por
Luiz Carlos Azenha
"Surpreendentemente,
o auditório da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, no
centro de São Paulo, estava superlotado de professores e alunos.
Dentre
os mil que tiveram as assinaturas confirmadas, 264 são professores
da Universidade de São Paulo, 66 da Unicamp, 59 da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, mas há centenas de assinaturas de
professores de universidades federais e privadas de todo o Brasil e
até do exterior.
Muitos
deles são críticos do governo Dilma e do Partido dos Trabalhadores,
como o filósofo Paulo Arantes. Porém, todos reconhecem que o
processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff é apenas um
passo no processo de retirada de direitos sociais e da instalação
de um governo oligárquico no Brasil, sob forte influência da
extrema-direita. É, portanto, um golpe.
Na
mesa, o neurocientista Miguel Nicolelis teve um flashback de 35 anos
atrás, de quando o Brasil sofreu um golpe militar. “Quero evitar
que meus filhos e meus netos tenham de voltar aqui para protestar
contra uma ditadura”, afirmou. “Não é uma presidência, uma
pessoa, é a defesa do Estado de direito, da democracia, do império
da lei”.
A
economista Leda Paulani relembrou que “nenhuma Nação passa impune
por 25 anos de ditadura”. Segundo ela, “é a construção
democrática do Brasil” que está em jogo. Os que propõem o
impeachment, segundo ela, “nunca foram democratas”.
Outro
economista, Luiz Gonzaga Beluzzo, também relembrou o passado. Disse
que em 64, depois do golpe, apanhou do Comando de Caça aos
Comunistas (CCC) defendendo o governo constitucional de João Goulart
e que o faria de novo, agora, se necessário for.
O
jurista Dalmo Dallari afirmou que nunca foi filiado a partido
político, que estudou a proposta de impeachment de Hélio Bicudo,
Janaina Paschoal e Miguel Reali Jr. e que não existem atos da
presidente Dilma que configurem crime de responsabilidade.
“Eu
não diria que são falsos juristas, mas que são juristas
incompletos”, afirmou. Nunca chegariam ao STF por terem demonstrado
“notável ignorância jurídica”, aduziu.
Paulo Arantes alegou que, por força da pergunta de um repórter, se sentia obrigado a explicar sua presença no ato, tendo em vista suas críticas recorrentes ao PT e ao governo Dilma.
“É
em solidariedade às vítimas do processo em marcha. Saindo ou não
saindo o impeachment, estamos diante de uma onda avassaladora
que está se despejando sobre o Brasil”, afirmou.
Ele
relembrou a manifestação na avenida Paulista em 2013, quando a
esquerda apanhou de militantes direitistas quando comemorava a
vitória do Movimento Passe Livre. Para ele, designar os
pró-impeachment como “coxinhas é fofo”; no outro extremo,
poderiam ser chamados de “milícias fascistas”.
Para
o fundador do PSDB, o economista Luiz Carlos Bresser Pereira, a
democracia está ameaçada “pelos liberais”, que não aceitam
premissas básicas dela, como os direitos civis e o sufrágio
universal. Ele acrescentou que uma “classe média orfã” da
política econômica fornece a militância para o que chamou de
golpe.
Para
Bresser, o impeachment falhará porque o Brasil tem uma sociedade
plural, uma classe trabalhadora ativa e intelectuais como os que se
reuniam naquele momento.
O
professor Roberto Schwarcz disse que o impeachment vai enfraquecer a
democracia e lembrou que, desde a apuração dos votos em 2014, a
oposição trabalha para tornar o Brasil ingovernável de maneira a
poder dar o golpe alegando que o país está desgovernado.
Para
ele, se o governo atual for derrubado o impeachment estará
legitimado como forma de resolver crises institucionais, mas o campo
popular não terá acesso à imprensa, ao rádio e à TV, nem ao
apoio da Fiesp, que representam “os interesses do dinheiro”.
O
professor de Filosofia Marcos Nobre disse que a elite brasileira está
“canalizando o sofrimento social” de uma crise econômica para
dar o golpe. “É a energia sequestrada de uma sociedade”, disse.
“A autodefesa de um sistema estruturalmente podre e corrupto”,
segundo Nobre, resulta numa “enganação coletiva”: colocar os de
baixo para apoiar uma proposta que basicamente beneficia os de cima.
Marilena
Chauí afirmou que o impeachment é apenas a “cereja no bolo” da
direita, que banca uma pauta extremamente conservadora no Congresso,
incluindo da redução da maioridade penal à lei antiterrorismo.
Segundo
ela, o que está sendo preparado “é a vitória completa do capital
na luta de classes”. “Não é por acaso”, frisou, que “o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou em entrevista que o
mercado é favorável ao impeachment, como se o mercado fosse um ente
metafísico”. Para Chauí, a classe dominante conta com o
apoio de uma classe média “proto fascista” para implantar um
governo reacionário depois de derrubar Dilma Rousseff.
“Se
o golpe vier, nós teremos uma ditadura que nos fará considerar 64
como um pão doce com bolacha”, previu sobre o futuro.
Para
o jurista Fábio Konder Comparato, que encerrou o evento, no Brasil
vigem duas Constituições. A de 1988, nunca totalmente
regulamentada, e a “real, ditada pela oligarquia”. Para ele, o
impeachment seria a vitória indiscutível desta constituição “de
fachada”, que privilegia os de cima às custas dos de baixo. “
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