Pesquisadora brasileira lidera um laboratório nos Estados Unidos especializado na biossíntese de compostos naturais. [Imagem: Felipe Maeda / Agência FAPESP |
Com informações da Agência Fapesp
Farmacopeia
natural
“Você
sabia que cerca de metade de todos os medicamentos
vendidos nas
farmácias e utilizados nos hospitais têm princípios ativos
extraídos de produtos naturais?
"Do
total de medicamentos comercializados pelas indústrias
farmacêuticas, 49,6% são compostos sintéticos, geralmente
fabricados a partir do petróleo, enquanto 50,4% originam-se de
produtos naturais ou derivados.
A
expressão "produtos naturais ou derivados" denomina
moléculas produzidas por plantas, fungos, bactérias e outros
organismos, ou moléculas artificialmente modificadas a partir dessas
precursoras.
A
informação foi dada pela brasileira Alessandra Estáquio,
atualmente pesquisadora da Universidade de Illinois de Chicago (EUA):
"É importante, para o desenvolvimento de medicamentos, recorrer
às duas opções, ao sintético e ao natural. Os dois caminhos
apresentam vantagens e desvantagens. A vantagem dos produtos naturais
é que a atividade biológica que eles manifestam resulta de uma
evolução de milhões de anos. Outra vantagem é que sua produção
constitui um processo mais sustentável."
A
Medicina nasceu com o uso de plantas para curar doenças e
ferimentos. Nos últimos dois séculos, a possibilidade de modificar
a estrutura química das moléculas ativas encontradas nas plantas,
de modo a potencializar suas propriedades farmacodinâmicas, fez com
que a pesquisa de produtos naturais ou derivados se tornasse um campo
altamente promissor.
Morfina
(analgésica), eritromicina (antibiótica), ciclosporina
(imunossupressora), artemisinina (antimalárica) são algumas
substâncias naturais com uso consolidado em medicina.
E
essa importância das fontes
naturais de medicamentos tende
a crescer, conforme as pesquisas avançam das plantas em direção a
outros organismos, principalmente as bactérias.
Potencialização
das plantas medicinais
A
ação da tecnologia é importante porque as plantas
medicinais nem
sempre trazem resultados com a velocidade que casos críticos exigem.
"Em
alguns casos, a estrutura encontrada na natureza é utilizada
diretamente como medicamento. Exemplo disso é o paclitaxel, um
fármaco extraído da casca do teixo (Taxus brevifolia),
empregado no tratamento do câncer. Mas a maioria dos compostos
naturais necessita de alguma modificação para poder funcionar como
medicamento. Alguns precisam ser estabilizados, porque se degradam
muito rapidamente. Outros precisam de alterações que favoreçam sua
absorção e distribuição no organismo humano. Outros ainda
precisam que seu efeito seja potencializado. E assim por diante",
explicou Alessandra.
Mesmo
no caso do paclitaxel, por exemplo, para se obter 1 quilograma do
produto seriam necessárias três mil árvores. Daí a necessidade de
se recorrer à semissíntese ou à cultura de células vegetais para
que o medicamento possa ser disponibilizado em escala comercial.
Recentemente, pesquisadores japoneses criaram uma nova técnica
para identificar diretamente os compostos das plantas medicinais,
acelerando sua transformação em medicamentos.
"Há
várias formas de intervenção possíveis. Uma delas é a
semissíntese, que consiste em isolar a molécula de interesse e
modificá-la parcialmente por meio de processos químicos. Outra
forma é reproduzir a estrutura completa por meio de síntese. Uma
terceira maneira, mais recente, consiste em modificar os produtores
dos compostos por meio de engenharia genética.
Em alguns casos, a
engenharia genética envolve transferir os genes responsáveis pelo
composto de um organismo para outro - por exemplo, de uma planta para
uma bactéria ou levedura. A vantagem, no caso, é que as bactérias
ou leveduras são mais fáceis de cultivar e crescem mais rapidamente
do que as plantas. Por exemplo, um grupo nos Estados Unidos, liderado
por Jay Keasling, da Universidade da Califórnia de Berkeley,
conseguiu transferir
os genes precursores da artemisinina para leveduras",
detalhou a pesquisadora.
Medicamentos
a partir de bactérias
O
grupo liderado pela pesquisadora brasileira nos EUA trabalha com
bactérias, tendo por horizonte o desenvolvimento de compostos
antibióticos ou anticancerígenos.
"Nosso
objetivo principal é entender como as bactérias sintetizam
moléculas que podem ser usadas como antibióticos, quais são os
genes envolvidos no processo. Com esse conhecimento, é possível
fazer com que as bactérias produzam os compostos em maior
quantidade, ou modificar as moléculas para que se tornem fármacos
mais eficazes. É uma pesquisa básica, porém com a aplicação em
mente," contou ela.
"Com
o boom de sequenciamentos de genomas microbianos, ficou claro que o
potencial biossintético dos microrganismos é muito maior do que se
supunha. Uma bactéria típica, à qual são atribuídos alguns
poucos compostos, pode produzir mais de 30, a partir de sua estrutura
genômica. Ocorre que a maioria dos genes responsáveis pela
biossíntese é silenciada ou não é bem expressa em condições
laboratoriais de crescimento. Sabendo que genes são esses e qual é
o seu potencial, torna-se possível ativar esses genes e obter os
compostos correspondentes," concluiu.”
Fonte: Diário da Saúde
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