Brumadinho, MG |
Por Nádia Pontes, Marina
Costa (de Brumadinho)
“Vinte
quatro horas depois do rompimento
da barragem de rejeitos de
mineração da Vale em Brumadinho (MG), a praça do distrito de Casa
Branca foi tomada por pessoas neste sábado (26/01). Fora da rota que
destruiu vidas e paisagens pelo caminho aberto pelos 11,3 milhões de
metros cúbicos de lama, a praça virou um lugar de protesto.
"O
problema da Vale aqui na nossa região é a exploração desenfreada.
A gente acha que não há nenhum controle”, disse um morador, que
estava entre os cerca de cem manifestantes que pediam a saída da
empresa de Brumadinho. Os desabrigados foram encaminhados para várias
pousadas e hotéis da região. A igreja Nossa Senhora das Dores,
próxima ao local do rompimento, também recebe corpos encontrados e
sobreviventes.
Durante
a manhã, enquanto 13 helicópteros vasculhavam o território em
operações de resgate, agentes da Defesa Civil e Bombeiros estudavam
como chegar às residências isoladas, onde moradores aguardavam
socorro. Ainda em choque, muitos tentavam entender as causas da
tragédia. "Todo mundo aqui sentia medo de a barragem romper,
apesar de a Vale garantir que era seguro. A gente tinha muito medo
depois do que aconteceu em Mariana”, disse uma moradora.
Leg.
.©
Marina Costa Moradores
de Brumadinho protestam contra a mineradora Vale
“Na
casa alugada pela Samarco desde que seu vilarejo foi destruído após
o colapso da barragem de Fundão, em novembro de 2015, seu Zezinho,
líder comunitário do antigo Bento Rodrigues, em Mariana, diz sofrer
de tristeza com os acontecimentos em Brumadinho.
"A
gente não quer nem ligar a televisão pra ver. É triste demais.
Também não quero falar com ninguém. É como se a gente vivesse
tudo aquilo de novo”, contou à DW Brasil, por telefone.
Licença para reforma e obras na barragem
Maria Teresa de Freitas Corujo, conselheira da Câmara de Atividades Minerárias do Conselho Ambiental de Minas Gerais, atuou firmemente para barrar a licença de ampliação das atividades no complexo da Vale em Brumadinho. Ela foi uma das que mais fizeram questionamentos na tumultuada sessão da Câmara de 5 dezembro de 2018, em que a licença foi concedida. "Estava claro que havia uma pressa demandada pela Vale para obter as licenças de uma vez só”, disse em entrevista à DW Brasil.
©
Marina Costa Centro
comunitário em Brumadinho passou a abrigar moradores afetados pela
tragédia
Segundo
o parecer que concedeu as licenças prévias de instalação e de
operação, a Vale obteve luz verde para reaproveitar rejeitos da
barragem I. Ou seja, a empresa poderia iniciar obras para recuperar
minério de ferro dispostos entre os rejeitos - uma espécie de
"reciclagem”.
Para
fazer esse reaproveitamento, retroescavadeiras fazem a remoção
mecânica na barragem I seguida por um empilhamento drenado e
posterior transporte do minério a ser reaproveitado, segundo
descreve o documento. A Vale não confirmou se as obras na barragem
já estavam em andamento.
Como
não estava chovendo no período do rompimento, não houve terremoto
e a barragem não estava em operação há mais de três anos, a
conselheira Maria Teresa diz enxergar apenas duas possibilidades.
"Ou
a Vale mentiu quando disse que a barragem estava estável ou, com as
licenças que obteve em dezembro, iniciou obras pra fazer o
reaproveitamento de bens minerais e houve um erro, ou algo
inesperado, e a barragem rompeu”, analisa Maria Teresa, que
representa o Fórum Nacional da Sociedade Civil em Comitês de Bacias
Hidrográficas (Fonasc).
"Nós
vemos que as empresas de mineração da região do Quadrilátero
Ferrífero não têm mais lugar pra colocar rejeitos. Estão
começando a querer reaproveitar”, adicionou.
Lições de Mariana
Para
Andrea Zhouri, pesquisadora da UFMG (Universidade Federal de Minas
Gerais) que estuda conflitos ambientais em torno da mineração há
décadas, o desastre de Mariana parece não ter sido levado a sério
pelas autoridades.
©
Marina Costa Parentes
de desaparecidos aguardam notícias em um centro de informações
instalado pela Vale
Um
mês após o colapso de Fundão, a Assembleia Legislativa de Minas
Gerais aprovou uma lei que mudou toda a estrutura dos órgãos que
aprovam o licenciamento ambiental.
"Tudo
pra deixar o licenciamento mais simplificado. A toque de caixa. Estão
aprovando as obras sem que estudos sejam suficientes, sem que haja
debate, avaliação técnica, ou viabilidade ambiental e
socioambiental”, critica Zhouri.
Uma
das alterações da lei foi a criação da chamada Superintendência
de Projetos Prioritários (Suppri). Para Klemens Laschefski,
pesquisador alemão e professor da UFMG, o órgão foi criado com o
único objetivo: pressionar o Conselho Estadual de Política
Ambiental de Minas para aprovar projetos que o governador considera
prioritários.
"São
geralmente aquelas empresas que financiaram as campanhas eleitorais
por trás desses pedidos. As obras são aprovadas a partir dos
interesses efetivamente das mineradoras”, opinou. Para os
pesquisadores, a criação da Suppri é o fator que mais enfraqueceu
o sistema ambiental mineiro. "O licenciamento virou um balcão
de negócio”, opinou Zhouri. "Além disso, temos ainda uma
ineficiência e inoperância da fiscalização e monitoramento”.
Nenhum
representante do governo de Minas Gerais foi encontrado para comentar
o assunto.
Nilo
D'Ávila, do Greenpeace, defende uma mudança de postura - e do
discurso - do governo que acaba de assumir, com Jair Bolsonaro na
presidência.
"É
hora de descer do palanque e começar a governar pra todos, seguindo
as leis. Não dá pra tolerar esse discurso de que fiscais do Ibama
têm que ser punidos, de que o licenciamento tem que ser afrouxado.
Estamos diante de outro desastre cujo impacto humano a gente nem
consegue ter ideia”, disse em entrevista à DW Brasil. Até agora,
a Vale foi multada em R$ 250 milhões pelo Ibama."
Fonte:
MSN
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