quatro dias antes de morrer, Marielle fez a seguinte crítica no Twitter: “O que está acontecendo agora em Acari é um absurdo! E acontece desde sempre! O 41° batalhão da PM é conhecido como Batalhão da morte. CHEGA de esculachar a população! CHEGA de matarem nossos jovens!” No entanto, nenhum policial daquele destacamento foi formalmente ouvido pela Delegacia de Homicídios. 
O delegado também convocou todos os proprietários de automóveis Cobalt de cor prata na capital a apresentarem seus veículos à polícia – são 7375 apenas na capital, segundo o Departamento de Trânsito. Lages afirmou que foi feita vistoria em todos eles. O veículo utilizado no crime, porém, nunca foi encontrado.
Na noite de 21 de março, quarta-feira, a jornalista Vera Araújo, d’O Globo, decidiu ir até o cruzamento das ruas Joaquim Palhares e João Paulo I, onde tinha ocorrido o crime uma semana antes. Seu objetivo era localizar alguém que habitualmente passasse por aquele local sempre às quartas-feiras, entre nove e nove e meia da noite. Foi assim que ela encontrou duas testemunhas, que não tinham sido ouvidas pela polícia. Uma delas era um morador de rua, que presenciou o crime a uma distância de apenas 10 metros. “Foi tudo muito rápido. O carro dela [Marielle] quase subiu na calçada. 

O veículo do assassino imprensou o carro branco [onde estava a vereadora]. O homem que deu os tiros estava sentado no banco de trás e era negro. Eu vi o braço dele quando apontou a arma, que parecia ter silenciador”, disse o homem – para protegê-lo de uma possível retaliação, a jornalista não o identificou na reportagem.

Uma mulher também viu a cena, embora de uma distância maior. Tanto ela quanto o morador de rua contaram à repórter que PMs do 4º Batalhão, em São Cristóvão, chegaram minutos após o crime e pediram para que todos se afastassem do local, sem se interessar por possíveis testemunhas. Antes de publicar a reportagem, Araújo telefonou para o então chefe da Polícia Civil do Rio, Rivaldo Barbosa. “Ele nem deu bola. Depois que publicamos a história, ficou irritado, dizendo que eu expus aquelas pessoas.”A mulher encontrada por Araújo só foi ouvida duas semanas depois pela polícia, que não conseguiu localizar o morador de rua.” Fonte: Revista Piauí     

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