"Janot se diz consternado com corrupção dos mais altos dignatários da República."
"Procurador-geral
defende delação da JBS e afirma que os inimigos da Lava Jato são
os mesmos que integram os esquemas desvelados na operação."
RODRIGO JANOT, PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA (FOTO: ANTONIO CRUZ/AGÊNCIA BRASIL |
“Procurador-geral
da República, Rodrigo
Janot,
avalia que, sem a delação do empresário Joesley
Batista,
da JBS,
não seria possível identificar "o complexo esquema de
pagamento de propina" envolvendo o presidente Michel
Temer,
o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures - ex-assessor especial do
peemedebista -, o senador Aécio
Neves (PSDB-MG)
e o procurador Ângelo Goulart.
Lava jato recupera R$ 1 bi em apenas dez dias
Em entrevista , Janot defende enfaticamente o instituto da colaboração. Ele classificou de "decisão histórica" o recente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que "confere segurança jurídica aos colaboradores".
Em entrevista , Janot defende enfaticamente o instituto da colaboração. Ele classificou de "decisão histórica" o recente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que "confere segurança jurídica aos colaboradores".
O
procurador pondera que, apesar do amplo conhecimento do Ministério
Público em grandes investigações, há muita dificuldade em
desmontar organizações criminosas, "já que a regra, nesses
casos, costuma ser a Omertà, ou seja, o silêncio como garantia de
vida"."Com as colaborações premiadas, os réus confessam
os crimes, apresentam detalhes do funcionamento dos esquemas e ajudam
na indicação dos líderes", afirma.
Com
quatro anos de mandato, a serem completados no dia 17 de setembro,
Janot deverá ser substituído pela subprocuradora-geral da República
Raquel Dodge - indicada por Temer. Na quarta-feira próxima (12/07),
Raquel será sabatinada na Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania do Senado.
Janot
deixa o comando do Ministério Público com um sentimento, segundo
suas próprias palavras. "Tenho a convicção de que não me
omiti." E com uma certeza. "Os inimigos da Lava Jato são
os mesmos que integram os esquemas desvelados na Operação."
O
procurador, com 33 anos de Ministério Público, trava um embate
histórico com o presidente, a quem acusa formalmente por corrupção
passiva no caso JBS. Janot está convencido de que Temer era o
destinatário real da propina de R$ 500 mil - 10 mil notas de R$ 50 -
que o ex-deputado Rocha Loures (PMDB-PR) recebeu em uma mala preta na
noite de 28 de abril no estacionamento de uma pizzaria em São Paulo.
Na
mesma investigação com base na delação da JBS, o procurador
denunciou e pediu a prisão do senador Aécio Neves (PSDB-MG), por
supostamente pedir propina de R$ 2 milhões a Joesley.
Outro
alvo da ofensiva de Janot é um colega da própria instituição que
comanda, o procurador Ângelo Goulart, preso sob suspeita de atuar
como infiltrado do delator da JBS, em troca de uma mesada de R$ 50
mil.
Como
recebeu a decisão do STF sobre os limites da delação premiada?
Foi uma decisão histórica, que fortalece o instituto da colaboração premiada e confere segurança jurídica aos colaboradores. A decisão do Supremo foi certeira ao garantir que os acordos celebrados na legalidade, com os colaboradores cumprindo todas as obrigações assumidas, serão mantidos. A competência do plenário ao julgar os acordos é revisional, limitada à verificação do cumprimento das cláusulas pelos colaboradores bem como a uma eventual ilegalidade que possa macular a validade do ato jurídico. O STF foi muito enfático ao reafirmar a possibilidade de o Ministério Público firmar os acordos de colaboração com a garantia de que serão mantidos quando obedecidos os requisitos legais.
Foi uma decisão histórica, que fortalece o instituto da colaboração premiada e confere segurança jurídica aos colaboradores. A decisão do Supremo foi certeira ao garantir que os acordos celebrados na legalidade, com os colaboradores cumprindo todas as obrigações assumidas, serão mantidos. A competência do plenário ao julgar os acordos é revisional, limitada à verificação do cumprimento das cláusulas pelos colaboradores bem como a uma eventual ilegalidade que possa macular a validade do ato jurídico. O STF foi muito enfático ao reafirmar a possibilidade de o Ministério Público firmar os acordos de colaboração com a garantia de que serão mantidos quando obedecidos os requisitos legais.
Sem
a delação não há como combater as grandes organizações
criminosas?
O instituto da colaboração premiada ainda é
muito recente no Brasil, apesar de ser largamente usado em outros
países. Desde o caso Banestado, essa prática tem-se mostrado cada
vez mais eficiente no combate ao crime organizado. Apesar do vasto
conhecimento do Ministério Público em grandes investigações,
sabemos da dificuldade em desvelar crimes praticados por organizações
criminosas, já que a regra, nesses casos, costuma ser a oferta, ou
seja, o silêncio como garantia de vida. Com as colaborações
premiadas, os réus confessam os crimes, apresentam detalhes do
funcionamento dos esquemas e ajudam na indicação dos líderes. No
caso da colaboração dos executivos do grupo JBS, por exemplo, fica
evidente que sem a colaboração de um integrante da organização
não seria possível identificar o complexo esquema de pagamento de
propina envolvendo o presidente da República, um deputado federal,
um senador e, até mesmo, um procurador da República.
Quem
são os inimigos da Lava Jato?
Acredito
que aqueles que querem frear a Lava Jato são os mesmos que integram
os esquemas desvelados na Operação. Essas pessoas são inimigas do
Brasil. É preciso pensar que a Lava Jato está jogando luz sobre um
esquema, que funciona há várias décadas, envolvendo setores
públicos e privados na compra de apoio político em troca de
favores. Os acusados criaram um sistema político-econômico baseado
no compadrio, no pagamento de propina e no desvio de dinheiro de
obras públicas essenciais para o país. Dinheiro da educação, da
saúde, da segurança pública e de infraestrutura foi usado para
satisfazer interesses espúrios de empresários e políticos em busca
de benefícios pessoais e poder. O objetivo da Lava Jato é
justamente fazer cessar essa prática que parece arraigada no sistema
brasileiro. Fico consternado em ver que, após 3 anos e meio de
investigações que já culminaram em mais de 157 condenações,
ainda tenhamos que deparar com crimes de corrupção e lavagem de
dinheiro em curso, praticados pelos mais altos dignatários da
República, enquanto o Brasil passa por uma grave crise econômica,
com índice recorde de desemprego e inadimplência, por exemplo.
Teme
a reedição da Mãos Limpas no Brasil? A corrupção triunfará?
O Brasil passa por um processo de amadurecimento da democracia. Temos visto nos últimos anos o aumento do interesse da população pela pauta política e a ampliação do debate em torno das questões de interesse público. Acredito que podemos aprender com exemplos de outros países que passaram por situações semelhantes. Os resultados da Mãos Limpas foram desastrosos para a Itália e tiveram consequências que perduram até hoje. Não acredito que isso se repetirá aqui. O anseio de mudança dos brasileiros é legítimo e deve ser atendido. A solução do Brasil passa pela política. Pela boa política. Aquela voltada aos interesses da coletividade. O fim da corrupção é uma meta inalcançável. Mas é possível acabar com a corrupção endêmica, e essa é uma tarefa de todos. Não podemos tratar com naturalidade a troca de favores na política e nos negócios.
O Brasil passa por um processo de amadurecimento da democracia. Temos visto nos últimos anos o aumento do interesse da população pela pauta política e a ampliação do debate em torno das questões de interesse público. Acredito que podemos aprender com exemplos de outros países que passaram por situações semelhantes. Os resultados da Mãos Limpas foram desastrosos para a Itália e tiveram consequências que perduram até hoje. Não acredito que isso se repetirá aqui. O anseio de mudança dos brasileiros é legítimo e deve ser atendido. A solução do Brasil passa pela política. Pela boa política. Aquela voltada aos interesses da coletividade. O fim da corrupção é uma meta inalcançável. Mas é possível acabar com a corrupção endêmica, e essa é uma tarefa de todos. Não podemos tratar com naturalidade a troca de favores na política e nos negócios.
O
Ministério Público está no caminho certo ou comete abusos como
alegam críticos da instituição?
A
instituição como um todo tem feito avanços significativos em
diversas áreas. Tivemos conquistas importantes do ponto de vista da
gestão e da própria atuação técnica. Como toda estrutura
composta por pessoas, está suscetível a erros e é importante
reconhecê-los. É natural que, em razão do trabalho de investigação
e acusação, surjam críticas como estratégia de defesa do acusado.
Mas não concordo que existam abusos por parte do Ministério
Público. Temos como ponto basilar da atuação a observância à
Constituição Federal e nos pautamos por ela. Nossa atuação é
técnica, apolítica e responsável.
A
escolha pelo presidente do segundo colocado na lista tríplice da
ANPR o decepcionou?
Eu
sempre defendi que a lista tríplice elaborada pela Associação
Nacional dos Procuradores da República (ANPR) fosse respeitada. Nas
vezes em que concorri à lista, enalteci a legitimidade dos três
nomes apresentados pelo Colégio de Procuradores à Presidência da
República. Costumo dizer que a lista não é una. A categoria
indicou três nomes que considera bons para ocupar o cargo de
procurador-geral e o presidente respeitou isso.
Que legado Rodrigo Janot deixa após quase quatro anos no comando da PGR?
Que legado Rodrigo Janot deixa após quase quatro anos no comando da PGR?
É
muito cedo para fazer qualquer análise sobre esse período. O que
posso dizer, hoje, é que o Ministério Público Federal passou por
um notável amadurecimento, contribuindo para fortalecer a imagem da
nossa instituição, nacional e internacionalmente. Implementei o
planejamento estratégico, que conferiu uma modalidade inovadora de
gestão, mais profissional. O gabinete do PGR passou a contar com
assessorias integradas por membros da carreira, o que proporcionou
agilidade e redução do acervo e garantiu a conquista do certificado
ISO 9001. O trabalho de combate à corrupção tornou-se o principal
destaque, por conta de grandes investigações como a Lava Jato.
Nesse sentido, é preciso lembrar alguns avanços importantes que
esse trabalho proporcionou, como a consolidação do modelo de
forças-tarefa, a eficiência do instrumento da colaboração
premiada e a relevância da cooperação internacional. Esses três
fatores permitiram que o Ministério Público Federal alcançasse os
resultados tão expressivos que vemos hoje.
Onde o senhor acertou? E onde errou?
Onde o senhor acertou? E onde errou?
Precisamos
de um certo distanciamento para avaliar criteriosamente. Tenho a
consciência de que, em mais de 30 anos de Ministério Público,
cometi erros e também errei nesses quase quatro anos à frente da
Procuradoria-Geral da República. Entendo que erros são consequência
de ações e só está isento de falhas aquele que deixa de agir.
Encaro os tropeços com tranquilidade. Nunca tive problema para
reconhecer o erro e reajustar o caminho. Mas sei que contribuí para
a construção de uma instituição melhor para os membros e
servidores e para o Brasil.
O
senhor tem aspiração política? Foi sondado por algum partido?
Concorrer a algum cargo eletivo está fora do seu horizonte?
Não tenho pretensão de concorrer a nenhum cargo político que seja, apesar das muitas especulações envolvendo meu nome. Respeito muito a atividade política e quem tem vocação para seguir esse caminho. Entretanto, não é o meu objetivo.
Não tenho pretensão de concorrer a nenhum cargo político que seja, apesar das muitas especulações envolvendo meu nome. Respeito muito a atividade política e quem tem vocação para seguir esse caminho. Entretanto, não é o meu objetivo.
Faria
tudo de novo?
Sim.
Acredito que o resultado final de todo o trabalho foi positivo.
Algo de que se arrependa?
Algo de que se arrependa?
Não.
Tenho a convicção de que não me omiti; não me furtei do meu
compromisso com as atribuições do Ministério Público.
O que planeja para os meses que ainda lhe restam de mandato?
Continuarei com o trabalho firme e determinado até o último dia.
O que vai fazer depois que sair da PGR?
O que planeja para os meses que ainda lhe restam de mandato?
Continuarei com o trabalho firme e determinado até o último dia.
O que vai fazer depois que sair da PGR?
Quando
deixar o cargo de procurador-geral da República, permanecerei no
Ministério Público Federal exercendo minhas funções como
subprocurador-geral da República.
Valeu
a pena?
Quando
assumi o cargo, não imaginava me deparar com uma investigação do
porte da Lava Jato, que exigiu grandes esforços e medidas inéditas
como a prisão de um senador (Delcídio do Amaral) ou a denúncia
contra um presidente da República. O desafio foi enorme mas, se eu
pudesse escolher, faria tudo de novo. Como disse o poeta, "tudo
vale a pena, se a alma não é pequena".”
Fonte: Estadão
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é sempre bem-vinda!